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segunda-feira, 11 de julho de 2022

Dia Mundial Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), chama a atenção para o impacto da pandemia de Covid-19

Estudo espanhol mostrou que a falta de acompanhamento médico multidisciplinar levou 70% da população entre 7 e 12 anos, a apresentar distúrbios do sono; 54% ficaram mais ansiosas e 9% tiveram sintomas depressivos

 

esta data é celebrada no mundo todo como o Dia Mundial do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). Ela foi criada para conscientizar e desmistificar a população sobre o transtorno que atinge entre 2% e 7% das crianças e adolescentes no mundo. Aqui no Brasil, estima-se que 5,8% dessa população sofra os efeitos do transtorno neurobiológico como desatenção, hiperatividade e impulsividade. “O TDAH é um transtorno multifatorial, de alta frequência e grande impacto sobre o portador, sua família e a sociedade. É caracterizado por dificuldade de atenção, hiperatividade e impulsividade que podem combinar-se em graus variáveis, tendo início na primeira infância e podendo persistir até a vida adulta”, afirma Rubens Wajnsztejn, médico neurologista da Infância e da Adolescência, Ex-Presidente e atual Diretor da Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil (SBNI), presidente da Associação Pan-Americana de Medicina Canabinoide (APMC), coordenador da residência médica em Neurologia Infantil da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) e membro do Núcleo de Avaliação Interdisciplinar da FMABC.

Não podemos generalizar que todas as crianças que são agitadas tenham o diagnóstico de TDAH. Afinal, aproximadamente 90% das crianças entre três e cinco anos podem apresentar uma agitação psicomotora, que tende a desaparecer com a maturação do sistema nervoso, normalizando-se, portanto, estes aspectos comportamentais, que muitas vezes são confundidos com distúrbios.

Para a OMS (Organização Mundial da Saúde), o TDAH faz parte do grupo de transtornos hipercinéticos caracterizados por início precoce (habitualmente durante os cinco primeiros anos de vida), com a falta de perseverança nas atividades que exigem um envolvimento cognitivo e uma tendência a passar de uma atividade para outra sem finalizar nenhuma. Tudo isso associado a uma atividade global desorganizada, incoordenada e excessiva. Os transtornos podem ser acompanhados de outros sintomas. “As crianças chamadas hipercinéticas são frequentemente imprudentes e impulsivas, sujeitas a acidentes e incorrem em problemas disciplinares, mais por infrações não premeditadas de regras, que por desafio deliberado. Suas relações com os adultos são habitualmente marcadas por uma ausência de inibição social, com falta de cautela e reserva normais. São impopulares com as outras crianças e podem se tornar isoladas socialmente”, alerta a professora Alessandra Bernardes Caturani, psicóloga, psicopedagoga e neuropsicóloga, coordenadora do Núcleo de Avaliação Interdisciplinar da FMABC, preceptora na residência em Neurologia Infantil da FMABC e idealizadora do Movimento Dislexia TDAH GABCD.

Segundo a OMS, esses transtornos podem ser acompanhados, em determinados casos, de um déficit cognitivo e de um atraso específico do desenvolvimento da motricidade e da linguagem.

 

Crianças e adolescentes com TDAH e as implicações da pandemia de Covid-19

As medidas de isolamento social durante a pandemia de Covid-19 fizeram com que crianças e adolescentes diagnosticados com TDAH sofressem mais os impactos de distanciamento físico e apresentassem mais problemas de comportamento. De acordo com um estudo de coorte transversal feito entre 20 e 30 de julho de 2020, na Espanha, para avaliar o impacto da Covid sobre as crianças e adolescentes com TDAH durante a primeira onda de isolamento social, 70% das crianças e adolescentes de 7 a 12 anos com TDAH apresentaram distúrbios do sono. 54% apresentaram sintomas de ansiedade e 9% sintomas depressivos. Isso mostrou que tanto as crianças como os adolescentes com o transtorno são uma população mais vulnerável aos efeitos da Covid, em especial para distúrbios neuropsiquiátricos. Outro estudo publicado este ano na Revista Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, que entrevistou 40 cuidadores de crianças com TDAH, demonstrou um maior agravamento de ansiedade e na tolerância à frustração. Esses aspectos mostram o quanto o acompanhamento dos serviços de saúde mental é importante para o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes. “Nesse período de pandemia, notamos que muitos pais ou responsáveis perderam seus postos de trabalho e sentiram dificuldade em manter o acompanhamento interdisciplinar dos pacientes. Seja porque não havia na rede pública um acompanhamento online ou porque os responsáveis não tinham condições financeiras para dar continuidade ao tratamento (como ter recursos financeiros para prover o meio de transporte para levar as crianças às consultas), tão importante para o seu desenvolvimento”, observa a neuropsicóloga Alessandra Bernardes Caturani.

 

Como é feito o diagnóstico e tratamento do TDAH?

Tanto o processo para diagnóstico quanto o tratamento do TDAH são complexos e merecem muita atenção, não só pelo caráter dimensional dos sintomas de desatenção e/ou hiperatividade, mas também pela alta frequência de comorbidades apresentadas pelos pacientes. São utilizados critérios diagnósticos publicados nos dois manuais referidos, DSM-5 e CID-11, juntamente com uma avaliação de uma equipe com multiprofissionais, com protocolo interdisciplinar. “Diante de um quadro de TDAH é muito bem-vinda a indicação de acompanhamento psicológico. Quando o aluno apresenta prejuízos ou comorbidades como, por exemplo, dificuldades motoras e de aprendizagem, se faz muito necessário atendimento em terapia multidisciplinar, envolvendo psicologia, psicopedagogia fonoaudiologia e em determinados casos, a terapia ocupacional”, afirma Alessandra. “Vale ressaltar que é de suma importância que seja realizado um acompanhamento médico com neurologista e/ou psiquiatra infantil e da adolescência, visando o monitoramento do desenvolvimento e da maturação e da medicação, quando essa se fizer necessária”, afirma o médico.

E é fundamental, segundo os especialistas, que essa equipe multidisciplinar trabalhe em conjunto para análise da evolução do prognóstico que poderá apontar melhoras significativas. Ou, no caso de não demonstrar evolução positiva, redirecionar com as áreas novas orientações e procedimentos.

 

Medicamento é sempre recomendado? Por quê?

De acordo com os especialistas, os medicamentos utilizados para crianças e adolescentes com TDAH atuam no aumento da disponibilidade de neurotransmissores envolvidos no transtorno, como a dopamina e a noradrenalina. Os psicoestimulantes, tais como o metilfenidato e a dextroanfetamina, são mais eficazes no tratamento de sintomas de TDAH centrais e têm perfis de efeitos adversos geralmente aceitáveis. Com tamanho de efeito menor seguem-se atomoxetina, tricíclicos, bupropiona, modafinila, guanfacina e clonidina. Altura, peso, frequência cardíaca, pressão arterial e a adesão ao tratamento devem ser registrados nas visitas de acompanhamento. “Nos casos leves, a psicoeducação associada à terapia comportamental pode controlar os sintomas, sem necessidade de medicação. Porém, nos casos moderados e graves, a indicação de tratamento medicamentoso associado às orientações e terapias se torna fundamental”, assegura Dr. Rubens .

 

Quanto mais cedo o diagnóstico, melhor será o seu desenvolvimento

A identificação precoce de um transtorno de neurodesenvolvimento é apontada por diferentes estudos como a situação ideal de diagnóstico, pois o processo de reabilitação depende da neuroplasticidade que está ligada à idade da criança e segue uma cronologia de maturação das estruturas cerebrais. O TDAH pode ser identificado a partir de fatores de risco, genéticos e ambientais e de acordo com o Consenso de especialistas, pode ser tratado com medicação, a partir do terceiro ano de vida em função da intensidade dos sintomas.

O TDAH, segundo especialistas, é um transtorno ainda subdiagnosticado em nosso país e isso seguramente desencadeia prejuízos significativos na vida do paciente, bem como na sua saúde física e mental, gerando impactos na família, no desempenho escolar, social, acadêmico e profissional.

Mas, de acordo com a nova Lei 14.254/21, sancionada em novembro de 2021, o poder público terá de desenvolver e manter programa de acompanhamento integral de educandos da educação básica com Dislexia e TDAH ou outro transtorno de aprendizagem. E isso se refere tanto a um programa de acompanhamento precoce como o encaminhamento do educando para o diagnóstico, o apoio educacional na rede de ensino, bem como o apoio terapêutico especializado na rede de saúde. “Dessa forma, a presença e a execução da lei asseguram a possibilidade de vida digna e próspera aos indivíduos com esses transtornos”, comemora a neuropsicóloga e professora da FMABC.

 

O jovem portador de TDAH que hoje é mestre em empreendedorismo

Formado em Relações Internacionais e mestre em empreendedorismo, Giovanni Furlani, 29 anos, financeiro global de uma empresa de distribuição de música, teve o diagnóstico de TDAH e dislexia nos anos iniciais do ensino fundamental. Foi a mãe quem percebeu que ele até entendia os conceitos aprendidos em sala de aula, mas tinha dificuldade de descrevê-los. Ela sentia que ali havia alguma dificuldade a mais. “Eu dava muitas voltas para escrever um conceito muito simples. Eu meio que viajava no conteúdo e o que escrevia não tinha nada a ver com o que de fato havia assimilado”, lembra. Com essas percepções, a mãe levou o filho para acompanhamento, primeiro com neuropediatra e neuropsicóloga. Depois se estendeu para fonoaudiologia e psicopedagogia. O trabalho multidisciplinar com os profissionais durou cerca de 15 anos. “Com o tempo, o amadurecimento, a prática das terapias comportamentais, de esportes e o uso de medicamentos, fui notando os mecanismos que me levavam à agitação e falta de atenção e fui aprendendo a administrá-las”, lembra. Atualmente, o jovem professor não faz mais uso de medicamentos e nem de terapias, mas afirma que toda a sua evolução profissional e pessoal só foi possível através de todas essas técnicas.  

 

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