Há uma espécie de lagarta, a do pinheiro,
vulgarmente apelidada de lagarta processionária - com o nome científico de Thaumetopoea
pityocampa – que é um inseto bastante curioso em seu deslocamento.
Em fila, praticamente grudadas umas às outras, andam em procissão, em busca de
alimentos. Experiências já mostraram que quando formam um círculo,
movimentam-se no sentido horário, ininterruptamente e, por mais que seja colocado
alimento no centro deste círculo, sequer percebem a sua existência, por maior
que seja a fome.
O determinismo genético desse animal serve como
metáfora para refletir algumas ações que acontecem no contexto escolar. Não são
poucos os profissionais que erguem bandeiras de luta cujo principal jargão é
“eu sempre fiz assim e deu certo...” e perdem um número sem fim de
oportunidades de reavaliar a sua prática, melhorando-a constantemente. Há
aqueles que se colocam em procissão, repetindo ladainhas e, por não saber (ou
não querer) fazer diferente, encampam discursos de terceiros como seus, sem o
menor questionamento. Acaba se tornando um saber, repetido à exaustão, que
passa a ser seu. Que chance terá a criação, a invenção – que tanto almejamos -
de florescer numa prática estabelecida pela repetição?
São muitas as possibilidades em nossa volta para
ampliar e melhorar o fazer pedagógico e, às vezes, por conta do "ativismo
processionário" - fazer por fazer ou "porque sempre fez assim" -
ficamos míopes em nossas observações e registros, conferindo à nossa
experiência profissional apenas anos de repetição. Toda ação pedagógica é uma
ação de comunicação e relacionamento, transbordante de indícios que permitem
investigar nossas intervenções e, diuturnamente, reorganizá-las.
Outros profissionais, das mais diversas áreas, não
se estabelecem como bons profissionais por terem anos de prática repetida,
aprendida mecanicamente a partir do "ouvir falar". Certamente,
diremos que um profissional é bom quando seu saber é construído por meio da
pesquisa, do estudo e, sobretudo, da articulação entre os diversos
conhecimentos. Assim, para sairmos desse “pensamento processionário” que
enrijece e cristaliza a nossa atuação, necessitamos mais do que vontade.
Precisamos nos perguntar "de que forma as pessoas aprendem? O que a
educação escolar pretende? Quais as interfaces da atuação docente?". Esses
e outros questionamentos são pautas para a discussão entre os profissionais que
pretendem atuar na educação escolar e "desconstruir" o ciclo vicioso
que, muitas vezes, insiste em nos mobilizar.
A pesquisa constante da ação pedagógica traz
consigo possibilidades de mudanças na forma de ver o nosso trabalho, capazes de
gerar movimentos em outras perspectivas, exercitando a criação e a inventividade.
Isso é que nos distingue dos demais profissionais aprisionados em sua prática.
Para fazer ciência e arte na educação escolar, é necessário vazar o pensamento,
perspectivar, problematizar as verdades que nos são apresentadas como lei. Mais
do que compromisso - é nosso dever resgatar essa nobre profissão, sem a qual
nenhuma sociedade é capaz de dignificar seus cidadãos e desenvolver-se de forma
sustentável. E ainda mais: se somos capazes de ser melhor e, por
conseqüência, agir melhor, por que optar por ser uma "lagarta
processionária", contrariando a própria natureza humana?
Acedriana Vicente Vogel -
diretora pedagógica da Editora Positivo
Nenhum comentário:
Postar um comentário