Com microfones e câmeras
profissionais, streamers chineses têm gravado vídeos nos endereços mais ricos
do país para estimular os algoritmos de plataformas como o YouTube a
distribuírem seus conteúdos entre um público mais abastado Reprodução
Se pudesse escolher, abriria um
negócio em um endereço popular ou em um bairro de luxo, onde o dinheiro está
concentrado? Uma escolha parecida com essa tem levado streamers (criadores de
conteúdo) a invadirem bairros nobres da China somente para gavar seus vídeos.
Ao passar por alguns desses
locais, é muito comum se deparar com quilômetros de calçadas que servem de
cenário para influenciadores. Com luzes LED, ring lights, tripés, microfones e
câmeras profissionais, esses streamers transmitem suas lives (vídeos ao vivo)
sentados no chão.
Parece incomum, afinal, há
diversas opções de locais mais agradáveis e até mesmo mais bonitos para uma
gravação, mas tudo acontece por conta de uma estratégia.
A ideia por trás dessas lives é
se aproveitar do recurso de localização e se aproximar geograficamente de
usuários mais ricos para que o algoritmo de plataformas de streaming recomende
o conteúdo para o público daquele bairro. Ou seja, uma audiência de poderio
financeiro mais elevado. E assim, uma maior possibilidade de que as doações
recebidas sejam mais altas.
A tendência foi trazida à
público pela youtuber Naomi Wu, uma das principais criadoras de conteúdo
chinesas na área da tecnologia. No final de fevereiro, ela publicou uma série
de tweets com fotos que mostram streamers fazendo transmissões ao vivo nas ruas
de seu país e deu início a um verdadeiro debate no Twitter.
As fotos evidenciam o que
parece ser uma nova tendência na China. Nelas, a maioria dos streamers atuando
ao ar livre aparenta ser formado por mulheres.
Como tudo gira em torno de
monetização, Samuel Pereira, especialista em marketing digital, não descarta
algo similar no Brasil. Pereira recorda que diferente de alguns anos atrás,
quando as marcas e pessoas agiam tendo em mente a preferência e expectativa do público,
agora, nossas atitudes são pensadas para agradar algoritmos. Ou seja, a
inteligência artificial.
Na plataforma Huajiao, uma das
mais populares do país, apenas 5% dos streamers conseguem ganhar dinheiro.
Deles, apenas 0,2% — ou 19.000 dos 10 milhões de usuários — consegue um valor
acima de 10.000 yuans (R$ 7.558) ao ano, enquanto outros 465.000 arrecaram
apenas 0,05 a 500 yuan (R$ 378), segundo dados divulgados em dezembro do ano
passado pela Huafang, dona do serviço.
Embora pareça algo natural, a China
luta para conter gastos de fãs e sonegação dos streamers. O país regula a
indústria do live streaming desde junho de 2022, quando divulgou 31
comportamentos proibidos em lives, como fazer referências políticas ou
propagandear um estilo de vida extravagante.
O maior live streamer do país
recebeu uma multa de milhões de dólares no final de 2021 por sonegação fiscal.
Huang Wei, mais conhecido como Viya, chegou a se desculpar publicamente, mas
perdeu as contas nas redes sociais e nunca mais voltou a fazer lives.
Outra vertente desse movimento,
as live commerces também atraem os influenciadores chineses. O país ainda é a
maior referência sobre o assunto. Mais de 10 milhões de transmissões ao vivo já
foram feitas, movimentando US$ 157 bilhões pelo mundo e gerando 1,7 milhão de
empregos.
Pereira destaca que, durante a
pandemia, muitos dos pequenos lojistas usaram as live commerces, que tinham
participações recordes. No entanto, o movimento arrefeceu com o retorno das
pessoas às lojas físicas.
Ainda assim, o especialista
alerta que o comportamento dos chineses costuma ser muito harmônico com a
evolução do algoritmo, e por isso, talvez seria interessante dar mais atenção
ao live commerce.
João Fernando Saddock,
especialista em marketing digital, concorda. Para ele, os negócios brasileiros
têm muito potencial para avançar no live commerce.
"As facilidades comerciais e transacionais são ilimitadas para que isso cresça. E o público brasileiro é muito propenso a aproveitar ofertas e exclusividades. Esse apelo é crescente e vale a pena ser acompanhado", diz.
https://dcomercio.com.br/publicacao/s/o-que-as-ruas-da-china-podem-ensinar-ao-seu-negocio
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