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terça-feira, 18 de abril de 2017

Agora é hora de qualidade



Há algumas décadas, em tempos menos tecnológicos, era comum os jovens gastarem o dia na rua. Chão de terra batida, cantigas de roda e o máximo de perigo  era a fuga do irritadiço cachorro da vizinha ou alguma desavença com a turma da rua de baixo. Talvez o passado esteja idealizado pela nostalgia, mas didaticamente serve de ilustração para contrapor à situação atual, marcada pela insegurança e violência, pelo consumismo que define identidades – e frustrações, na impossibilidade de exercitá-lo em tempos de crise – e por amizades mais virtuais do que reais.

Diante desse quadro, é preocupante o levantamento realizado pela ONG Todos Pela Educação com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad): entre as crianças e jovens que estão fora da escola, 62% têm entre 15 e 17 anos. O agravante é que a situação não é causada somente por falta de vagas no sistema de ensino. Em faixas etárias menores, o País beira a universalização, como 90% das crianças entre 4 e 5 anos matriculadas em escolas em 2015 contra 72% em 2005 –  um expressivo salto quantitativo em uma década. Segundo os pesquisadores, os adolescentes se afastam da escola pela reprovação e, especialmente, pela insatisfação com o conteúdo do ensino médio. A análise da ONG Todos pela Educação coincide com um alerta há tempos apresentado pelo CIEE: o ensino médio deveria passar por uma reforma que possibilitasse preparar o jovem para decidir seu futuro e enfrentar os desafios que encontrará após a conclusão desse ciclo, qualquer que seja sua opção: mercado de trabalho, ensino técnico ou universidade.

A complexidade da realidade atual força – e não é de hoje – a escola a se reinventar. A reforma proposta pelo governo federal pode ser um ponto de partida, mas não bastará, sem que seja completada por mudanças no papel da escola e do professor. O domínio de conhecimentos enciclopédicos será  necessário hoje, quando uma pesquisa na internet fornece a informação desejada em segundos? Mais do que memorizar dados e fatos, deveria ser prioridade desenvolver nos jovens a capacidade crítico-analítica para filtrar e interpretar os terabytes de informações que estão ao alcance de um toque na tela do smartphone. Ou seja, vale insistir: como a quantidade já foi suprida, é a hora e a vez de investir na qualidade da educação que formará nossos jovens para o futuro que se desenha.
 




Luiz Gonzaga Bertelli - presidente do Conselho de Administração do CIEE, do Conselho Diretor do CIEE Nacional e da Academia Paulista de História (APH).




A corrupção na cultura, visão e conduta empresarial: onde começou o caso Odebrecht?



O caso Odebrecht é talvez um dos maiores escândalos existentes na sociedade brasileira dos últimos tempos. Tanta comoção só foi equiparada a acontecimentos como o Mensalão, e foi graças à notoriedade de fatos como esses que hoje muito mais atenção é voltada a discussões de grandes episódios de corrupção. Pode se dizer que eles abriram os olhos da população para reflexões produtivas em cima da conduta moral das empresas e governos. No cunho empresarial, a imagem da empresa se desgastou de tal forma que o próprio mercado enfrenta uma reeducação de suas posturas éticas. Muitas organizações buscam se prevenir, mas a maioria ainda está só no começo da compreensão de que essa não é uma discussão legal, e sim moral.

Para analisarmos esse problema é preciso considerar alguns elementos. No mundo natural encontramos constantemente o movimento de causa e efeito, inclusive nas relações humanas. Cada ação advinda dessa relação é definida por uma conduta. Quando questionamos o valor de uma conduta, no caso a ação de corrupção, temos de buscar seu motivador. Aqui podemos considerar três princípios motivadores fundamentais: (1º) apenas eu sou merecedor de bem estar e dignidade; (2º) a maioria das pessoas é merecedora desse mesmo bem estar e dignidade; (3º) todos são detentores de dignidade e merecem bem estar.

O primeiro princípio, o puramente egoísta, está muitas vezes interligado ao poder. Muitos que usufruem desta qualidade de princípio para conduzir suas ações, a fim de conquistar o seu objetivo, poderá afirmar tranquilamente que os fins justificam os meios, já que o fim aqui é conquistar ou manter o poder. Ainda que ele possa ferir a felicidade ou dignidade daqueles a seu redor, a seus olhos sua conduta é confortavelmente justificada. Seu pensamento é: ”fiz o que fiz porque desejei a minha felicidade, o meu poder, naquele exato momento”. Esse indivíduo pensa em curto prazo, se tornando incapaz de abrir mão da própria soberania. É aqui que as empresas corruptas se posicionam.

O segundo princípio, o de buscar a felicidade do maior número de pessoas, já despotencializa o primeiro, que é puramente egoísta. Nota-se aqui uma significativa evolução rumo ao que entendemos por humanidade, mas que ainda não abarca o todo. Apesar dos esforços, o “todo” é difícil de atingir, principalmente pela inegável dificuldade em equilibrar igualdade e equidade nas condutas. Apesar disso, já um pensamento melhor do que o anterior. É aqui que a maioria das empresas acaba se posicionando.

O terceiro princípio, o que reconhece que todos são detentores de dignidade, é o mais nobre. Apesar da sua grande dificuldade em superar sua própria condição utópica, ele não deixa de ser o grande objetivo para um mundo verdadeiramente justo para todos. Ainda que sua condição seja ideal, mas impossível 100%, ele é o princípio que deverá nortear todas as condutas, buscando a convivência mais plena e digna. Trocando em miúdos, o mínimo que podemos estabelecer enquanto ético é o segundo princípio, mas sempre na tentativa de conquistar o terceiro. Na segunda postura há uma ética que mostra entendimento, e na terceira, a busca pelo esclarecimento, uma verdadeira maturidade intelectual sobre a ética.

Dessa forma, podemos entender que o caso Odebrecht começou quando as ações estavam ligadas ao primeiro princípio, que considera os interesses pessoais como sua guia de ação. Mesmo quando um grupo é beneficiado é somente uma minoria. Ou seja, nem atinge à segunda proposta de conduta, onde ao menos a maioria é beneficiada. O fato começa na ética menos nobre, na moral egoísta ou na ausência de moral. 

Isso nos leva à consideração de outro aspecto da situação, o do tipo de visão que motivou essa conduta: a visão em curto prazo. Esse tipo de visão deixa armadilhas a médio e em longo prazo, sobretudo em situações que mais tarde serão punidas pela lei, sem contar o comprometimento da imagem da empresa. 

O fator seguinte é o da cultura. Entende-se como qualidade da cultura dessa empresa que, ao menos naquele momento ou gestão, ela tem um comando egocêntrico e individualista - já que isso parte do princípio de pensamento de quem está nessa posição de decisão e quer manter ou conquistar o poder a todo custo.

Disso surge o problema que levou à Odebrecht a enfrentar toda essa situação. Visão somada a conduta e cultura alinhadas a esses valores negativos, geraram a corrupção. Entende-se corrupção como um ato de deterioração (do nome da empresa), de modificação (do fim ultimo da empresa que era ser uma construtora) e adulteração (quando se sai dos interesses maiores da empresa para se atender aos interesses de um grupo menor de pessoas).

Isso nos ajuda a entender e a elucidar que não foi a empresa Odebrecht que foi corrupta. Há uma gama de funcionários e até de ações positivas que compõem a empresa, que nada tinham a ver com isso. A corrupção vem do grupo de “governantes”, representantes ou líderes daquela específica gestão da empresa. A empresa é muito mais do que eles; apesar de que foram eles que conduziram a atitudes corruptas. Eles corromperam o propósito da organização para um fim particular, através de, por exemplo, o uso de suborno ativo ou passivo.

Por fim, analisando todos esses fatores, chegamos a conclusão de como prevenir situações semelhantes: respeitando o fim último da empresa. Como organização ela tem responsabilidades como continuar existindo a curto, médio e longo prazo. Ela deve trazer lucro, exercer sua função proposta, manter-se contínua. Para que isso seja feito é preciso que haja na empresa uma cultura que considera fomentar o diálogo da ética em nível de entendimento e, posteriormente, esclarecimento. Esse é o ideal para que se mantenha a dignidade humana, que é o propósito final da ética como já dizia o filósofo Immanuel Kant. A dignidade constrói uma sociedade saudável e quando as empresas são guiadas por essa máxima elas se mantem livres de corrupção, respeitando a moral antes da lei, evitando que até mesmo essa seja quebrada.




Samuel Sabino - professor na Escola de Gestão da Anhembi Morumbi, filósofo e mestre em bioética. Ele é fundador da Éticas Consultoria e ministra o curso de Inner Compliance, com foco em ética no meio corporativo.




A importância da acessibilidade digital para deficientes auditivos



A internet é uma fonte de conhecimento, entretenimento, relacionamento e muito mais. Ela realmente expandiu os horizontes para toda a população global, e apesar dos nossos problemas de conexão, o Brasil também está nesse universo expandido que é a globalização digital. Entretanto, há uma grande parcela da população que é privada disso devido a problemas envolvendo a deficiência auditiva.

Atualmente se estima que um em cada quatro brasileiros possua algum tipo de deficiência. Quando nos focamos em apenas uma dessas deficiências, a surdez, podemos arredondar o número para 10 milhões de cidadãos com algum grau de perda auditiva. O que a maioria das pessoas não sabe é que a surdez afeta também a compreensão da língua portuguesa.

O Censo do IBGE de 2010 estimou que 70% dos deficientes auditivos, 7 milhões de brasileiros, não conseguem lidar bem nosso idioma, isso ocorre por diversos motivos, porém, um dos principais é que o português brasileiro é uma língua bastante fonética, e o aprendizado durante a alfabetização está muito ligado aos sons. Portanto, adaptar conteúdo online com legenda não é necessariamente o caminho ideal para a inclusão dessas pessoas.

Apesar da Lei Brasileira de Inclusão ter entrado em vigor em janeiro de 2016, não são todos os sites que são acessíveis ainda. Para esses milhões de brasileiro, o mundo ainda é off-line. Existem alguns iniciativas que estão buscando essa equidade. A L’Oréal, multinacional de cosméticos e beleza, é uma delas.

O ponto inicial dessa jornada é o projeto do portal Voz da Beleza, concebido para ser a plataforma de SAC do grupo L’Oréal para os consumidores brasileiros. Como o foco do projeto era entregar a todos os consumidores, informações completas sobre os produtos de todas as marcas. A ideia de construir um site acessível passou a fazer todo o sentido. A CRP Mango, empresa especialista em marketing digital, esteve à frente do projeto e cuidou para que o portal fosse amigável ao público deficiente auditivo, utilizando a ferramenta Hand Talk como base. 

A aplicação é um tradutor automático de texto em Libras, a linguagem brasileira de sinais. O portal nasceu com essa iniciativa, visando não só cumprir a lei, mas também incluir aqueles que muitas vezes eram excluídos. Em pouco tempo, a solução passou a ser aplicada para todos os sites brasileiros do grupo. A iniciativa foi tão bem recebida que acabou reconhecida pela matriz, chegando a ser destaque em publicações da imprensa francesa.

Meses depois 97% das páginas da empresa já estão adaptadas, incluindo e-commerce. A iniciativa foi a primeira do gênero, e foi apresentada ao Grupo em outubro, durante a edição de 2016 dos Troféus para Iniciativas de Incapacidade. Além da tradução para Libras, muitos sites da marca já são compatíveis com ferramentas para deficientes visuais, além de serem parcialmente navegados com o teclado.

Muitas outras marcas já estão correndo atrás de realizar esse processo, não só por demanda legal, mas por que vivemos em uma época de inclusão, onde problemas e erros passados são opbservados, corrigidos e op que se busca é mais bem estar social aliado à tecnologia. Esse caso foi apenas um exemplo de um projeto em que tive o privilégio de trabalhar.

Vivemos em uma era digital, mas não para todos. A acessbilidade é essencial para que se guie o futuro da sociedade para um local onde mais vozes sejam ouvidas. O século XXI é o tempo do crescimento através da cooperatividade, da observância da moral e do bem estar. Com a dignidade humana respeitada, mais se multiplica o acesso ao conhecimento, mais ele se espalha e maior é o progresso. A acessibilidade não é só para incluir, é para ampliar.





Diego Puerta - formado em Sistemas de Informação, especialista em marketing digital, e Diretor da CRP Mango.





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