O Projeto de Lei (PL) n. 10887/2018 recentemente
aprovado pela Câmara dos Deputados faz uma verdadeira revisão na aplicação da
Lei n. 8429/1992. Esse PL tem uma sólida origem jurídica, pois nasceu em 2018,
das conclusões dos estudos de uma Comissão Especial de juristas, sob a
coordenação do Ministro Mauro Campbell do Superior Tribunal de Justiça (STJ),
instituída pela presidência da Câmara Federal, exercida então pelo deputado
Rodrigo Maia. Segundo os registros constantes do Portal da Câmara, o PL
tramitou por diversas comissões, inclusive com audiência pública, emendas e
pareceres acerca do seu mérito.
É importante salientar que as leis também estão
inseridas no contexto de um processo evolutivo e, como tal, estão sujeitas a
revisões e aperfeiçoamentos necessários a assegurar a sua boa aplicação e
pronta eficácia. Ao longo do tempo, o texto original foi objeto de dezenas de
alterações legislativas e de decisões dos tribunais, que interpretaram
pontualmente diversas normas da Lei de Improbidade Administrativa (LIA). Para
ilustrar, no âmbito do STJ, entre outros mais, os Temas Repetitivos números
344, 701, 1042, 1055 envolvem matérias que, em determinados casos, vão desde a
dispensa do cumprimento da fase da manifestação prévia, que antecede o
recebimento da ação, passando pelas interpretações sobre o alcance das medidas
de indisponibilidade de bens decretadas pelo juiz na ação e alcançado, no STF,
as discussões sobre os efeitos das sentenças proferidas nas Ações Civis
Públicas (ACPs).
Esse processo indica que a lei estava a exigir um
aprimoramento, o que a comissão especial cuidou de fazê-lo com sólida base
técnico-jurídica. Nesta avançada fase da tramitação política no parlamento, a
polêmica maior se refere à adoção do requisito objetivo do dolo e para a
hipóteses da incidência da prescrição. Quanto ao dolo, muitos julgados já
examinavam essa hipótese de entendimento ante a necessidade de individualização
e caracterização das condutas dos agentes envolvidos, não contempladas de forma
objetiva no texto original. Ou seja, tecnicamente, trata-se de um
aperfeiçoamento que confere transparência e segurança jurídica às decisões, e
que afasta a presunção com o elemento da conduta improba.
Quanto à prescrição, o novo texto certamente cuidou
de corrigir uma distorção, por meio do atrelamento do marco inicial da contagem
ao fato improbo. Foi eliminado o critério do fim do mandato ou das nomeações em
funções de confiança e comissionadas. O inquérito civil agora tem prazo de três
anos para ser relatado, sem se iniciar a contagem da prescrição, providência
legal que elimina postergação ad eternun dos Inquérito Civis Públicos
(ICPs), que prejudicam a própria propositura da Ação Civil Pública (ACP). De
outro lado, para propor a ação, a lei nova, mais severa, ampliou a contagem
temporal da prescrição de cinco para dez anos contado do fato e delimitou em
vinte anos a pretensão de condenação (duração da ação).
A figura jurídica da prescrição sempre esteve envolvida
em polêmicas, mas não podemos perder de vista que se trata de um marcador legal
que, dentre outras finalidades, contribui para uma duração razoável e um
resultado útil do processo, um direito e garantia constitucional fundamental de
todo cidadão (art. 5, LXXVIII).
Quanto ao procedimento, as alterações são
profundas: foi abolida a fase prévia de recebimento da petição inicial regulada
no art. 17 par. 7, 8 e 9 da LIA, ou seja, o rito especial deixa de existir. A
ação passa a ser regida pelas normativas da Lei n. 13.105/2015 que instituiu o
Código de Processo Civil, tanto no que interessa aos pedidos de tutelas
provisórias quanto à própria ação que fica vinculada às normas do denominado
“processo de conhecimento”.
Compartilho da corrente que entende se tratar de
uma evolução que se esmerou na técnica jurídica e certamente contribuirá para a
entrega da prestação jurisdicional de forma mais rápida, objetiva e eficaz,
tudo em tempo razoável. Cabe agora ao Parlamento dar a sua contribuição,
sabedores de que a modificação de normas que influenciam o cotidiano dos
cidadãos sempre tende a gerar discussões por vezes acaloradas.
Enfim, numa rápida abordagem do texto do PL, não é
demais concluir que a LIA carecia de aperfeiçoamentos e adequações encorajando
novos segmentos da sociedade a se enveredar para as carreiras públicas. Nesse
sentido, as propostas da Comissão Especial são um marco evolutivo para a lei
guardiã de uma boa e zelosa gestão da coisa pública.
Ivan Francisco Machiavelli - advogado do MBT Advogados Associados, pós-graduado em Direito Processual Civil.
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