O PT nasceu
com aspirações à santidade. Tão metido a santo que nunca hesitou em atirar a
primeira pedra. Não porque necessariamente houvesse pecado, mas porque havia
pedras.
Não há
impositiva relação de causa e efeito entre crime de responsabilidade e
impeachment. Não poderia haver este sem aquele, mas poderia haver aquele sem
este. No caso atual, é o desastroso conjunto de pecados que determina, ante o
crime de responsabilidade cometido, a condenação num juízo político. A
propósito, aprendi no catecismo que o pecado pode acontecer por pensamentos,
palavras, atos e omissões. Informo a quem considere piegas esta informação, que
a vida, com enxurrada de exemplos, me ensinou o quanto ela é correta. É através
desses meios que cometemos todas as nossas faltas. E para o ser humano, não as
reconhecer, em qualquer das quatro formas, é o mais danoso de todos os erros.
Enquanto assisto a primeira sessão
do juízo final de Dilma Rousseff, percebo, em sua defesa, a continuidade dos
mesmos pecados. A mensagem que recentemente (16/08) leu à Nação e ao Senado
registra pela primeira vez a palavra "erro", ainda que numa frase com
sujeito oculto. Erro de autoria não identificada. Tornou-se evidente, ali, a
contradição entre a Dilma do dia 15 de agosto, mergulhada "num pote até
aqui de mágoas", tomada pela ira e arrogância, e a Dilma que acordou no
dia seguinte humilde, propondo diálogo e união em torno da pauta que lhe
convinha. Qual a Dilma real? Se algum dia existiu, evaporou-se entre Lula e
João Santana. Personagens tão divergentes quanto os que ela encarna só podem
ocorrer numa encenação. Um deles é falso. Ou todos o são. Na política isso é
pecado mortal.
A situação se agrava quando
assistimos o comportamento da defesa da presidente afastada no Senado Federal.
Primeiro, rasga e joga no lixo a carta do dia 16 de agosto (no que vai bem
porque o inaproveitável programa ali proposto prorroga por dois anos o
sanatório institucional em que temos vivido). Em seguida, reitera o velho e
conhecido sintoma da psicopatologia petista. Entenda-se: o PT é um partido que
nasceu em sacristias e conventos, com aspirações de santidade. Tão metido a
santo que nunca hesitou em atirar a primeira pedra. Não porque necessariamente
houvesse pecado, mas porque havia pedras.
Quis ser, e por bom tempo muitos o
viram assim, um guia de peregrinos, objeto de veneração. Ainda sem pieguices,
torna-se oportuno outro ensino de catequese: ou nossa vida se modela segundo
aquilo em que cremos ou nossa crença se conforma ao modo como vivemos. Então, o
petismo não reconhece os males que causou ao país. Só tem dedos para o peito
alheio. Não tem unzinho sequer para as próprias culpas. Com três tesoureiros
presos, o partido se considera um santo incompreendido e, para evitar martírio,
extingue a função. Na história universal é o primeiro partido político com
muita grana e sem tesoureiro.
Voltemos, porém, à primeira sessão
do juízo final de Dilma Rousseff. Lá estão seus senadores usando todas as
manhas possíveis para retardar o andamento dos trabalhos. Depois de seu governo
haver feito tudo que fez, depois de ter caído na mais profunda desgraça, seus
senadores estão servindo à nação mais e mais do mesmo. Não ruborizam pelos
malefícios causados ou pela quadrilha instalada no coração do governo.
Declaram-se ofendidos, isto sim, porque alguém os acusa de retardar o andamento
das sessões e de todo o julgamento. E a nação a tudo vê. Temos aqui um dos
muitos motivos da desgraça moral em que afundou o partido que governou o Brasil
durante 13 anos consecutivos. É o pecado mortal de se achar sem pecados, de
negar o que fez e faz, mesmo quando todos assistem aquilo que é feito. Eis a
definitiva essência do conjunto da obra.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de
Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo;
Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do
grupo Pensar+.
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