Sofremos de uma síndrome crônica que atinge nossos
políticos quando conveniente, que é a alteração do texto constitucional ao
prazer dos ventos que sopram. Digo isso, fazendo referência à PEC 275/2013, de
autoria da deputada Luiza Erundina (PSOL/SP), e que foi desenterrada na
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, pelo deputado Luiz Philippe de
Orleans e Bragança (PSL/SP).
A proposta versa sobre diversas alterações na
lógica de funcionamento e organização do Supremo Tribunal Federal,
principalmente sobre a quantidade de ministros, e a transformação do STF em um
tribunal exclusivo para o julgamento de: ADIs, ADOs, ADPFs, Recursos
Extraordinários e conflitos de competências, e com uma Corte composta por
quinze ministros que vão se debruçar, exclusivamente, sobre matérias de cunho
constitucional.
Numa leitura rápida e baseada na justificativa da
proposição, aparentemente, uma PEC que busca agilizar a atuação do STF,
possibilitando dinâmicas dos ministros focadas em matérias de temas
relacionados à Constituição, entretanto, se formos críticos, a proposição é uma
retirada de poder do Supremo e a reorganização do Poder Judiciário como um
todo, isso depois de um debate sério realizado na aprovação da PEC 45/2004, que
reestruturou o Poder Judiciário no Brasil.
O grande problema da proposição está numa alteração
muito significativa na dinâmica da nossa Corte constitucional, como se
pudéssemos “dinamitar” a lógica da organização do Poder Judiciário do dia para
noite, aumentando a quantidade de ministros e restringindo sua atuação. O mais
curioso é que tal proposição foi apresentada pela deputada Luiza Erundina em
2013, e ficou engavetada desde então, mas tomou força pelos rompantes de um
grupo de parlamentares que consideram a atuação do STF uma ameaça ao atual
governo, e à postura dos ministros “terrivelmente progressista”. Não
estamos falando de uma proposta benéfica ao Poder Judiciário, mas sim, de uma
proposição com fins políticos, que retira o papel de defesa do texto
constitucional dado ao Supremo.
Observando o caminho que a proposição ainda tem a
trilhar, fica claro que a PEC não tem força para ser aprovada, ainda mais em um
momento de tanta conturbação política, que vai culminar com uma das eleições
presidenciais mais acirradas dos últimos anos. De qualquer forma, devo chamar a
atenção para um ponto crucial no debate, que é a postura de muitos parlamentares,
e do próprio presidente da República, em observar o STF como um adversário
político que deve ser restringido e criticado mesmo quando atua na sua função
precípua de guarda do texto constitucional. Tal movimento, que é constante
dentro de uma parcela significativa da sociedade, tem se tornado popular entre
parlamentares que defendem o atual governo, mas também serve de alerta ao que
nos aguarda com uma possível vitória de Jair Bolsonaro em 2022, que é de
intensificação de ataques às instituições e aos Poderes da República.
Devo dizer que propostas semelhantes já foram
apresentadas em diversos países, e, em sua maioria, foram desastrosas para a
dinâmica entre poderes, ainda mais quando tais alterações são organizadas pela
classe política que considera a Corte uma adversária. É importante ressaltar
que mudanças na estrutura dos poderes, na lógica de organização do STF, não são
meros “consertos” do texto constitucional, mas sim, impactantes para o Sistema
Judiciário como um todo, e que já houve ambientes adequados para tal debate,
como a Assembleia Nacional Constituinte e a PEC 45/2004.
Desconfie de quem considera alterar as regras do
jogo enquanto a partida está acontecendo, ainda mais quando tal mudança não é
uma mera aceleração da partida, mas uma alteração do placar do jogo.
Francis
Ricken - advogado e mestre em Ciência Política, é professor da Escola de
Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo (UP).
goes.ricken@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário