Sair de casa, socializar, retomar os velhos hábitos, ir ao cinema, reencontrar amigos, andar pelas ruas, sentar em um restaurante... tudo o que parecia tão simples já não é mais tão trivial para muita gente. Isso porque, depois de mais de um ano e meio com tantas restrições, o medo ultrapassou a saudade que muitos estavam de voltar a viver o ‘novo normal’.
Para o psicólogo e psicanalista Ronaldo
Coelho, da capital paulista, já é possível verificar o efeito da diminuição das
restrições e do imperativo de retoma das atividades e relações presenciais no
consultório de psicanálise. É comum o efeito aparecer como ansiedade social,
"É preciso investigar de onde vem essa ansiedade e essa angústia de estar
novamente com outras pessoas, uma situação que diz mais do que somente o medo
da contaminação", explica.
Em uma analogia
simples, o especialista avalia o mundo agora fora das telas. "Enquanto
estávamos por trás de um computador ou de um celular, havia um tempo delimitado
para falar sobre algo, tratar alguma questão, fazer uma reunião ou conversar um
certo tema. Neste cenário, quando a tarefa se completa, simplesmente nos
desligamos e seguimos nossa vida no conforto de nossas casas. Sem a possibilidade
de simplesmente desligar a própria câmera ou encerrar a chamada quando o
assunto acaba, como fica a interação presencial? Esse pode ser um fator que
desencadeia uma ansiedade social", revela.
Quando compreendemos o
que está havendo, podemos nos reposicionar diante o que nos aparece como perigo
e esta tensão pode ganhar outro sentido. "A pessoa pode entender que a
expectativa de que algo deva estar acontecendo o tempo todo é derivada desse
momento onde a relação se dava assim nas telas, mas que no presencial as
expectativas podem ser outras. Por exemplo, pode se fazer "nada"
juntos e esse ser o motivo do encontro: somente estar juntos, independente do
que aconteça. Isso é libertador", fala Ronaldo.
Segundo estimativas da
OMS, os índices de ansiedade e depressão não irão diminuir com o fim da
pandemia. A pandemia somente acelerou um processo que estava em curso e que
tende a continuar. Portanto, é de se esperar que muitas pessoas continuem
precisando de cuidados com a saúde mental, inclusive para conseguirem retornar
ao trabalho e à rotina existia pré pandemia.
Por fim, Ronaldo dá
uma dica para você identificar em si como está diante desse cenário. "Se a
pessoa já completou sua imunização, bem como os familiares que moram com ela, e
mesmo assim está com medo de encontrar amigos próximos que também completaram
seu ciclo vacinal e que não estão se aglomerando em festas, por exemplo, ela
deve se perguntar do que afinal está com medo. Esse é um termómetro importante,
pois quando o motivo racional da manutenção do isolamento não se sustenta, há
que se pensar que pode estar acontecendo para a Covid um deslocamento de outro
medo."
Ronaldo Coelho - idealizador e
professor do curso Análise do Discurso na Clínica Psicanalítica, que tem por
objetivo formar psicólogos e psicanalistas para realizarem uma análise
consistente de seus pacientes desde a primeira sessão. Atua como psicanalista
em seu consultório particular e mantém o canal Conversa Psi no YouTube.
Graduado em Psicologia (USP) e Mestre em Psicologia Institucional (USP). Foi
professor de Psicologia Médica do curso de graduação de Medicina (UNIFESP) e
preceptor da Residência Multiprofissional em Saúde (UNIFESP). Trabalhou em
hospitais como Hospital São Paulo e Hospital Universitário da USP, onde, além da
assistência aos pacientes e familiares, realizava supervisão clínica de
atendimentos psicológicos desenvolvidos por estudantes e psicólogos, orientação
de pesquisas e aulas em Psicologia Hospitalar.
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