Autor do livro 'Agradeça aos agrotóxicos por
estar vivo', Nicholas Vital fala sobre o "marketing do medo"
promovido pelos defensores dos orgânicos e pode te ajudar a economizar no
supermercado
Em tempos de musas fitness
e uma infinidade de blogs dedicados à alimentação saudável, é natural que novas
dietas revolucionárias surjam a cada dia. Em comum, apenas o fato de todas
essas receitas recomendarem o consumo de frutas, verduras e legumes orgânicos,
tidos como mais nutritivos e saborosos do que os similares produzidos de forma
convencional — algo que nunca foi comprovado cientificamente.
Verdadeira ou não, a
narrativa dos orgânicos colou, a ponto de ser um dos poucos segmentos da
economia a ignorar a crise e manter um crescimento acelerado nos últimos anos.
De acordo com estimativas do setor, a venda de alimentos orgânicos cresce a uma
média de 30% ao ano e já representa um mercado de quase R$ 3 bilhões. Parece muito, mas
na verdade não é nada. Somente em batatas convencionais (cultivadas com
agrotóxicos) o Brasil
produz R$ 5 bilhões.
Para se ter uma ideia da
irrelevância econômica do segmento de orgânicos, as vendas do agronegócio
brasileiro como um todo ultrapassam os R$ 500 bilhões/ano. Ou seja, mesmo
somando-se o mercado informal (vendas diretas, online ou em feiras livres,
sempre sem nenhum controle fiscal ou sanitário) os produtos
"naturais" representam menos de 1% das vendas de alimentos no Brasil.
De acordo com Nicholas
Vital, autor do livro Agradeça
aos agrotóxicos por estar vivo, lançado em julho pela editora
Record, trata-se de um segmento que vive de meias verdades. Segundo o autor,
existem inúmeros mitos sobre os alimentos orgânicos — repetidos à exaustão
pelos defensores da causa — que não se sustentam aos olhos da ciência. Isso
inclui até algumas "verdades" até então inquestionáveis, como as
afirmações de que os orgânicos seriam mais saudáveis, saborosos ou até mesmo
sustentáveis.
"É preciso criar um
vilão, um inimigo público, para que em seguida os comerciantes orgânicos venham
vender a solução para o problema pelo triplo do preço", afirma o
jornalista. "A realidade é que os orgânicos são consumidos exclusivamente
pelos mais ricos. 99% da população se alimenta com produtos convencionais e o
que vemos hoje são pessoas vivendo mais e melhor." Abaixo, o autor cita os
cinco principais mitos:
1º
MITO- Orgânicos são mais saudáveis
Você já deve ter ouvido
falar que os alimentos orgânicos são mais saudáveis, certo? Se isso fosse mesmo
verdade, os produtores orgânicos certamente destacarim esses diferenciais
nutricionais nos rótulos. Não o fazem simplesmente porque não conseguem
comprovar cientificamente esta suposta superioridade. Pesquisadores da
Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, divulgaram recentemente uma
revisão detalhada de 237 estudos científicos comparativos entre alimentos
orgânicos e convencionais publicados em todo o mundo nas últimas quatro
décadas. A conclusão foi que, apesar de mais caros, os orgânicos não eram mais
nutritivos nem mais seguros do que seus similares produzidos de forma
convencional. "Quando iniciamos este projeto, nós imaginávamos que
encontraríamos alguns resultados que confirmassem a superioridade dos produtos
orgânicos sobre o alimento convencional", disse Dena Bravata, um dos
responsáveis pelo trabalho, em entrevista ao jornal e New York Times. "Nós
ficamos totalmente surpresos com os resultados."
2º MITO- Orgânicos são mais
saborosos
Em 2016, o Instituto de
Tecnologia de Alimentos (Ital), entidade vinculada à Secretaria de Agricultura
e Abastecimento do Estado de São Paulo, fez uma revisão de milhares de
trabalhos científicos comparativos publicados em todo o mundo desde os anos
1950. O resultado? Mais uma vez os produtos orgânicos e os convencionais foram
considerados tecnicamente iguais. Os pesquisadores afirmam que é difícil
diferenciar as características desses alimentos mesmo em laboratório. Portanto,
da próxima vez que alguém lhe sugerir que há diferença no sabor da salada
orgânica, desconfie. Assim como o estudo da Universidade de Stanford, o
trabalho do Ital também concluiu que não existem diferenças nutricionais entre
orgânicos e convencionais. "Ambos os argumentos contribuem fortemente para
que tais produtos possam ser precificados com valores acima dos produtos
convencionais, trazendo prejuízos para os consumidores e também aos
produtores", afirma o relatório do Ital.
3º MITO- Orgânicos são mais
sustentáveis
Nos últimos anos, a
palavra "orgânico" se tornou sinônimo de produto sustentável — e essa
é mais uma meia verdade. Por serem cultivados de forma rudimentar, sem a adoção
de tecnologias utilizadas em todo o mundo, os alimentos orgânicos têm uma
produtividade significativamente menor, ou seja, exigem mais áreas para
produzir a mesma quantidade de alimentos. Graças à adoção de tecnologias como
os agrotóxicos, o Brasil de tornou uma potência na produção agropecuária. Para
se ter uma ideia, a produtividade média do feijão aumentou 274% desde 1980, a
soja 176% e o trigo 257%. No caso do milho, a colheita quase quintuplicou: de
21 milhões de toneladas em 1980 para 96 milhões de toneladas hoje, enquanto a
área de cultivo aumentou só 40%. De acordo com cálculos do jornalista Leandro
Narloch, "se tivéssemos que chegar à produção atual de milho com o plantio
natural e orgânico dos nossos avós, seria necessário ocupar mais 38,1 milhões
de hectares além dos 17 milhões atuais. Ou seja: só o aumento da produtividade
do milho evitou a ocupação de uma área maior que os territórios de Roraima e do
Acre."
4º MITO- Orgânicos são livres
de químicos
Uma enquete feita pelo
site Consumer Reports
revelou que 81% dos norte-americanos acreditam que os alimentos orgânicos são
cultivados sem pesticidas ou aditivos químicos — o que é mais uma uma grande
mentira. A única diferença entre os defensivos convencionais e os aprovados
para a agricultura orgânica é que, enquanto os primeiros são formulados e
misturados a outros ingredientes ativos, os praguicidas naturais são utilizados
da forma como são encontrados na natureza. Isso, no entanto, não quer dizer que
eles não sejam tóxicos. Existem centenas de substâncias perigosas, como
enxofre, sulfato de cobre, piretrina, carvão e pó de fumo, que são largamente
utilizadas no cultivo de alimentos orgânicos. No Brasil, um dos produtos mais
usados nas plantações orgânicas é o óleo de neem, um inseticida natural obtido
a partir da prensagem a frio de sementes da espécie Azadirechta indica, originária da Índia, e que possui
mais de 150 compostos bioativos. Se é eficiente contra os insetos, também pode
ser fatal para o homem.
5º MITO- Orgânicos vão
alimentar a humanidade
O discurso é sem dúvida muito bonito, mas infelizmente
não condiz com a realidade. De acordo com dados da IFOAM, as lavouras orgânicas
ocupam cerca de 43,7 milhões de hectares, ou o equivalente a apenas 0,9% do
total de áreas dedicadas à agricultura em todo o mundo. Mais de um terço dessas
terras estão na Austrália, que mantém pouco mais de 17 milhões de hectares de
lavouras certificadas, enquanto a Argentina, segunda colocada, tem apenas 3,1
milhões de hectares. Já o Brasil, tido como celeiro do mundo, possui somente
750 mil hectares dedicados ao cultivo de orgânicos. A produção limitada é
reflexo do baixo consumo desses produtos, mesmo nos países mais ricos. Na
Dinamarca, considerada a nação mais orgânica do mundo, as vendas desses
produtos representam apenas 7,6% do total. Suíça (7,1%), Áustria (6,5%),
Estados Unidos (5%) e Alemanha (4,4%) fecham o ranking dos cinco maiores
consumidores de orgânicos.
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