Um Ano de Francisco
Em 13 de março de
2013, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio foi eleito papa e adotou o nome
de Francisco, em homenagem a São Francisco de Assis. Em um ano de
pontificado muita coisa aconteceu. A audiência das atividades promovidas pelo
Vaticano mais que quadruplicou e os acessos às redes sociais oficiais da Igreja
dispararam. Neste período, a freqüência nas paróquias européias, até então
declinante, cresceu significativamente. Uma atividade da Igreja nunca reuniu
tanta gente como na Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro.
No final de 2013, o
papa Francisco foi escolhido como personalidade do ano pela revista Times, e
também pela revista The Advocate, especializada na defesa dos direitos dos
homossexuais. Eugenio Scalfaro, editor-chefe do jornal italiano La Repubblica,
confessamente ateu, publicou uma série de perguntas que gostaria de fazer ao
papa, sem, no entanto, esperar que ele as lesse. Dias depois, o próprio papa,
como é de seu costume, pegou o telefone e ligou pessoalmente ao Sr. Scalfaro
convidando-o para um encontro. As respostas às perguntas do editor-chefe, assim
como a íntegra do encontro entre os dois, foram publicadas no jornal.
Das inúmeras
declarações marcantes, proferidas pelo papa nesse curto período de pontificado,
podemos selecionar algumas que servem para traçar o perfil do pontífice.
- Se uma pessoa que é
gay, procura a Deus, e têm boa vontade, quem sou eu para julgá-la.
- Não vou ficar
falando o tempo todo de aborto, casamento gay e uso de contraceptivos, pois a
Doutrina da Igreja já é clara a este respeito, e eu sou filho da Igreja.
- A Corte Eclesial é
a lepra da Igreja.
- Eu não poderia
viver sozinho no Palácio. Preciso de gente, encontrar pessoas, falar com as
pessoas…
- Enquanto não se
eliminar a exclusão e a desigualdade dentro da sociedade e entre os vários povos,
será impossível desarraigar a violência.
- Não
nos preocupemos somente com não cair em erros doutrinais. Porque «é frequente
dirigir aos defensores da “ortodoxia” a acusação de passividade, de
indulgência ou de cumplicidade culpáveis frente a situações intoleráveis de
injustiça e de regimes políticos que mantêm estas situações»
- Quem dera que se
ouvisse o grito de Deus, perguntando a todos nós: «Onde está o teu irmão?» (Gn
4, 9). Onde está o teu irmão escravo? Onde está o irmão que estás matando
cada dia na pequena fábrica clandestina, na rede da prostituição, nas crianças
usadas para a mendicância, naquele que tem de trabalhar às escondidas porque
não foi regularizado? Não nos façamos de distraídos! Há muita cumplicidade...
- Desejo
uma Igreja pobre para os pobres.
- As doenças
enfrentadas por diversas instituições eclesiais, ao longo da história, têm
raízes na auto-referencialidade, numa espécie de narcisismo teológico.
- Prefiro uma Igreja
acidentada, ferida e enlameada por ter saído às ruas, a uma
Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias segurança.
O papa também tomou
decisões profundas e corajosas, que geraram ódio e maledicências nos setores
reacionários da Igreja. Ele confirmou Gerhard Muller, amigo e seguidor do pai
da Teologia da Libertação, o peruano Gustavo Gutierrez, como Prefeito da
Sagrada Congregação para Doutrina da Fé. Depois, o promoveu a Cardeal. O papa
também fez questão de prefaciar um novo livro escrito por Muller com
participação de Gutierrez. No Consistório que criou novos cardeais, a grande
maioria dos nomeados vêm de países em desenvolvimento, inclusive dos países
mais pobres do mundo, como Haiti e Burkina Faso.
Para promover
mudanças na cúria, o papa nomeou um grupo de oito cardeais, de todos os
continentes. Várias sugestões, dadas pelo chamado G8, já começaram a ser
implantadas, como a criação de uma Secretaria especializada em assuntos
financeiros. Ação que reduz as tarefas da antes toda poderosa Secretaria de
Estado.
No aspecto teológico,
o papa Francisco também tem promovido uma revolução. Nas reuniões anteriores à
sua eleição, ele fez um resumo sobre a direção que a Igreja deveria tomar para
reencontrar o seu vigor apostólico. Para ele a Igreja deve sair de si mesma e
ir às periferias geográficas e existenciais, deve resgatar o cristianismo
primitivo, baseado no ensinamento capital: Amar a Deus sobre todas as coisas e
ao próximo como a si mesmo. A principal função da Igreja deve ser evangelizar,
levar Cristo aos que sofrem e estão longe Dele. A Igreja, como dizia Paulo VI,
deve voltar a ser a mãe fecunda que vive a doce e confortadora alegria de
evangelizar.
Mesmo tendo promovido
importantes mudanças, resta muito a ser feito na Igreja. Peçamos a Deus que dê
vida longa a Francisco para que ele possa fazer todas as reformas necessárias
para tornar irreversível o caminho de retorno à Igreja primitiva dos tempos de
Jesus Cristo, a verdadeira Igreja Cristã.
Alcides Leite -
economista e professor da Trevisan Escola de Negócios
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