O acesso
de uma criança autista à escola é um direito garantido por lei. Mas para essa
experiência seja realmente inclusiva, é importante que a escola e o educador
estejam bem preparados e informados.
Tecnicamente
o autismo hoje é chamado de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Ao tratar
essa condição de saúde como “espectro”, a ciência evidencia o fato de que não
existe um único tipo de autismo: ao contrário, há tantos níveis diferentes de
comprometimento que sua manifestação em cada pessoa é tratada como única.
Em
geral, entretanto, pessoas que se enquadram no espectro têm três importantes
áreas do desenvolvimento humano afetadas : as habilidades socioemocionais, a
atenção compartilhada e a linguagem.
INFÂNCIA
Durante
a infância, a manifestação mais evidente do autismo está no comportamento da
criança. Ainda bebê, é possível notar alguns sinais, como por exemplo um olhar
mais distante do que o habitual, uma certa apatia. Outro indicador é a criança
se mostrar incomodada por algum som específico ou pelo toque de outra pessoa. O
maior sinal, entretanto, é uma grande falta de interesse por situações sociais,
em geral, uma vez que a socialização é a parte mais afetada
ROTINA
Para
se sentir confiante a participar do ambiente escolar, a criança autista precisa
que a escola estabeleça para ela sequências de ações, rotinas. É importante que
o autista perceba cada parte da rotina. Grande parte dos autistas tem
dificuldade de comunicação e, quando este é o caso, a escola pode trabalhar com
os livros adaptados que, com figuras de rotinas e ações, ajudam o autista a se
comunicar. Claro que há outros recursos e estratégias. Cada criança tem suas
próprias características e necessidades. Um caso pode ser diferente do outro
porque também há graus diferentes de autismo (leve, médio e moderado). O grau
leve é mais difícil de detectar na infância e tem uma forma de lidar totalmente
diferente dos níveis de comprometimento médio ou moderado. Existem escolas
especiais para esta condição, mas o convívio em classes regulares deve ocorrer
logo de início, mesmo que com menor tempo de permanência na escola.
AMIZADES
O
autista tem dificuldade em ter amizades, mas elas são importantes para ele. O
problema, na verdade, é que ele não consegue compreender alguns aspectos que
fazem parte dos laços de amizade. É comum que o autista mantenha pouquíssimos
amigos em ambiente escolar ou de trabalho. Para que o autista tenha relações de
amizade é preciso que sinta empatia, afinidade com a pessoa, que os laços de
amizade sejam muito fortes. Mesmo assim, quando uma outra pessoa, com menor
afinidade, entra em seu grupo de convívio, ele tende a se fechar, pois não
consegue encontrar facilmente situações comunicativas com a pessoa
"nova". Ele precisa conhecer e se acostumar com suas amizades. Embora
a socialização seja difícil, o autista sente, dentro de si, a necessidade de
convívio, especialmente no grau leve. Nos graus médio e moderado é importante a
presença de amigos, mas o tipo de necessidade é um pouco diferente, pois as
perspectivas sociais também são distintas. De qualquer forma, é de grande
importância que o autista tenha amizades, porque ele precisa de convívio
social. Apesar de ser difícil para ele, o autista precisa aprender como
funcionam relações entre as pessoas e, sem as amizades, isso fica quase
impossível.
LIDANDO
COM O PRECONCEITO
Grande
parte das pessoas acaba tendo realmente preconceitos em relação ao autista por
não saber lidar com aqueles comportamentos considerados estranhos. É importante
ensinar o autista a lidar com situações diversas em relação às pessoas que o
cercam, especialmente estas, com maiores preconceitos. Para ensinar, é preciso
fazê-lo, primeiramente, entender o ponto de vista das pessoas. Muitas vezes, o
autista vê o comportamento mas não entende o motivo de ele acontecer.
Dependendo da situação, o autista nem percebe o preconceito. Uma grande
dificuldade para quem está no espectro é a leitura de emoções e sentimentos.
Para compreender e lidar com as situações, ele precisa aprender a ler sinais de
emoção ou de sentimentos das pessoas que os cercam. Além de entender estas
emoções, necessita saber o que deve fazer quando as percebe. Se sofre um
preconceito, precisa aprender a identificar e receber instruções sobre como
lidar com cada situação. Quando alguém usa tons mais altos de voz e está com
determinadas feições mudadas, por exemplo, o autista pode estar diante de uma
situação de agressividade com ele. Ele precisa ser orientado a permanecer
calmo, explicar que tem dificuldade para fazer tal coisa e apenas precisa que a
pessoa lhe explique melhor ou perguntar por qual motivo a pessoa está agindo
daquela maneira para que ele possa entender e ajudar. Para que a criança no
espectro compreenda partes de indícios sociais, especialmente os não
verbais, pode ser interessante o uso de fotos para explicar feições, pois o
visual é importante para o autista.
TALENTOS
Existem
casos em que pessoas autistas ficaram conhecidas por sua inteligência acima da
média, comportamento autodidata, desenvolvimento de talentos especiais para
música ou grande facilidade com números. Nesse caso, a família e a escola podem
estimular o aprimoramento da pessoa no espectro.
Este
é o caso do autismo leve ou do tipo Asperger, comentado anteriormente. O
autista consegue ter pouca, mas alguma sociabilidade. Este tipo de autismo
costuma ter focos durante a vida, fixações. Geralmente o Asperger tem um
interesse grande por um determinado tema e se aprofunda demais nele, o que as
outras pessoas identificam como comportamento autodidata. Por se interessar e
buscar informações para este tema, acaba criando formas pessoais e extremamente
estruturadas de estudo que são muito interessantes de serem analisadas. Com
isso, acabam tendo maior facilidade de estudo, mas não quer dizer que serão
bons em tudo. Acontece de serem muito bons nas áreas de seu interesse, embora
consigam lidar bem com as demais.
A
família pode incentivar estimulando a criança com várias fontes diferentes onde
poderá encontrar informações sobre seu tema de interesse e também mostrar à criança
novos temas que podem ser relacionados. Desta forma, consegue ampliar seu campo
de interesse. A escola pode utilizar as estratégias de estudo criadas pela
criança para estudar também matérias que não estão no foco dessa criança. Deve
estimular seu convívio social, para que a criança possa ampliar conhecimentos.
Embora tenha dificuldade em se relacionar, as amizades também são importantes
para seu estímulo, porque podem aprender a partir do convívio, trazendo novas
informações para seu "mundo". Caso seja possível, é interessante
matricular a criança em cursos relacionados à suas área de interesse maior,
para que ela possa se desenvolver também com profissionais que tenham maior
conhecimento sobre o assunto.
Uma
equipe multidisciplinar, composta por vários profissionais que tenham
conhecimento das características do autismo, pode ajudar a família a lidar com
todas as particularidades do autista, inclusive os talentos natos.
FAMÍLIA,
CUIDADORES E QUALIDADE DE VIDA
Pais
e cuidadores devem compreender e aceitar que o indivíduo autista consegue
aprender e tem a possibilidade de se desenvolver, mas precisará de estímulos
diferentes das outras pessoas. As mais preciosas dicas são: leia muito sobre o
assunto e observe como o indivíduo se comporta. Observar como a pessoa no
espectro trabalha com rotinas pessoais é o que dá acesso à compreensão de seus
comportamentos. É importante salientar que, embora o autista não tenha um
comportamento social comum, ele tem dificuldade em lidar com situações nas
quais as pessoas fazem coisas que ele considera erradas. Conversar com o
autista, mesmo que ele não dialogue totalmente da forma como esperada, ajuda
muito a compreender os motivos pelos quais ele faz determinadas ações. Ele
sempre mostrará um comportamento que dará dicas de como lidar com as situações.
BEM-ESTAR
GARANTIDO
Existem
alguns indicadores de que educadores, família e cuidadores estão no caminho
certo para garantir o bem-estar da pessoa no espectro. É preciso sempre
incentivar suas habilidades, procurar não expor o indivíduo a situações sociais
nas quais ele não se sinta confortável (com o tempo, o autista aprende sozinho
a lidar com situações de exposição), conversar com ele sobre as situações que
percebemos ter gerado desconforto nele, procurar auxílio de profissionais que
possam ajudar na orientação de como lidar com o transtorno, não forçar
situações sociais que podem parecer comuns para pessoas fora do espectro (como
forçar a criança a cumprimentar estranhos em situações de exposição).
O
convívio familiar é também uma situação social. É um lugar de segurança para o
autista, no qual ele pode aprender sobre os comportamentos da vida social, mas
em menor escala. É preciso estimular as situações de conversa, deixando o
autista seguro em relação ao ambiente. Todos os familiares devem respeitar os
limites da criança autista e procurar compreender que terá respostas diferentes
dos demais membros da família para determinadas situações.
SEMPRE
A ROTINA
Ter
rotina ou fazer ações em etapas ajuda muito o autista tanto em casa quanto na
escola ou no trabalho. Criar rotinas para a criança dentro do ambiente familiar
ajuda-a a se sentir mais confortável, deixando-a mais tranquila e segura e
trazendo maior equilíbrio para o ambiente. A rotina é pessoal do autista, mas deve
ser construída ao longo da vida e para isto é interessante que os familiares
possam contribuir com as primeiras rotinas. No trabalho, não forçar situações
sociais nas quais o autista não queira participar e compreender que ele precisa
sim das relações sociais na interação com colegas, mas se mostrará mais calado
com colegas com os quais não tem tanta intimidade.
* Designer de atividades pedagógicas, Janaína Spolidorio é formada em Letras, com pós-graduação em
consciência fonológica e tecnologias aplicadas à educação e MBA em Marketing
Digital. Ela atua no segmento educacional há mais de 20 anos e atualmente
desenvolve materiais pedagógicos digitais que complementam o ensino dos
professores em sala de aula, proporcionando uma melhor aprendizagem por parte
dos alunos e atua como influenciadora digital na formação dos profissionais
ligados à área de educação.
Janaina
Spolidório