Advogado Leandro Petraglia afirma que nova regra ignora a realidade dos tutores e reforça interesses das companhias aéreas ao excluir animais de suporte emocional da cabine
Publicada em julho deste ano, a nova Portaria nº
17.476/SAS da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) promete atualizar as
regras para o transporte aéreo de animais domésticos. Entretanto, o texto, que
só entra em vigor no dia 20 de outubro, já não é bem-visto por parte de
especialistas em direito animal. Para o especialista em direito animal, Leandro
Petraglia, a norma favorece abertamente as companhias aéreas, em detrimento do
bem-estar dos animais e de seus tutores. “Representa um retrocesso disfarçado
de modernização”, explica.
A nova portaria revoga a anterior, de número 12.307, mas
mantém a essência que, segundo Petraglia, tem sido a tônica da atuação da ANAC
nos últimos anos. “A agência novamente se omite sobre o ponto central da
discussão, a garantia de que animais de suporte emocional possam ser
transportados em cabine. Em vez disso, reafirma que as companhias apenas o
farão se quiserem. Na prática, isso significa que ninguém leva”, afirma.
Uma das principais mudanças trazidas pelo novo texto é a
ampliação do vocabulário normativo, com a introdução de conceitos como “animal
de suporte emocional”, “animal de serviço” e “animal doméstico”. Mas, na
avaliação do advogado, isso não representa avanço real. “A portaria anterior já
tratava de forma simplificada esses termos, e a nova apenas os redefine, sem
criar qualquer efeito prático. É uma tecnicalidade que só serve para reafirmar
a exclusão dos animais de suporte emocional’, ressalta.
Para Leandro, o ponto mais preocupante da nova norma é
justamente a delimitação expressa de que apenas cães-guia — que acompanham
pessoas com deficiência visual — são considerados animais de serviço. “Esse é o
verdadeiro objetivo da portaria, fechar juridicamente a porta para qualquer
possibilidade de equiparação entre os animais de suporte emocional e os
cães-guia. A ANAC quer afastar de vez essa discussão, ignorando o papel
legítimo e comprovado que esses animais têm no auxílio à saúde mental dos seus
tutores”, destaca.
A nova portaria também autoriza, pela primeira vez, que as
companhias aéreas ofereçam o serviço de rastreamento por meio de dispositivos
eletrônicos, como as tags da Apple, nas caixas de transporte de animais
despachados. Embora essa medida possa ser vista como um ponto positivo,
Petraglia relativiza sua eficácia. “É uma medida paliativa e, provavelmente,
cobrada à parte. Não soluciona o problema central, que é a insegurança do
transporte de animais fora da cabine, onde os riscos à saúde e à vida dos
bichos são reais.”
Outra questão criticada pelo especialista é a manutenção
do caráter facultativo do transporte de animais em cabine. De acordo com ele, a
ANAC apenas repete o que já vem sendo feito, deixar a critério das empresas a
decisão de permitir ou não o embarque. “A LATAM, por exemplo, leva animais de
suporte emocional em voos longos, como São Paulo–Cidade do México, com mais de
nove horas de duração, mas se recusa a permitir o mesmo em um voo de 40 minutos
entre São Paulo e Rio de Janeiro. E, muitas vezes, com a mesma aeronave, com a
mesma tripulação. Isso é uma incoerência inaceitável”, afirma.
Para Petraglia, a nova regulamentação acaba por incentivar
ainda mais a judicialização dos casos. “É o Código de Defesa do Consumidor que
tem garantido direitos a tutores que sofrem com a recusa das companhias. A
portaria não cria novos direitos nem fortalece os existentes. Ela apenas
reafirma que o transporte em cabine é uma concessão, e não um direito, o que
fere frontalmente os princípios da dignidade animal e da acessibilidade
emocional.”
Em resumo, a nova portaria da ANAC, embora traga
atualizações pontuais, é vista por especialistas como uma medida que protege
mais os interesses das companhias aéreas do que os dos passageiros e seus
animais. “Estamos diante de um texto que não resolve os problemas práticos e
ainda institucionaliza a exclusão dos animais de suporte emocional do direito
de viajar junto a seus tutores. É uma regulamentação que ignora a realidade
emocional de milhares de pessoas no país”, conclui Petraglia.
A norma entra em vigor oficialmente no dia 20 de outubro
de 2025, após o período de vacância previsto pela própria agência.
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