Especialista alerta que aumento de tributos corrige distorções, mas afugenta investimentos e não resolve o rombo fiscal
O governo federal apresentou um novo
pacote de medidas para o setor financeiro, substituindo a proposta anterior de
taxação do IOF sobre transações internacionais, que havia gerado forte reação
negativa no mercado e na sociedade. A nova estratégia, segundo o economista e
analista de mercado João Victor da Silva, é politicamente inteligente, mas
fiscalmente arriscada.
“Foi uma jogada de mestre do ponto
de vista político. Ao recuar de uma proposta impopular, o governo criou espaço
para aprovar um pacote com impacto tributário ainda maior, sem causar o mesmo
barulho”, afirma João Victor. “Mas é preciso olhar além da manobra: a
proposta aumenta impostos e pode sufocar ainda mais o setor produtivo.”
Entre os pontos que o analista
considera positivos está a padronização da alíquota do Imposto de Renda sobre
investimentos como CDBs e títulos públicos. Hoje, quanto mais longo o prazo do
título, menor o imposto. Isso, segundo ele, distorce o mercado e desincentiva
decisões racionais.
“Essa padronização corrige um mau
incentivo. O investidor, muitas vezes, opta por papéis longos não pela
estratégia, mas pela vantagem fiscal. Isso gera uma alocação ineficiente do
capital”, explica.
A proposta também passa a taxar
produtos hoje isentos, como LCI, LCA e debêntures incentivadas. Para João
Victor, essa mudança é coerente com a lógica de isonomia tributária, mas
deveria vir acompanhada de uma revisão mais ampla da carga tributária. “O
problema não é unificar. O problema é que, em vez de baixar os impostos de uns,
o governo sobe o dos outros. Isso mostra claramente que o objetivo é arrecadar,
e não tornar o sistema mais eficiente.”
O economista ressalta que o Brasil já
tem uma das maiores cargas tributárias do mundo emergente. “Aumentar
tributos nesse contexto é ineficaz. O problema do Brasil é de gastos. A despesa
pública cresce em ritmo insustentável, com obrigações indexadas e um serviço da
dívida cada vez maior. Enquanto isso não for enfrentado, qualquer aumento de
receita será só um paliativo.”
Um dos trechos mais controversos do
pacote, segundo João Victor, é o aumento da alíquota da Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSLL) para as fintechs — empresas que têm revolucionado
o setor financeiro com soluções digitais acessíveis e escaláveis.
“As fintechs democratizaram o acesso
a serviços financeiros no Brasil. Com carga menor, elas inovaram, criaram
produtos, aumentaram a concorrência. Tributar mais esse setor é repetir o erro
que o país cometeu com a indústria na década de 70”, alerta.
Ele relembra o impacto do IPI sobre a
indústria nacional e contrasta com o crescimento do agronegócio, que se
beneficiou de uma carga tributária mais leve. “Hoje, o agronegócio é a
locomotiva do PIB porque teve condições tributárias mais favoráveis. O mesmo pode
acontecer com as fintechs, se o ambiente for hostilizado: elas vão estagnar e
os investimentos no setor devem migrar para outros mercados”.
João Victor encerra com um aviso
direto: “O Brasil não é uma ilha. Capital é móvel. Se o governo continuar
penalizando quem gera riqueza e inovação, os investidores vão buscar países que
os tratem melhor. E o país vai perder ainda mais fôlego econômico.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário