Com
uma provável segunda onda de Covid-19 e a possibilidade de manutenção do ensino
híbrido para todo o ano letivo de 2021, a comunidade escolar continuará com
grandes desafios pela frente. O primeiro será no aprimoramento do ensino a
distância, seja na adoção de ferramentas ou na preparação do professor para
utilizá-las. O segundo, e principal, será lidar com as lacunas de aprendizado
dos alunos que tiveram dificuldades ao estudar em casa ou que sofreram com a
falta de acessibilidade à educação remota.
Uma
pesquisa realizada pelo Leverhulme Centre for Demographic Science, da
Universidade de Oxford, identificou, após o retorno às aulas presenciais na
Europa, que as crianças do ensino fundamental aprenderam “muito pouco ou nada”
com aulas 100% a distância. Estudos também mostram que as lacunas de
aprendizado dessa geração podem impactar negativamente na aprendizagem de
disciplinas dos anos seguintes, e, até mesmo, o futuro profissional desses
jovens no mercado de trabalho.
É
de se esperar que a aprendizagem dos alunos brasileiros também tenha sido
afetada pela pandemia, gerando perdas que precisam ser mapeadas e endereçadas.
Durante o fechamento das escolas no Brasil, alguns alunos continuaram a ter
atividades em várias modalidades, como plataformas de aprendizagem on-line,
aulas via televisão e, até mesmo, pelo rádio. Outros, por sua vez, pararam
totalmente de aprender. Portanto, quando as escolas reabrirem efetivamente para
aulas presenciais, os alunos retornarão com níveis muito diferentes de
conhecimento e habilidades, com os alunos desfavorecidos mais propensos a
apresentar perdas significativas a nível de aprendizagem.
Por
conta dessas constatações, a Unesco e, posteriormente, o Conselho Nacional de
Educação (CNE) recomendam no retorno às aulas ainda em 2020 ou no início de
2021, a realização de uma avaliação para diagnosticar as lacunas de aprendizado
dos estudantes, a fim de definir planos de ação voltados a reduzir os danos e assegurar
que as aprendizagens essenciais sejam adquiridas ao longo do ano letivo. Nessa
hercúlea tarefa de praticamente ensinar dois anos em apenas um, gestores
escolares e docentes terão de definir uma trilha de replanejamento pedagógico,
que pode ser estabelecida em cinco passos fundamentais. Confira:
1º
Passo: Diagnósticos de aprendizagem
A
pandemia trouxe impactos para a aprendizagem dos alunos mundialmente, e
diagnosticar os pontos de melhoria em cada segmento é fundamental para que a
escola possa planejar, efetivamente, os próximos passos. A BNCC (Base Nacional
Comum Curricular) pode e deve ajudar neste processo, pois existe uma progressão
das habilidades entre o ensino fundamental dos anos iniciais e finais.
Para
alunos de Educação Infantil, a escola pode optar pela realização de atividades
e brincadeiras com intencionalidade pedagógica e fazer uma relação com os
direitos de aprendizagem e desenvolvimento, além dos campos de experiência,
como, por exemplo, “Corpo, gestos e movimentos”, “Traços, sons, cores e
formas”, “Escuta, fala, pensamento e imaginação”. Através dessas observações, a
instituição pode traçar estratégias que estimulem o pleno desenvolvimento
dessas habilidades nos pequenos.
Para
alunos dos anos iniciais do ensino fundamental, é recomendada a avaliações
diagnósticas com questões abertas de Língua Portuguesa/leitura e Matemática.
Para facilitar esse processo, e ao mesmo tempo padronizar critérios do início
ao fim, de forma justa, pode se utilizar-se de rubrica. Por meio dela, constrói-se
critérios não apenas de correção, mas também de orientação para alunos e
famílias.
Para
alunos dos anos finais e ensino médio, é indicada a adição de outros
componentes curriculares relacionados, também, a História, Geografia e
Ciências, com Física, Química e Biologia a partir do 9º ano. Para maior
agilidade, as avaliações diagnósticas podem utilizar questões objetivas das
habilidades e conteúdos essenciais da série anterior. Sobre a seleção dos
assuntos da série anterior, envolver os professores na construção dos
componentes curriculares é fundamental.
2º Passo:
Depois da aplicação
Depois
da aplicação da avaliação, é a vez de analisar os resultados por meio da
elaboração de um relatório de diagnóstico das habilidades por disciplina, com
recortes de desempenhos gerais por turma, e individualmente para cada aluno.
Esse relatório deve identificar o rendimento escolar das turmas e de cada
estudante, projetando médias gerais que vão ajudar a traçar um planejamento
para a recuperação dos alunos que estiverem abaixo da nota estabelecida.
3º
Passo: Planejamento
É
hora de desenvolver dois planos: o de Ação e o de Estudos. O primeiro define
quais medidas devem ser tomadas para casa aluno e turma. Realizar encontros com
pequenos grupos, por exemplo, é uma boa maneira de construir relacionamentos e
oferecer uma oportunidade para correção imediata de algumas das habilidades que
foram apontadas na avaliação.
O
segundo, e mais importante, é elaborado a partir do diagnóstico individualizado
fornecido pelos relatórios, em que cada aluno recebe um plano personalizado
para reforçar a atenção nos pontos em que enfrenta mais dificuldade. Aqui,
devem ser listadas referências relacionadas aos assuntos com maiores lacunas de
aprendizagem e sugestões de atividades e/ou exercícios semelhantes às
dificuldades apresentadas.
4º
Passo: Execução híbrida
O
acesso à tecnologia nessa etapa, quando disponível, pode agilizar o processo de
aprendizagem do conteúdo em atraso por meio de aulas virtuais sobre assuntos específicos,
livros digitais, tarefas extras e avaliações formativas, sendo esta aplicada
como parte da prática de ensino diário na forma de verificações de compreensão,
questionários, atividades em grupo em sala de aula e atividades para
casa. Ela fornece feedback contínuo para professores e alunos para monitorar o
progresso dos alunos em relação aos objetivos de aprendizagem. Outra indicação
é a realização aulas de reforço em horários alternativos, como no contraturno,
para explicações adicionais e esclarecimento de dúvidas, além de atividades
extras, em atendimentos individuais ou em turmas definidas com base nas lacunas
em comum identificadas por meio do relatório.
5º
Passo: Acompanhamento da aprendizagem
Depois
de executado o plano, é momento de reavaliar o aluno para entender se todo o
conteúdo reforçado foi absorvido. Nesse momento, é possível que os alunos
apresentem melhoras em determinados assuntos e dificuldade em outros,
especialmente, com a aplicação de avaliação de novos capítulos e conteúdos.
Portanto, diante da impossibilidade de repassar todo o conteúdo do ano
anterior, deve ser priorizado aquilo que é imprescindível para a aprendizagem
das matérias nos anos seguintes. Além disso, é necessário registrar esse
desempenho por meio de relatórios de evolução de cada aluno durante o ano
corrente e nos próximos, uma vez que 2022 ainda sentirá os impactos da pandemia
de covid-19.
Por
último, mas não menos importante, vale ressaltar que, embora os métodos
avaliativos para diagnosticar as lacunas de aprendizagem sejam fundamentais
para o planejamento do próximo ano letivo, existe um outro fator que as escolas
precisam se preocupar na volta às aulas: o trato das habilidades
socioemocionais, voltadas ao acolhimento, não só dos alunos, mas das famílias, corpo
docente e demais agentes escolares.
Ademar
Celedônio - diretor de Ensino e Inovações Educacionais do SAS Plataforma de
Educação.