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quinta-feira, 30 de maio de 2019

DO NADA ADMIRÁVEL MUNDO VELHO


            Não chega a ser novidade. A mudança vem acontecendo de modo gradual. Parcela crescente dos brasileiros que um dia confiaram seus votos à esquerda foi mudando de opinião e essa mudança acabou na grande reviravolta da cena política em outubro de 2018. Há quem morra de saudades.

            Vale a pena lembrar, muito especialmente a alguns setores da mídia tradicional (estou falando, entre outros, da Folha de São Paulo, Estadão,  Zero Hora, O Globo e demais veículos do seu grupo) certos fatos relacionados àquela eleição. O candidato escolhido pelos partidos que tradicionalmente formavam a maioria do Centrão era Geraldo Alckmin. As nove siglas que se coligaram para elegê-lo compunham mais da metade das cadeiras na Câmara dos Deputados. Contudo, a coligação em torno do tucano acabou obtendo menos de 5% dos votos. Foi um claro abandono do comandante da nau tucana por seus marujos, que majoritariamente se transladaram para o barquinho de Bolsonaro.

            A jogada valeu para assegurar o mandato de muitos. Diploma pendurado na parede é garantia da autonomia e permite a segunda traição.  Em três meses os ex-marujos de Alckmin e parceiros de Bolsonaro recompuseram o Centrão e já começavam a reabrir a firma quando a opinião pública reagiu nas redes sociais. Imediatamente deram um passo atrás. Em tom de mágoa, afirmaram tratar-se de um mal entendido. Estavam todos cumprindo seus deveres constitucionais.

            Nenhuma das três coisas surpreende. Nem a traição a Alckmin, nem a traição a Bolsonaro, nem a completa traição à verdade contida na afirmação de estarem cumprindo seu dever. Esta última situação só acontece nas raras ocasiões em que o interesse próprio coincide com as exigências  do interesse nacional. O que realmente surpreende é a defesa que os veículos de comunicação  acima mencionados passaram a fazer do Centrão, confundido-o com o Congresso Nacional, buscando torná-lo  imune a toda crítica, numa atitude tipicamente bipolar. Num momento transformam a crítica numa conduta revolucionária, autoritária, capaz de acabar com a democracia; noutro, reduzem a gigantesca mobilização social do dia 26, de apoio ao governo e suas reformas, a Sérgio Moro e a Paulo Guedes, às proporções de um comício na esquina do bar do Zé.

            Nunca na minha vida percebi esses mesmos veículos interessados em preservar a boa imagem do Congresso Nacional. Subitamente, aparecem tomados de um amor fiel e protetor. Não admitem que se olhe atravessado para seus amados. Dizem estar protegendo as instituições. Na mesma linha, comparam a um flerte com o autoritarismo, qualquer crítica a ministros do STF, bem crescidinhos, alias, para se defenderem sozinhos.

            Na lógica desse nada admirável mundo velho, as coisas ficam assim:

{C}·        é proibido criticar o Poder Legislativo;

{C}·        é proibido criticar o Poder Judiciário;

{C}·        das fake news às patadas retóricas, estão liberadas as críticas ao Poder Executivo; 

{C}·        é proibido criticar a orientação de tais veículos. Quem o fizer será acusado de ser inimigo da liberdade de opinião porque essa é uma das opiniões sem liberdade de expressão.

            O fato, porém, é que o nada admirável mundo velho já era.





Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

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