De acordo com
pesquisa realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico, meninos têm desempenho mais baixo em leitura. Especialistas dão
dicas para estimular hábito desde cedoCréditos: Envato
As meninas brasileiras e da maior parte dos países
do mundo, de todas as idades, leem mais que os meninos. Essa é a conclusão de
uma pesquisa realizada recentemente pela Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). No estudo Education at Glance, que analisa os
resultados de leitura do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa)
2018, ficaram claras as diferenças no desempenho de meninos e meninas. O exame
é aplicado em jovens de 15 anos dos 38 países-membros da OCDE e também no
Brasil, Argentina, Índia, China, Arábia Saudita, Rússia, Indonésia e África do
Sul.
Outro estudo, publicado em 2019 na Proceedings
of National Academy of Sciences of the United States (PNAS),
indicou que essa grande disparidade de desempenho em leitura pode, inclusive,
afastar as meninas das carreiras na área de exatas. “A forma como o estímulo à
leitura é realizada contribui para que essa diferença continue existindo”,
opina o gestor do Ensino Médio do Colégio Positivo, Heverton Ruan Peter de
Jesus Ragazzi. No entanto, adotar determinadas estratégias pedagógicas pode
ajudar a estimular desde cedo o interesse pela atividade em meninos, segundo o
especialista. “No contexto atual, devemos repensar o conceito de leitura.
Consideramos atualmente apenas o modelo formal de concluir livros, mas
exercitamos a leitura também em outros formatos, como tutoriais de jogos, por
exemplo”, afirma.
Uma questão cultural
Para a gestora do Ensino Fundamental do Colégio
Positivo - Joinville, Joana Melim Borges Grobler, há um fundo cultural
envolvido nesse problema. “No Brasil, historicamente, os homens são
influenciados a se dedicar à área de exatas e as mulheres à área de humanas.
Homens deveriam estudar para ser engenheiros ou arquitetos, não sendo
necessário apresentar interesse pela leitura, mas pelos cálculos”, explica. As
mulheres, por sua vez, tinham boas chances de seguir carreira no magistério
quando se dedicavam às letras. A gestora da Educação Infantil e dos Anos
Iniciais do Colégio Positivo - Master, Francine Silva, concorda. “Isso tem a
ver com o fato sócio-histórico-cultural de acreditar que as meninas são mais
capazes de fazer doações psicológicas, o que é uma visão equivocada. Esse ponto
de vista formou-se devido ao longo período em que os homens foram protagonistas
de seus lares”, explica. Hoje em dia, entretanto, esse viés é anacrônico, dadas
as profundas mudanças nos papéis de homens e mulheres na sociedade
contemporânea. Para acompanhar essas mudanças, defendem as especialistas, é
preciso iniciar práticas pedagógicas ainda na Educação Infantil.
Além da questão sociocultural, há ainda o apelo dos
recursos tecnológicos que estão à disposição com apenas um toque. A gestora dos
Anos Finais e Ensino Médio do Colégio Passo Certo, de Cascavel (PR), Elaine
Fernandes Fagundes, lembra que os jogos virtuais, a internet e os streamings
são concorrentes muito atraentes das páginas dos livros, uma tentação ainda
mais significativa para os meninos. “Essas atividades acabam sendo mais dinâmicas
e divertidas para a grande maioria. Em uma sala de aula, observa-se que, em
média, apenas 20% dos meninos leem com frequência. Os demais, em se tratando de
uma leitura obrigatória indicada pela instituição educacional, valem-se apenas
da análise rápida de um prefácio ou, simplesmente, nem folheiam o livro”,
conta.
O que fazer?
Por mais grave que seja o cenário, ele pode ser
mudado com atitudes simples, mas que precisam ser adotadas tanto pela escola
quanto pela família. E, quanto mais cedo isso acontecer, melhor. “A leitura
precisa ser estimulada desde sempre. Em geral, meninas são apresentadas aos
livros mais cedo porque eles são voltados à imaginação, aos contos de fadas.
Mas o livro deve ser um objeto pertencente também aos meninos. Os pais também
precisam contar histórias para seus filhos”, aconselha o professor de Língua
Portuguesa e Literatura do Colégio Vila Olímpia, de Florianópolis (SC), Alisson
Feuser.
Incluir a leitura no cotidiano familiar é
fundamental, mas os adultos precisam estar cientes de que, mais que incentivar,
devem dar o exemplo. O gestor do Ensino Médio do Colégio Semeador, de Foz
do Iguaçu (PR), Henrique Pedrotti, destaca que uma das principais tarefas de
pais e educadores para estimular a leitura é o exemplo. “Crianças e adolescentes
leitores são reflexos de adultos que gostam de ler e que têm o hábito da
leitura arraigado na sua rotina”, afirma. A rotina, aliás, ajuda a consolidar o
hábito, transformando aquela atividade em uma parte indispensável do dia.
Também é importante garantir que os meninos tenham
acesso a livros que conversem com seus interesses. Para a gestora da Educação
Infantil e Anos Iniciais Regular e Bilíngue do Colégio Positivo - Santa Maria,
de Londrina (PR), Shirley Cristiane Szeiko, “uma parte muito relevante desse
estímulo é buscar títulos interessantes, ligados aos assuntos que eles gostam.
Criar essa conexão entre a leitura e os interesses que eles já têm é uma forma
simples de tornar a atividade mais divertida”.
Do lado da escola, o esforço
deve ser igualmente atencioso. A gestora da Educação Infantil e dos Anos
Iniciais do Colégio Positivo - Master, em Ponta Grossa (PR), Francine Silva,
ressalta essa necessidade. "Cabe a nós, gestores escolares, conversar,
investigar e orientar os professores. Também precisamos questionar sempre as
nossas práticas, verificar se as atividades que proporcionamos na escola têm a
ver com isso. Será, por exemplo, que as meninas não se identificam mais com o
tipo de história que costumamos ler em sala de aula?”, opina. Por fim, não se
pode abrir mão de acompanhar o desenvolvimento dos meninos para garantir que a
falta de interesse não seja fruto de possíveis dificuldades de concentração e
aprendizagem.
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