Além
de mudanças que passam a valer a partir de 9 de outubro na tabela de informação
e nas alegações nutricionais, a novidade será a adoção da Rotulagem Nutricional
Frontal
Exemplo 1 da nova rotulagem de alimentos em produto fictício
(crédito: Observatório de Rotulagem de Alimentos / Unifesp)
As normas de rotulagem de alimentos estão em
constante aprimoramento, especialmente quando se compreende sua importância
como instrumento de educação alimentar e nutricional, e que sua contribuição é
fundamental para escolhas alimentares mais saudáveis e na prevenção de doenças
crônicas não transmissíveis. Para isso, um importante reforço estará à
disposição da sociedade brasileira a partir do dia 9 de outubro de 2022, quando
passará a vigorar uma nova resolução para rotulagem de alimentos no país.
Segundo a engenheira de alimentos Veridiana Vera de
Rosso, professora livre-docente do Centro de Pesquisas e Práticas em Nutrição e
Alimentação Coletiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Campus Baixada
Santista, a rotulagem de alimentos tem o objetivo de ser um canal de
comunicação entre o(a) fabricante e o(a) consumidor(a). “Mas, na maioria das
vezes, o consumidor, que é o principal interessado, não conhece a importância
da leitura do rótulo e/ou não sabe quais informações deve levar em conta na sua
avaliação. Em geral, observa somente data de validade e o valor calórico do
produto, declarado como energético da porção, muitas vezes desconsiderando que
consome mais de uma porção daquele alimento”, pondera a pesquisadora, que
também coordena o Observatório de Rotulagem de Alimentos da Unifesp.
A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC 429/2020)
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para rotulagem de
alimentos embalados traz uma novidade importante, que é a regulamentação da
Rotulagem Nutricional Frontal, ou seja, uma informação complementar à
declaração nutricional existente, buscando de uma forma resumida e objetiva
alertar sobre a presença de elevados teores de constituintes ou nutrientes de
atenção que devem ser consumidos com moderação.
“Esses alertas serão apresentados na face frontal
dos rótulos, na parte superior, e será constituído de um ícone de lupa
acompanhado de advertências textuais informando sobre o alto teor de açúcares
adicionados, alto teor de gordura saturada e alto teor de sódio”, detalha
Veridiana.
Segundo a pesquisadora da Unifesp, os alimentos
poderão usar 1, 2 ou 3 selos de advertência, caso alcancem os limites
estabelecidos pela legislação, levando em conta uma base de 100g de alimento e
se esse alimento é sólido ou líquido. Essa novidade nos rótulos de alimentos
não é exclusividade do Brasil. O tema do uso de alertas para a presença de
constituintes ou nutrientes e a elevada concentração nos alimentos teve um
crescimento exponencial nos últimos dez anos e foi acompanhado de um boom
no surgimento de novos modelos de advertência. “É importante destacar que a
intervenção regulatória utilizando a estratégia da Rotulagem Nutricional
Frontal é uma diretriz defendida pela Organização Mundial da Saúde, que
publicou em 2019 um documento orientador para que os países associados possam
implementar, monitorar e avaliar a eficácia das estratégias de rotulagem
nutricional frontal”, complementa Veridiana.
Exemplo 2 da nova rotulagem de alimentos em produto fictício
(crédito: Observatório de Rotulagem de Alimentos / Unifesp)
O Observatório de Rotulagem de Alimentos da Unifesp
tem o objetivo de monitorar todas as questões relacionadas à rotulagem de
alimentos no Brasil e fornecer subsídios para a discussão científica e
política, emitir recomendações e apontar lacunas no processo regulatório. “O
monitoramento dos rótulos de alimentos é parte do que chamamos de Avaliação do
Impacto Regulatório e pode ser ampliado para outros níveis, inclusive
acompanhando os processos de reformulação de diferentes grupos alimentares por
parte da indústria”, esclarece sua coordenadora.
PEQUENO HISTÓRICO ROTULAGEM - Os
primeiros rótulos de alimentos surgiram nos séculos XVIII e XIX e tinham como
única função identificar produto e marca. Somente em 1990 foi publicada nos
Estados Unidos a lei que tornou obrigatória a rotulagem nutricional padronizada
e detalhada e, em 1994, o Nutrition Facts fez sua estreia. No Brasil, o
primeiro regulamento só foi lançado em 1998 e em 2003 tornou-se obrigatória a
rotulagem nutricional para todos os alimentos embalados, comercializados no
Brasil, sendo produzidos aqui ou importados.
Alguns fatores podem ser elencados como decisivos
para uma alta eficácia do modelo de Rotulagem Nutricional Frontal (RNF)
adotado, entre eles destaque para a familiaridade com os elementos utilizados
nos modelos. Em uma recente revisão da literatura conduzida pela Comissão
Europeia que trata do assunto e publicada em 2020, foi possível demonstrar que
o(a) consumidor(a) presta atenção nos rótulos cujos elementos gráficos são
familiares. “Essa familiaridade pode ser desenvolvida ao longo do tempo. Outros
estudos demonstram que símbolos universais, como ícones usados na sinalização
de trânsito, como sinais de pare e cores do semáforo, são bem compreendidas e
assimiladas pelo consumidor. No Brasil, o modelo de lupa é inédito, ainda não
foi utilizado em outro país do mundo. Recentemente o Canadá regulamentou um
modelo bastante similar ao brasileiro, fazendo o uso do ícone de lupa.
Portanto, esse modelo ainda precisa ser testado quanto à eficácia em transmitir
a mensagem desejada e que possa ser efetivamente compreendida e assimilada pelo
consumidor”, alerta Veridiana.
Ela diz ainda que é importante avaliar a frequência
de uso dos selos de advertência nos rótulos de alimentos embalados comercializados
no Brasil. Em um estudo realizado pelo Observatório de Rotulagem de Alimentos
da Unifesp, que conta com a colaboração de 12 instituições de pesquisa em todo
o Brasil e cujos resultados serão divulgados na última semana de setembro de
2022, foram avaliados 5.000 alimentos, distribuídos nos oito grupos alimentares
estabelecidos pela ANVISA na Inscrição Normativa (IN) 75/2020, que regulamenta
a RDC 429/2020, e mais um grupo específico que foi criado pelo Observatório
para agrupar alimentos plant-based (à base de plantas, que objetiva
substituir alimentos à base de proteínas animais como leite, carne e ovos) e
sem glúten. A coleta dos rótulos ocorreu entre os meses de janeiro e julho de
2022 nos pontos de venda comerciais de diversas cidades (capitais e interior).
Veridiana revela que a partir das informações
obtidas nos rótulos e inseridas no Banco Brasileiro de Rótulos de Alimentos foi
possível estabelecer uma estimativa do uso dos selos de advertência, antes da
entrada em vigor da RDC 429. “Por exemplo: para o selo de ‘alto em sódio’,
observamos que o grupo molhos, temperos prontos, caldos, sopas, pratos
semiprontos ou prontos para o consumo alcançou um total de 78% dos produtos com
obrigatoriedade de uso caso não passem por reformulação. Já para o grupo de
carnes e ovos, a estimativa de frequência de uso do selo foi 52,8%. No caso do
selo ‘alto em gordura saturada’, os grupos com estimativa de maior frequência
de uso foram óleos/gorduras e sementes oleaginosas, alcançando 55% dos
produtos, e no grupo carnes e ovos 38% caso não passem por reformulação”,
indica a engenheira de alimentos.
Veridiana fala que a estimativa de uso do selo de
alto em açúcares adicionados é mais difícil de ser realizada, uma vez que no
atual momento, a legislação em vigor não exige a declaração de açúcares e/ou
açúcares adicionados na tabela de informação nutricional presente nos rótulos.
No entanto, a pesquisadora diz que, empregando como estratégia a declaração de
açúcares (sacarose, açúcar de cana, açúcar de beterraba, açúcares de outras
fontes, mel, melaço, melado, rapadura, caldo de cana, extrato de malte,
glicose, frutose, lactose, dextrose, açúcar invertido, xaropes, maltodextrinas)
como 1º, 2º e 3º ingrediente da lista de ingredientes declarados nos rótulos,
observou-se que até 90% dos produtos do grupo açúcares e produtos de energia
proveniente de carboidratos e gorduras poderão fazer uso desse selo.
Produtos como achocolatados em pó, chocolates,
bombons e similares, sorvetes em massa, bebidas não alcoólicas carbonatadas,
bolos e biscoitos doces com recheio e similares, caso não sejam reformulados,
ressalta Veridiana, farão uso frequente do selo ‘alto em açúcares adicionados’.
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