Há algumas décadas, em tempos menos tecnológicos,
era comum os jovens gastarem o dia na rua. Chão de terra batida, cantigas de
roda e o máximo de perigo era a fuga do irritadiço cachorro da vizinha ou
alguma desavença com a turma da rua de baixo. Talvez o passado esteja
idealizado pela nostalgia, mas didaticamente serve de ilustração para contrapor
à situação atual, marcada pela insegurança e violência, pelo consumismo que
define identidades – e frustrações, na impossibilidade de exercitá-lo em tempos
de crise – e por amizades mais virtuais do que reais.
Diante desse quadro, é preocupante o levantamento
realizado pela ONG Todos Pela Educação com base nos dados da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios (Pnad): entre as crianças e jovens que estão fora da
escola, 62% têm entre 15 e 17 anos. O agravante é que a situação não é causada
somente por falta de vagas no sistema de ensino. Em faixas etárias menores, o
País beira a universalização, como 90% das crianças entre 4 e 5 anos
matriculadas em escolas em 2015 contra 72% em 2005 – um expressivo salto
quantitativo em uma década. Segundo os pesquisadores, os adolescentes se
afastam da escola pela reprovação e, especialmente, pela insatisfação com o
conteúdo do ensino médio. A análise da ONG Todos pela Educação coincide com um
alerta há tempos apresentado pelo CIEE: o ensino médio deveria passar por uma
reforma que possibilitasse preparar o jovem para decidir seu futuro e enfrentar
os desafios que encontrará após a conclusão desse ciclo, qualquer que seja sua
opção: mercado de trabalho, ensino técnico ou universidade.
A complexidade da realidade atual força – e não é
de hoje – a escola a se reinventar. A reforma proposta pelo governo federal
pode ser um ponto de partida, mas não bastará, sem que seja completada por
mudanças no papel da escola e do professor. O domínio de conhecimentos
enciclopédicos será necessário hoje, quando uma pesquisa na internet
fornece a informação desejada em segundos? Mais do que memorizar dados e fatos,
deveria ser prioridade desenvolver nos jovens a capacidade crítico-analítica
para filtrar e interpretar os terabytes de informações que estão ao alcance de
um toque na tela do smartphone. Ou seja, vale insistir: como a quantidade já
foi suprida, é a hora e a vez de investir na qualidade da educação que formará
nossos jovens para o futuro que se desenha.
Luiz Gonzaga Bertelli - presidente do
Conselho de Administração do CIEE, do Conselho Diretor do CIEE Nacional e da
Academia Paulista de História (APH).
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