Saiba por que o
conhecimento sobre a doença é fundamental, inclusive para a saúde bucal do
paciente
O Dia Mundial da Esclerose Múltipla é em 30 de
maio, data escolhida para a divulgação de informações sobre a doença, que
atinge atualmente cerca de 2,3 milhões de pessoas no mundo. O conhecimento
acerca da esclerose múltipla é fundamental, inclusive na Odontologia, uma vez
que a condição ocasiona limitações que prejudicam até mesmo o processo de
higienização bucal.
Saber mais sobre a esclerose múltipla também é
importante para avaliar e definir o melhor tratamento e quais as orientações
adequadas para cada fase da doença. Mas, afinal, o que é esclerose
múltipla?
A doença e os sintomas mais comuns
A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune,
neurodegenerativa, que acomete o sistema nervoso central levando à incapacidade
progressiva, problemas pessoais, familiares, sociais e profissionais, de origem
desconhecida. Afeta em geral adultos na faixa de 18 a 55 anos de idade, sendo
observada no Brasil uma taxa de prevalência de aproximadamente 15 casos por 100
mil habitantes.
A doença apresenta quadros de agravo e remissão,
caracterizados por surtos ou ataques agudos da atividade. Os sintomas mais
comuns são a neurite óptica, paresia ou parestesia de membros, disfunções da
coordenação e equilíbrio, mielites, disfunções esfincterianas, alterações
cognitivas e comportamentais, espasticidade, ataxia, tremor, fadiga, fraqueza
muscular, depressão, levando à deficiência progressiva e dependência de
cuidados.
A cirurgiã-dentista Juliana Franco, do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Hospital Auxiliar de Suzano e
Instituto Central - HCFMUSP) e Doutora em Patologia Oral e Maxilofacial e
Pacientes Especiais pela FOUSP, explica que, em relação à Odontologia, o
paciente portador de esclerose múltipla pode apresentar sinais e sintomas
pertinentes à região da face e cavidade oral, como neuralgias cranianas, paralisia
facial, disfunções temporomandibulares, complicações visuais, disfagia,
disartria, espasmos hemifaciais, distonias e dormência em face. “As alterações
orofaciais encontradas ou reportadas pelo paciente, juntamente com uma anamnese
bem realizada, são importantes e servem de alerta para que o cirurgião-dentista
tenha a esclerose múltipla como hipótese diagnóstica auxiliando no diagnóstico
precoce pelo médico neurologista, com melhor prognóstico da evolução da
doença”.
A esclerose múltipla em suas fases de
progressão
A especialista esclarece que a esclerose múltipla
apresenta quatro formas de evolução e, de acordo com o tratamento, da resposta
ao mesmo e às morbidades apresentadas, é possível encontrar o paciente em
diversas situações clínicas. “Atualmente, sabe-se que os tratamentos controlam
bem os surtos da doença, melhorando o prognóstico e qualidade de vida do
paciente”.
Com relação ao atendimento, Dra. Juliana explica
que ele será efetuado de acordo com a fase da doença. “Quando no estado
inicial, o atendimento será o convencional, realizado no consultório
odontológico. Com a evolução da doença, principalmente os pacientes com
dificuldade de adesão ao tratamento multidisciplinar/farmacológico ou do tipo
de esclerose múltipla, podemos ter um paciente dependendo de cuidados e que
necessite do atendimento odontológico domiciliar. Já no caso em que há
agravamento, podemos ter um paciente hospitalizado, em que o dentista
habilitado em Odontologia Hospitalar realizará o atendimento na
internação”.
Neste contexto, a cirurgiã-dentista destaca que a
Odontologia, hoje, se apresenta de forma muito mais acessível, possibilitando o
atendimento do paciente em qualquer lugar e condição clínica.
Medicações utilizadas no tratamento e seus
possíveis efeitos
O tratamento da esclerose múltipla é
multidisciplinar, baseado na reabilitação do paciente, associado ao tratamento
farmacológico com o uso de corticóides, imunossupressores e imunobiológicos de
uso contínuo, ou na forma de pulsoterapia nos momentos de surto da doença.
Esses medicamentos, segundo a Dra. Juliana, ocasionam uma modulação do sistema
imune, diminuindo a sua atividade, aumentando o risco de infecções, no geral,
incluindo as infecções orais. “O cuidado odontológico de rotina é fundamental
para o tratamento e prevenção das infecções dentárias, que podem ser agravadas
e apresentarem uma rápida evolução por conta da imunossupressão medicamentosa,
assim como nos casos do desenvolvimento de infecções oportunistas em cavidade
oral, como a candidíase oral e herpes simples”.
A cirurgiã-dentista lembra, também, que nos
pacientes com doenças neurodegenerativas pode haver a associação de um quadro
de hipossalivação (diminuição da produção de saliva) ocasionado pela
polifarmácia e de uma perda progressiva e gradual da força muscular e
coordenação motora. Segundo ela, a simples diminuição do volume da saliva traz
riscos para os dentes (aumento do número de cáries), para as gengivas
(progressão da doença periodontal), para as mucosas orais (traumas e infecções
oportunistas) e de qualidade de vida do paciente (dificuldade para mastigar,
deglutir os alimentos, falar, utilizar próteses dentárias).
A importância da higienização bucal do paciente com
esclerose múltipla
A higienização bucal do paciente com esclerose
múltipla é um item de extrema importância para a prevenção de doenças bucais.
Alguns estudos associam à doença uma maior prevalência de cáries e problemas
orais. Com relação a isso, Dra. Juliana explica que a dificuldade de
higienização pode ser proveniente da falta de orientação do paciente e do
cuidador sobre a importância da higiene bucal ou da melhor técnica para
realizá-la, da perda progressiva da força muscular ou do déficit cognitivo que
resultarão em uma higiene bucal deficiente, levando a danos cumulativos à saúde
bucal do paciente.
“O aumento de cáries e de doenças bucais é devido a
uma associação de fatores que deve ser diagnosticada pelo cirurgião-dentista, o
qual deve elaborar um plano terapêutico contemplando o tratamento odontológico,
consultas de rotina para prevenção e trabalho conjunto com o paciente e
cuidador para adequar forma e estratégias para a realização da higiene
bucal”.
De acordo com a cirurgiã-dentista, além do
treinamento voltado aos cuidadores e familiares com relação à higiene bucal do paciente,
existe a possibilidade de recorrer a adaptações das escovas dentárias, à
utilização de dispositivos para manter a boca do paciente aberta durante a
realização da higiene, às técnicas de escovação mais indicadas para cada
paciente e ao uso de escovas elétricas. “A aspiração da cavidade oral durante e
após a higiene bucal para evitar a possível broncoaspiração da saliva e espuma
da pasta dentária, além do uso de colutórios e outros dispositivos para
realizar a higiene oral, como os swabs orais de esponja, estão entre os
recursos disponíveis”.
O importante, segundo Dra. Juliana, é deixar que o
paciente faça o seu autocuidado e, caso comece a ser observada deficiência para
realizá-la, o cuidador/familiar pode completar a higiene oral.
A especialista chama a atenção para a frequência da
higienização. “Além da orientação de como realizar a higiene oral, é importante
alertar para a frequência e momentos em que a mesma será feita, pois muitos
pacientes podem fazer o uso de alimentação por sonda, ou seja, não comem pela
boca, o que leva muitos familiares a não realizarem os cuidados orais por não
saberem que, independentemente da forma que o paciente se alimenta, é essencial
fazer a higiene oral”.
Cuidados gerais
Orientações sobre a dieta também são indispensáveis,
especialmente em relação ao açúcar e carboidrato, que aumentam o risco de
cárie, assim como o não consumo de dieta não condimentada, ácida ou gaseificada
por conta da hipossalivação.
Conforme Dra. Juliana, a Odontologia deve ser
baseada em cuidados gerais preventivos e curativos nos pacientes com
deficiências. O cirurgião-dentista especialista em Odontologia para Pacientes
com Necessidades Especiais é o profissional capacitado para entender de forma
global o processo de saúde-doença e a sua evolução, devendo adequar o
atendimento desde o preventivo, curativo e adaptações de acordo com as fases de
doença. “Acolhimento, comunicação, empatia e humanização são fundamentais para
a criação de vínculo com o paciente e sua família, possibilitando maior aderência
ao tratamento odontológico, às orientações sobre higiene oral, à dieta e aos
cuidados orais”.
Conselho Regional de Odontologia de São Paulo - CROSP
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