Criar um diálogo de respeito e qualidade é de
extrema importância para o desenvolvimento de uma criança preparada para o
amanhã
Como a minha relação
conjugal influência na criação do meu filho? Essa é uma pergunta muito
pertinente para todo pai e mãe responderem nos dias atuais. Quando a
criança nasce ela observa o comportamento dos seus genitores e os imita. A
verdade é que os filhos são testemunhas morais do dia a dia dos pais, são com
eles que dão os primeiros passos na aprendizagem de como lidar com um sistema
de regras que encontrarão durante toda a vida. E é ao observar o ambiente dentro de casa, ainda
na infância, que irão estruturar seu comportamento dentro da
sociedade.
É muito antes de ir para a
escola que os filhos são confrontados com regras e questões
morais. O certo ou errado para a criança dependerá de como ela ver que
funcionam as regras em casa. E quando ela é enviada para o ambiente escolar já
terá em sua bagagem esse conjunto de regras do seu primeiro convívio social.
Nesse novo lugar ele influenciará seus amigos, e também será influenciado por
eles, essa troca de informações formará o homem do amanhã. Como já disse Freud:
"a criança é o pai do homem".
Então como os pais podem
fazer para ter sucesso na criação dos filhos?
O primeiro ponto a se
destacar é a comunicação entre os cônjuges. No tom de voz, em como o
marido fala com a esposa e vice e versa.
Um princípio judaico diz que a vida e a morte estão na mão da
fala, que seria o diálogo em um relacionamento, que reflete em todas as outras
relações possíveis na vida do indivíduo: familiares, sociais,
escolares, comerciais, conjugais, entre amigos, entre outras.
A fala é a principal
característica do ser humano, é a comunicação mais sofisticada que o
caracteriza em função de poder de forma complexa, estruturada e aprofundada,
expressar pensamentos e sentimentos, descobertas e frustrações, e os pais
devem utilizar bem essa ferramenta. O diálogo em casa vai demonstrar como a
criança deve ser relacionar com o outro, e ela aprenderá isso ao observar como
será abordada pelo pai e pela mãe.
A importância de
utilizar o diálogo: quantidade x qualidade
Uma pesquisa realizada em
2005 mostra que o tempo gasto pelo homem para conversar com sua esposa é de uma
hora e meia. Parece ser muito pouco, visto que temos 24 horas no dia, mas o que
realmente importa é saber se essa fala é qualitativa ou rotineira, simplesmente
burocrática e, até mesmo, sem nenhuma importância educacional, ética ou
moral.
O problema é que se observou
um diálogo superficial. Falas como: “não esquece disso”, “pague aquilo”, “temos
isso para fazer”, “não esquece aquilo outro”, no geral são sempre falas sobre
rotina da agenda. Essas conversas são necessárias e importantes, mas
é preciso uma que alimente a relação conjugal também. Isso com o tempo vai
desgastar o casal. Destaco que é uma arte ser marido e pai, como é uma arte ser
mãe e esposa.
Estamos vivendo uma crise
no relacionamento entre marido e mulher, onde falas de carinho e
profundidade não encontram espaço. O que acaba por refletir nos próprios
filhos. O grande problema dos conflitos familiares está na possibilidade de se
ter uma pessoa que é um super-pai e um marido ausente, ou o contrário, um super-marido, mas
um pai ausente, o mesmo vale para a mãe. Mas quando se trata do
pai o quadro é mais agravante. Além do maior índice de abandono, muitas
vezes a relação pai e filho se resume a perguntas como: "tomou
banho?", "fez a lição?", "vai dormir!". Isso não
marcará a vida de nenhuma criança, não traçará a personalidade de ninguém.
A fala começa
a perder a emoção e conteúdo, então começamos com uma relação
conjugal medíocre e vamos parar em uma relação com os filhos quase
inexistente, apenas de comandos.
É preciso então resgatar as
frases de efeito que ouvimos dos nossos avós e dos nossos pais, que ilustram respeito,
que contem sabedoria, que vai deixar registrado a marca no filho que
será o homem de amanhã. E não frases burocráticas, ordens, mando e desmando,
isso é um desgaste, embora necessário. Não pode ocupar o tempo
disponível tanto na relação conjugal, como na relação de pai e filho.
Um diálogo que
aponte para o respeito: criando homens e mulheres do amanhã
Respeito, segundo o
judaísmo, é uma das questões mais importantes. De acordo com Maimônides, grande sábio judeu da
idade média, uma das maiores necessidades do homem não é comer, beber e
tão pouco fazer sexo ou ter satisfação no trabalho, mas sim a necessidade de
ser respeitado, de ser reconhecido pelo próximo.
Então, em uma relação
conjugal, que terá impacto nos filhos, o diálogo deverá demonstrar
o respeito do marido para com a esposa, e vice-versa. Se a conversa
apresentar conteúdo, um tema envolvente, a criança será estimulada a ser
extremamente respeitosa e profunda. Isso vai refletir em toda a vida dele.
A preocupação com essa
questão do respeito vai muito além do ambiente familiar. Uma pesquisa de
2013, realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), aponta
que o professor no Brasil perde 20% do tempo para colocar a classe em
ordem e acabar com a bagunça e outros 13% resolvendo problemas burocráticos,
totalizando 33% do tempo usado para esses fins. Para o mesmo propósito a média
de outros países é de apenas 13%. Ou seja, o diálogo não está
surtindo efeito nem dentro da escola. Estamos hoje diante de uma crise de
relacionamento. A começar pelo matrimonial, depois dos pais e filhos e que
alcança educadores e alunos.
Se os pais usarem do seu
tempo estimulando os filhos a pensarem e a conversarem da mesma forma
como eles testemunharam em uma boa relação conjugal, ao lembra-lo de como
havia respeito no olhar para o outro. Com a palavra respeito sendo norteadora
do relacionamento conjugal e familiar, essa qualidade prosseguirá para
os próximos relacionamentos de nossos filhos, sejam com professores,
colegas de sala, amigos, entre outros, os tornando cidadãos do
amanhã, que buscam criar uma sociedade melhor.
Rabino Samy Pinto - formado em Ciências Econômicas, se
especializou em educação em Israel, na Universidade Bar-llan, mas foi no Brasil
que concluiu seu mestrado e doutorado em Letras e Filosofia, pela Universidade
de São Paulo (USP). Foi diretor do Colégio Iavne, por 22 anos. O Rav. Samy
Pinto ainda é diplomado Rabino pelo Rabinato chefe de Israel, em Jerusalém, e
hoje é o responsável pela sinagoga Ohel Yaacov, situada no Jardins também
conhecida como sinagoga da Abolição.
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