O tema foi
debatido por especialistas durante reunião na ACSP. Uma das conclusões às quais
chegaram é que a lógica tributária atual não funciona nesse ambiente virtualFreepik
O universo
virtual paralelo que tenta replicar a realidade por meio de dispositivos
tecnológicos deixou de ser brincadeira restrita aos jogadores de games. Hoje,
esse metaverso chama a atenção de empresas de diversos setores, incluindo o
varejo.
A Renner, por
exemplo, inaugurou uma loja na plataforma Fortnite, onde é possível visualizar
em terceira dimensão sua coleção de roupas preparada especialmente para o novo
ambiente. A Nike seguiu o mesmo caminho, com a “abertura” de uma loja na
plataforma Roblox, onde comercializa calçados e roupas para vestir avatares.
As
possibilidades de negócios não param por aí nesse universo virtual. Em novembro
do ano passado, um terreno na forma de NFT – espécie de certificado digital de
propriedade - foi vendido por US$ 4,3 milhões, valor equivalente a cerca de R$
24 milhões, na versão alfa do The Sandbox.
São cada vez
mais frequentes as transações comerciais realizadas no metaverso e esse
fenômeno traz implicações sociais e econômicas diversas que chamam a atenção de
advogados, especialmente tributaristas.
Como será a
tributação nesse ambiente? Quais modalidades de tributos são mais adequadas –
consumo, renda, patrimônio? Como resolver conflitos entre os atores que
interagem nesse universo paralelo? Haverá conflitos de competência entre União,
Estados e Municípios para tributar?
Novo e
instigante, o assunto é rodeado de inúmeros questionamentos ainda sem muitas
respostas, mas foi discutido pela primeira vez na última reunião do Caeft
(Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação), da Associação Comercial
de São Paulo (ACSP), sob a coordenação de Luís Eduardo Shoueri.
RENOVAÇÃO DE
CONCEITOS
Na opinião de
Fernando Aurélio Zilveti, mestre, doutor e livre docente em Direito Tributário
pela Faculdade de Direito da USP, um dos palestrantes convidados do Caeft, uma
das poucas certezas é a de que haverá uma profunda renovação no conceito de
propriedade no mundo real com o avanço do metaverso.
“A criação das
NFTs abriu um leque de possibilidades, exigindo novas interpretações para
definir o que é uma propriedade intelectual”, afirmou.
De acordo com
Thatiane dos Santos Piscitelli, professora de Direito da FGV-SP, um relatório
recente divulgado pelo J.P. Morgan estima que os bens digitais, o que inclui
até obras de arte, movimentam por ano a cifra de US$ 150 bilhões por ano.
Sobre as NFTs,
a advogada explicou que são muitas as incertezas no campo da tributação. Na sua
visão, o fato de representarem um título de propriedade abre brechas para a
discussão futura de uma eventual tributação pelo ICMS (Imposto sobre Circulação
de Mercadorias e Serviços). Até o momento, entretanto, as fazendas estaduais
não se pronunciaram sobre o assunto.
Pelo menos por
enquanto esses títulos de propriedade digital estão igualmente fora do radar da
Receita Federal, mas isso pode mudar no futuro, alertou a especialista.
Até o momento,
o órgão já publicou instruções normativas a respeito das moedas virtuais,
consideradas ativos financeiros digitais e passíveis de tributação pelo Imposto
de Renda nos casos de ganho de capital.
REFORMA
TRIBUTÁRIA
Uma das
conclusões a que chegaram os participantes da reunião é que o sistema tributário
atual é completamente incompatível com esse novo mundo virtual.
“Isso é
preocupante, pois não sabemos até quando poderemos usar os conceitos atuais
envolvendo mercadorias, serviços, posse e propriedade. E vale lembrar que o STF
levou 25 anos para decidir sobre a tributação de softwares”, disse o advogado
tributarista José Eduardo Soares de Melo.
Para Gustavo
Brigagão, tributarista sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados, com o atual
sistema tributário, na hipótese de uma tributação pelo ISS, por exemplo, uma
das primeiras discussões a serem enfrentadas deve girar em torno do local da
prestação do serviço, praticamente impossível de determinar no novo ambiente.
O mesmo impasse
ocorre no caso da escolha pelo ICMS, caso a classificação recaia para uma
mercadoria. “Os fabricantes de mercadorias digitais podem estar espalhados pelo
mundo inteiro e, portanto, será muito difícil determinar a localização do
estabelecimento virtual e onde está a origem e o destino. E isso é fundamental
para a definição de competência dos Estados, caso seja considerado mercadoria,
ou Municípios, no caso de serviços”, explicou.
Presente à
reunião, o economista Marcos Cintra ressaltou que é preciso buscar novas formas
de tributação para lidar com a realidade de novos problemas que devem surgir
com o avanço do metaverso. “Tentar ajustar tributos antigos criados em uma era
analógica às novas perspectivas desse ambiente virtual vai nos levar a discussões
longas e bizantinas”, disse.
Para o
vice-presidente da ACSP, Roberto Mateus Ordine, o novo ambiente virtual tem uma
terminologia avançada e os novos conceitos que deverão surgir para fazer frente
a essa realidade devem gerar apreensão entre os empresários, especialmente os
de pequeno porte. “O nosso desafio a partir de agora será informá-los e, ao
mesmo tempo, protegê-los”, concluiu.
Jornalista
especializada em legislação e tributação
Fonte: https://dcomercio.com.br/categoria/leis-e-tributos/tributaristas-discutem-se-e-possivel-cobrar-impostos-no-metaverso
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