Passamos anos de nossas vidas profissionais focados
em ascender conforme nossas ambições. Se tornar um C-Level é, para muitos, o
ápice de uma jornada de intensa dedicação, sacrifícios pessoais e tomada de
decisões de alto risco. Ao mesmo tempo, existe um paradoxo preocupante nessa
história: líderes que são mestres em planejar o futuro de grandes organizações,
mas falham em aplicar o mesmo rigor e visão de longo prazo em seu futuro
pós-carreira.
É muito comum vermos executivos brilhantes
planejando fusões, expansões, transformações digitais, estratégias de
crescimento, mas não planejando a si mesmos, pensando quando o crachá deixará
de ser usado em sua rotina. Essa transição não acontece no último dia em que se
senta nessa cadeira. Ela começa muito antes, enquanto ainda está exercendo
tamanha responsabilidade, algo que nem todos compreendem ou se preparam
financeiramente desde cedo.
O que, na prática, influencia esse pensamento e
organização? Basicamente, a forma pela qual cada um enxerga seu trabalho –
sendo um meio de subsistência pessoal, ou realização de carreira, o que faz com
que cada um se conecte de forma completamente diferente com seus papéis e
planejamentos.
Em países economicamente mais desenvolvidos como na
Europa ou nos Estados Unidos, como exemplo, existe uma mentalidade mais
dominante em relação à separação entre “trabalhar para viver” e “viver para
trabalhar”. Nessas regiões, o exercício profissional tende a ser percebido
muito mais como um instrumento, do que uma identidade central, o que faz com
que os executivos sejam mais propensos a enxergar o pós-carreira como parte
natural da vida, o próximo capítulo que deve ser planejado com antecedência, ao
invés de um tema distante de sua realidade.
Em contraste, em muitas economias emergentes, como
a América Latina, o peso cultural e socioeconômico do trabalho é muito maior do
que apenas encará-lo como uma fonte de renda. Vivendo sob instabilidades
econômicas, inflação e demais impactos externos, todas essas influências forçam
os executivos a se prepararem, com muito mais afinco, em seu pós-carreira,
considerado como uma etapa natural de sua trajetória.
Os efeitos da pandemia reacenderam a essencialidade
deste tema para a sociedade global. Prova disso está no relatório "A Vida
dos Aposentados na Economia Pós-Pandemia", o qual analisou as experiências
de aposentados nos EUA após o isolamento social. Segundo o estudo, muitos
aposentados enfrentaram incertezas financeiras devido a inflação, taxa de juros
e volatilidade de mercado — fatores que podem comprometer a estabilidade pós-carreira
se não houver um planejamento devido.
Para os C-Levels, planejar um bom pós-carreira
significa projetar uma segunda trajetória profissional e pessoal que envolva
três frentes fundamentais: sua saúde (física e emocional), alta dose de
autoconhecimento e vocação futura. Todas, gerando um efeito de causa e
consequência para o que irão colher neste futuro.
No primeiro aspecto, esses executivos costumam
enfrentar décadas de jornadas extensas nas quais seus cuidados de saúde acabam
não ganhando tanta prioridade. O resultado é claro: alimentação irregular,
baixa qualidade de sono, falta de atividade física e níveis de estresse acima
da média que, inevitavelmente, prejudicam sua qualidade de vida. Isso cria uma
dualidade preocupante: profissionais que chegam à aposentadoria com grande
bagagem intelectual, mas sem a energia física e mental necessárias para
usufruir disso.
É muito comum que, ao longo destes anos, muitos
acabem se perdendo quanto ao que realmente os motiva em suas carreiras. Afinal,
quanto mais responsabilidade, mais gestão e mais pressão, poucos ainda
compreendem o que os energia profissionalmente. E, sem autoconhecimento, a
transição pós-carreira vira um ciclo de tentativa e erro.
Encontrar sua vocação para essa próxima fase deve
ser construído enquanto ainda se está em atividade, envolvendo questionamentos
como os interesses reais, experiências acumuladas, impactos desejados e modelo
de vida esperado. Os C-Levels que investirem nessa reflexão com antecedência
criarão uma transição mais fluída que os continue motivando, engajando e
satisfazendo.
Ricardo Haag - headhunter e sócio da Wide Executive Search, boutique de recrutamento executivo focado em posições de alta e média gestão.
Wide
https://wide.works/
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