Nem
todas as doenças raras possuem remédios específicos para controlá-las, e quando
existem, frequentemente não estão disponíveis na rede pública de saúde
Hoje, dia 8 de
setembro, é lembrado como o Dia Nacional de Luta por Medicamentos, que retrata
o esforço de pacientes, associações e ONGs para garantir que os cidadãos tenham
acesso a medicamentos, principalmente pacientes com doenças raras. Muitas
dessas pessoas dependem de remédios para ter qualidade de vida, porém, na
maioria dos casos eles são de alto custo, e sua obtenção só é viabilizada por
meio do SUS.
Ocorre que, em muitos
casos, a indisponibilidade de oferta destes medicamentos pelo SUS força os
dependentes de medicamentos, tratamentos, exames e cirurgias a apelarem às
ações judiciais, com base no direito fundamental de todo brasileiro à saúde,
estabelecido pela Constituição. Essas ações têm gerado grandes debates, pois
nos últimos anos o número dos processos e gastos dos governos aumentaram tanto
a nível federal quanto em estados e municípios.
Doenças que se
constituem em um grave risco de vida muitas vezes necessitam de medicamentos
órfãos, para os quais a indústria farmacêutica enfrenta a dificuldade de sua
viabilização comercial, por serem destinados a um grupo muito reduzido de
pacientes. Além disso, esses remédios são altamente inovadores, sendo produtos
de biotecnologia e outras tecnologias mais avançadas, como engenharia genética
e de tecidos, o que muitas vezes também traz a dificuldade adicional de demonstração
da eficácia clínica, em escala, deste tipo de terapia.
Um exemplo de doença
na qual os pacientes lutam pelo acesso ao medicamento é a fenilcetonúria,
também conhecida como PKU, caracterizada por ausência ou falha da enzima
responsável pelo processamento do aminoácido fenilalanina. Com isso, ocorre o
acúmulo dessa substância, que é tóxica ao sistema nervoso e pode causar lesões
permanentes, tais como deficiência intelectual, sintomas comportamentais ou
convulsões. Pacientes com fenilcetonúria necessitam de significativa restrição
dietética, devendo evitar o consumo de leite e derivados, carnes, peixes, ovos,
aves e grãos com elevado teor proteico, dieta que nem sempre é fácil de se
seguir, tanto pela aderência, como pelo valor de compra dos alimentos.
Recentemente, a
CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) analisou o
pedido de expansão de utilização do dicloridrato de sapropterina para pacientes
com fenilcetonúria acima de 5 anos. Esta medicação ajuda no controle da doença
em aproximadamente 30% dos casos, e evita comprometimento das funções
executivas que vem sendo observado mesmo nos pacientes tratados com a única
terapia existente no Brasil, que é a restrição dietética. Tem sido observado
que o uso da medicação pode também regredir o déficit de atenção, muito comum
na população fenilcetonúrica, como estabilizar as alterações de humor e reduzir
os quadros de depressão altamente incidente nesses pacientes, além de facilitar
a restrição dietética, tendo grande impacto na qualidade de vida.
Este tratamento já foi
disponibilizado em 2018 no SUS, porém, exclusivamente para mulheres grávidas ou
em período periconcepcional. Essa submissão da sapropterina para o tratamento
da PKU na CONITEC teve parecer negativo para a incorporação no Sistema Único de
Saúde, sendo esse resultado contraditório, pois quando se descobre uma doença,
o tratamento é o primeiro passo a se pensar, sendo incoerente disponibilizar um
diagnóstico sem um recurso terapêutico eficiente.
A diretora da Associação
Mães Metabólicas, Simone Arede, explica que o tratamento para fenilcetonúria,
embora recentemente submetido à CONITEC para revisão, não foi atualizado no
âmbito do SUS, rechaçando terapias mais modernas e eficazes para o controle da
doença. Ainda, Simone afirma que a justificativa para não ter sido aprovada a
incorporação do medicamento para os pacientes foi a falta de estudos e o seu
custo elevado. Porém, em se tratando de enfermidade rara, de forma geral, os
estudos da literatura compreendem população pequena de pacientes, sendo
impossível de se ter uma grande quantidade de evidências científicas como em
outras doenças crônicas, tais como câncer ou diabetes que acometem grande parte
da população.
Para Maitê Moreira,
mãe da pequena Catarina, de 4 anos e portadora da fenilcetonúria, a utilização
da medicação sapropterina, adquirida por meio de processo judicial, foi um
divisor de águas e mudou totalmente a qualidade de vida da sua filha. Antes da
medicação, toda alimentação era sempre minuciosamente calculada, principalmente
para ela não se sentir diferente ou excluída socialmente. Maitê recebia o
cardápio da escola e tentava fazer o uso de alimentos parecidos com os dos
amigos, mas, apesar do esforço, muitas vezes não sabia o que seria oferecido,
já que uma característica marcante da dieta desses pacientes é a monotonia.
Quando Maitê conseguiu
a medicação, a qualidade de vida de Catarina mudou totalmente. A tolerância à
proteína de sua filha dobrou em 6 meses do uso da medicação, ela conseguiu
introduzir farinha de trigo, ovos, leite, macarrão e pão e, principalmente,
ainda mantendo o bom controle da fenilcetonúria, o que é importante para se
evitar o dano neurológico ou manifestações psiquiátricas ao longo da vida.
Todavia, Catarina é uma exceção, pois a maioria dos pacientes não consegue o
acesso à esta medicação e nem mesmo à alimentação hipoproteica, a qual consiste
em alimentos médicos específicos sem proteína, que são muito caros e precisam
ser importados, pois não existe fabricação no Brasil.
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