Um grande
desafio da atuação no ramo do Direito de Saúde é enfrentar o receio dos juízes
em negar o pedido liminar formulado contra as operadoras de planos de saúde
quanto a concessão de tratamentos médicos e cirurgias. Isso porque, muitas
vezes, os magistrados adotam uma postura bastante conservadora e evitam assumir
o risco de deixar um possível enfermo desamparado, concedendo, assim, a tutela
de urgência.
Ocorre que, em
razão disto, tais medidas são concedidas sem que haja uma real análise da
moléstia da parte autora. E, portanto, a autorização da realização de cirurgia
em sede de liminar extingue o objeto de uma possível perícia, tornando
impossível a constatação da real necessidade desta.
É o que se
observa quanto às ações movidas contra planos de saúde em que se pleiteia a
cobertura de cirurgias plásticas após a realização de bariátrica, sob a
alegação de que estas seriam cirurgias reparadoras e não estéticas.
Não é raro a
concessão de tutela nestes casos para que as cirurgias sejam realizadas com urgência,
sob pena de multa em valores exorbitantes. Logo, a operadora é obrigada a arcar
com procedimentos de remoção de pele, implantação de próteses de silicone,
entre outros, sob o argumento de que há "perigo de dano" em aguardar
até o fim da fase de conhecimento.
Desta maneira,
os procedimentos cirúrgicos são realizados antes mesmo de ser verificado o
caráter reparador destes. Tal fato abre portas para a possibilidade de fraudes,
de modo que inúmeras mulheres tenham suas cirurgias plásticas custeadas pelo
plano de saúde, sem que, de fato, tenham direito. Isso porque, torna-se
impossível a constatação do direito em fase probatória após a realização da
cirurgia.
Notavelmente, chama
atenção o fato de que as demandas são bastante repetitivas, sendo, inclusive,
instruídas com laudos médicos e psicológicos extremamente semelhantes. Ora, é
de muita estranheza que mulheres de idades distintas e com corpos diferentes,
tenham laudo médico praticamente idênticos e concluindo pelas mesmas patologias
e procedimentos cirúrgicos. Mais inquietante ainda, é que aproximadamente
metade dos casos levantados possuíam laudo médico assinado pelos mesmos
profissionais, apesar das ações terem sido ajuizadas em Municípios diferentes.
Tais dados foram
apresentados aos magistrados que concederam tais liminares em sede de
reconsideração de liminar, bem como aos Tribunais de Justiça, em sede de Agravo
de Instrumento com requerimento de efeito ativo. Como se era de esperar, tem
sido reconhecido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a necessidade
da realização de perícia médica, com o fulcro de avaliar o caráter reparador ou
estético das cirurgias. Assim, têm sido recebidos com efeito ativo tais recursos.
Outrossim,
diante da repetição de casos com laudo médico assinado pelo mesmo profissional,
foi proferida decisão pela 7ª Câmara de Direito Privado do TJSP não apenas
reconhecendo a necessidade de suspensão da cirurgia determinada em primeiro
grau, mas também pela intimação do médico e do psicólogo atuantes no caso para
que apresentem o prontuário médico, bem como aprestem informações capazes de
confirmar a autenticidade dos laudos. Além disso, foi determinado que estes
profissionais também esclareçam a repetição dos documentos e a relação entre
pacientes.
Tal decisão é,
definitivamente, uma conquista contra as frequentes tentativas de fraude contra
as operadoras de planos de saúde. Ocorre que tal conduta desonesta além de
onerar as operadoras de planos de saúde, também dificulta o acesso a este
direito para aqueles que de fato têm direito a realização de cirurgia, eis que
precisaram submeter-se aos mesmos trâmites processuais que podem levar mais de
um ano.
Sendo assim, a postura do Tribunal paulista é essencial para combater tal situação. Além de que, espera-se que, gradativamente, os julgadores de primeira instância entendam pela ausência de periculum in mora, bem como pela necessidade de melhor apuração do caráter da cirurgia pleiteada previamente à concessão da medida pleiteada.
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