Opioides vêm sendo usados como analgésicos há milênios. São as medicações de escolha para o tratamento da dor aguda moderada à intensa e da dor relacionada ao câncer. Embora seu papel no manejo da dor crônica não relacionada ao câncer seja controverso, há evidências crescentes de seu benefício em certas populações, mesmo com a possibilidade de induzirmos dependência nos usuários desses fármacos.
Historicamente, o
Brasil sofre com o acesso limitado a opioides prescritos, juntamente com muitas
outras classes de medicamentos. Um levantamento recente solicitado à ANVISA
mostra aumento de 465% do número de opioides vendidos em farmácias credenciadas
no Brasil no período 2009 a 2015. O Brasil é um país muito restritivo para a
prescrição de opioides, e o medo do vício relacionado ao seu uso prejudica o
tratamento da dor, sobretudo dos pacientes com câncer onde tal fármaco é padrão
ouro.
A crise
relacionada ao uso abusivo de opioides que assola os Estados Unidos, Canadá e
Europa começa a trazer preocupações sobre as possibilidades de o Brasil ser
atingido pela crise. E a mídia brasileira passa a discutir o assunto.
Felizmente ainda nos encontramos em uma situação confortável, embora
preocupante. Mas precisamos ver os dois lados da moeda.
Além da codeína,
que teve um aumento 5 vezes maior no número de vendas no período 2009 a 2015, o
fentanil e a oxicodona também registraram crescimento no número de prescrições,
refletindo uma mudança notável no uso desses opioides, que são mais potentes.
Ainda assim, o
Brasil apresenta uma prevalência relativamente baixa de uso de opioides no
tratamento da dor, mesmo em pacientes com indicação precisa desses fármacos,
como é o caso dos pacientes com câncer.
A forma mais
adequada de prevenirmos os problemas relacionados ao uso indiscriminado de opioides
é a identificação correta do paciente, o diagnóstico correto da dor e o
tratamento adequado. O uso do opioide requer avaliação abrangente da dor e as
informações obtidas da história e exame físico devem ser utilizadas para um
plano de tratamento seguro. O medo do vício se justifica, porém não deve ser
motivo para não se prescrever opioides em pacientes com dor e vício, pois a dor
pode se tornar um gatilho para a busca do opioide.
O estigma existe
e ele pode levar ao medo e ao isolamento social, impedindo os indivíduos de
procurarem tratamento e/ou ajuda, contribuindo para a menor qualidade dos
cuidados que tais indivíduos recebem.
A proposta é
desenvolver uma força de trabalho para prevenir, tratar e recuperar pacientes
com transtorno de uso de substâncias (TUS), promovendo conhecimento e
competência sobre TUS para profissionais de saúde e pesquisadores, além de
buscar maior apoio público às políticas de saúde e aumentar a conscientização.
Dra. Silvia Tahamtani - médica especializada em Dor do
Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), tem formação em cuidados
paliativos e faz parte do comitê de dor oncológica da Sociedade Brasileira do
Estudo da Dor (SBED).
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