Opinião
Um em cada quatro brasileiros utiliza os planos de
saúde. Essa modalidade contratual tão importante frequentemente gera discussões
na justiça, e, entre os temas mais debatidos, a extensão da cobertura com
certeza tem destaque. Entre outros aspectos, os tribunais discutem a
natureza do rol de procedimentos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS). Em outras palavras, a questão é definir em quais situações
os planos de saúde são obrigados a cobrir os procedimentos, exames e
tratamentos.
Em recente decisão, a 2.ª seção do Superior
Tribunal de Justiça estabeleceu que o rol da ANS é taxativo. Esse julgamento
teve ampla repercussão, afinal, estabelece que as operadoras são
obrigadas a cobrir somente procedimentos que estejam na lista da ANS. A tese,
ou seja, a interpretação pode ser dividida em quatro itens: o rol de
procedimentos da ANS, em regra, é taxativo; o plano de saúde não é obrigado a
arcar tratamento que não conste do rol da ANS, desde que esteja prevista uma
alternativa eficaz, efetiva e segura prevista na listagem; é possível contratar
coberturas adicionais, ou seja, “extra rol”; e, por fim, se não houver
alternativa de tratamento no rol, pode ser coberto o tratamento indicado por
médico ou odontólogo desde que, ao mesmo tempo, sua inclusão não tenha sido
negada pela ANS, existam evidências científicas suficientes e recomendações de
órgãos técnicos de renome. Exige-se também, sempre que possível, que o juiz
escute pessoas ou entes com especialidade em saúde, inclusive a própria
comissão responsável pela atualização do rol.
Em termos práticos, a decisão do Superior Tribunal
de Justiça confere uma importância central para o rol da ANS, antes considerado
uma simples referência. Além disso, estabeleceu regras mais claras acerca das
possíveis exceções, restringindo a possibilidade de ultrapassar o rol.
É interessante notar que essa mudança de
entendimento veio acompanhada da mudança na sistemática da atualização da lista
da ANS. A legislação vigente reduziu o tempo de análise pela ANS para 180 dias
(prorrogáveis por mais 90), e, no caso de inclusão de novos medicamentos para
tratamento oral e domiciliar contra o câncer o prazo é de apenas 120 dias
(prorrogáveis por mais 60). Uma vez que o procedimento é incluído no rol, a
cobertura se torna obrigatória em apenas 10 dias. E o que acontece se a ANS não
cumprir os prazos? Ocorre a inclusão automática da cobertura. Em outra mudança
importante, as tecnologias incorporadas ao SUS são igualmente acrescentadas no
rol da ANS em um prazo de 60 dias.
Verifica-se um amplo conjunto de mudanças em
relação ao rol. A interpretação de sua natureza taxativa certamente limita o
acesso a alguns procedimentos, mas, por outro lado, organiza o sistema, confere
mais previsibilidade para os pacientes, médicos e planos de saúde. A maior
velocidade na avaliação e incorporação dos procedimentos igualmente beneficia
os pacientes, com uma vantagem a mais: o Judiciário deixa de ser uma etapa
necessária para alcançar o acesso aos tratamentos. Entre críticas e elogios,
não resta dúvida que a judicialização não é o remédio adequado para a saúde.
Gabriel Schulman - doutor em Direito, especialista em Direito da Medicina, advogado e professor da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo (UP).
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