Com 13º salário, tempo livre e clima de festas, período favorece impulsividade e pode reativar ciclo do vício
O pagamento do 13º salário e o clima de fim de ano podem representar mais do que simples comemoração. Para quem tenta se manter longe das apostas, o período combina fatores que favorecem recaídas, como dinheiro extra, tempo livre e um ambiente de euforia coletiva. É o que alerta o psicólogo Leonardo Teixeira, especialista em vícios comportamentais e criador do programa Cartada Final, voltado à recuperação de apostadores.
“O fim do ano é o terreno perfeito para o autoengano. A pessoa pensa que é ‘só dessa vez, é só um presente de Natal’. Mas o cérebro não entende isso como exceção, ele entende como recomeço”, explica Teixeira.
Segundo o psicólogo, o 13º salário funciona como um gatilho de “autorização emocional”. O ganho inesperado desperta a sensação de que se pode arriscar sem culpa. “A pessoa acha que está no controle, mas o vício trabalha em silêncio. Quando ela percebe, já está de novo naquele ciclo de tentar recuperar o que perdeu”, afirma.
Um levantamento da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e do SPC Brasil, divulgado em novembro, mostra que 62% dos brasileiros admitem comprar por impulso e 40% gastam mais do que podem. Para Leonardo Teixeira, o dado reforça como o comportamento de risco não está restrito ao jogo. “O cérebro reage da mesma forma diante de qualquer promessa de recompensa rápida, seja uma aposta, uma promoção ou uma oportunidade de ganho fácil”.
O especialista ainda lembra que o sistema de recompensa do cérebro, impulsionado pela dopamina, é o mesmo que atua em outros comportamentos compulsivos, como compras e jogos digitais. “A dopamina não é a molécula do prazer, é a molécula da expectativa. O problema não é o dinheiro, é o que ele representa emocionalmente. A pessoa sente um prazer antecipado só de imaginar o que pode ganhar”.
Para ele, o risco não é apenas financeiro, mas também emocional. “A recaída vem acompanhada de culpa e vergonha. É um efeito dominó: o sujeito aposta, se sente culpado, promete parar, mas a ansiedade cresce, e ele aposta de novo para aliviar a tensão. Esse é o ciclo do vício”, descreve.
Teixeira orienta que o
período de festas seja planejado com antecedência para evitar situações que
possam servir de gatilho. “Não
é o momento de testar limites. É o momento de se proteger. Evite aplicativos, grupos
de apostas e até conversas que lembrem o tema. O cérebro associa tudo isso ao
prazer e pode reativar o impulso”, recomenda.
Ele reforça que autocontrole não é resistência, mas estratégia.
“Quem tenta vencer o vício na força de vontade está fadado a se frustrar. O autocontrole não é dizer ‘não’, é se afastar do ‘sim’. É escolher não se expor. Isso é maturidade emocional”.
Para o psicólogo, a
prevenção passa também por substituir o estímulo. “O cérebro precisa de novas fontes de prazer. Atividade
física, convivência, descanso, espiritualidade, tudo isso libera dopamina de um
jeito equilibrado. O problema nunca foi sentir prazer; o problema é depender
sempre do mesmo caminho para senti-lo”.
Como evitar recaídas durante o fim de ano
·
Planeje o uso do 13º salário com antecedência;
·
Evite aplicativos e grupos ligados a apostas;
·
Mantenha rotina equilibrada, com atividades prazerosas e
descanso;
·
Peça apoio de familiares ou amigos próximos;
· Retome o acompanhamento terapêutico se perceber aumento do impulso.
“A recaída não começa no dia da
aposta, começa no pensamento de que está tudo bem apostar só um pouquinho. É
nesse ponto que o vício volta a ganhar espaço”, conclui Teixeira.
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