Tão importante quanto contratar bem é criar condições para que as pessoas sejam bem sucedidas em uma nova função. Uma das piores experiências que um gestor pode ter, sem dúvidas, é a de desligar alguém. Independentemente do contexto, nunca é um processo fácil. Não apenas pelo custo emocional, mas sempre fica uma dúvida interna: será que foi um erro de seleção, ou estava deixando de fazer algo que deveria enquanto líder?
A verdade é que a justificativa do “erro de seleção” é muito confortável, e pode justificar outras falhas. Existem algumas falhas lógicas na visão de que basta a empresa “contratar gente boa” (ou qualquer outra descrição do gênero) que o desempenho será bom, e consequentemente, o negócio terá bons resultados. Essa premissa pressupõe que o sucesso da organização estará na sua capacidade de atrair bons talentos para garantir bons resultados.
Mas, é possível apurar com qualidade o desempenho futuro no processo de seleção? Diversos estudos já comprovam que nossa capacidade de predizer desempenho futuro em processos seletivos é baixíssima. Se já não fosse desafiador encontrar as “pessoas certas”, um desafio adicional se mostra presente: definir, entre aquelas pessoas que estão participando de um processo, quais terão desempenho superior na posição. Apenas quer dizer que colocar um peso tão grande no processo seletivo para promover o desempenho da organização não me parece a forma mais inteligente de gerir riscos, e nem a mais justa com os recém entrantes.
Como promover desempenho superior, sem deixar de ser justo? Calibrando e desenvolvendo a “contribuição individual”, contando menos com ela no começo: dar suporte para acelerar a adaptação da pessoa e buscar aumentar sua competência individual - sessões de mentoria, apadrinhamento por colegas mais antigos e reuniões com áreas que interagem com a pessoa são ótimas formas de fazer isso. Se a contribuição individual tende a ter uma distribuição normal em relação ao desempenho, imagino que os processos tenham uma distribuição uniforme: o desempenho de todas as pessoas é afetado de forma mais ou menos uniforme. E se a contribuição individual de alguém tende a começar baixa, talvez uma forma de elevá-la é por meio de bons processos: ferramentas, roteiros, protocolos de tomada de decisão, rituais, etc.
Para fazer isso, um gestor tem inúmeros
mecanismos à sua disposição:
- Criar roteiros e “sombras” para funções que lidam com
clientes: com certeza um roteiro padrão não é a melhor forma de interagir
com um cliente, mas é uma boa forma de aprender, de forma explícita, a
linguagem e abordagem da empresa. E participar das primeiras reuniões com
clientes de um novo colaborador pode ajudá-lo a aprender isso de forma
tácita. Por mais bem treinada e experiente que uma pessoa possa ser, cada
empresa tem uma linguagem e uma abordagem, e isso não se aprende de uma
hora para a outra.
- Consolidar as melhores práticas do time em processos e
ferramentas: quais são as pessoas que melhor desempenham no time? Que
ferramentas usam e que processos seguem? É possível institucionalizar a
abordagem delas? Muitas vezes as pessoas de melhor desempenho do time não
são apenas grandes contribuintes individuais, mas pessoas que encontraram
formas mais inteligentes de trabalhar. Essas formas podem, e devem, ser
ensinadas para os novos entrantes.
- Criar protocolos de tomada de decisão: como você decide? Você
consegue descrever as “regras mentais” que usam para uma pessoa utilizar
como referência? É fácil considerar que o seu jeito de decidir é “óbvio”,
justamente porque está dentro da sua cabeça. Mas não é. Como você pode
comunicar isso para o resto do time?
- Estabelecer rituais para promover certos comportamentos: o
time requer disciplina diária? Você pode estabelecer uma reunião diária de
15 minutos para atualização. Requer tomada de decisão orientada a dados?
Você pode fazer uma reunião semanal de revisão dos indicadores. Se os
novos colaboradores já entram num time com rituais estabelecidos, a
tendência é que absorvam os comportamentos esperados com muito mais facilidade.
Não estou defendendo aqui a mecanização
do trabalho, mas o uso inteligente das boas práticas: à medida que uma pessoa
tem mais experiência prática, ela pode alterar a forma de trabalhar e trazer
mais de si para o trabalho. Hoje, em toda contratação, me pergunto se estou
dando suporte suficiente para a pessoa “se provar” na função, e se a
contribuição individual cresce com o tempo. Essas questões ajudam a refletir
sobre adequação de uma pessoa à função, sem desconsiderar a minha
responsabilidade no seu sucesso. Te convido a refletir, quando encontrar um
caso de baixo desempenho no time, se esse é um problema de contratação, ou se é
um problema de liderança. Nem sempre a resposta será confortável. Mas
independente de qual for, a pergunta te fará crescer como líder.
Pedro
Nascimento - COO do Grupo Anga, uma holding de serviços de implementação de
cultura humanizada, capitalismo consciente e inclusão social.
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