Após as autoridades da Guiné, na África, declararem um novo surto de Ebola no país, no último dia 14 de fevereiro, a organização internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) iniciou a mobilização de especialistas com experiência no atendimento a pacientes com Ebola para formar uma equipe de resposta à doença. Como uma das principais organizações médicas atuante durante o surto da enfermidade entre 2014 e 2016, na África Ocidental, MSF está formando um núcleo para oferecer assistência às populações da região afetada.
Anja Wolz é a Coordenadora de Emergência de Ebola e
está a frente da supervisão da resposta de MSF no país. Ela explica como o novo
surto foi identificado e quais são as melhores práticas para deter o vírus, que
matou 40% das pessoas infectadas na última pandemia na região do Golfo da
Guiné, entre 2014 e 2016.
P: Quão preocupados vocês estão com este novo surto
de Ebola?
Anja: Como em todas as respostas a epidemias, é
importante manter a calma e o foco, mas um surto de Ebola é sempre preocupante.
Por isso, mobilizamos uma equipe, formada por especialistas de MSF com
experiência no atendimento em casos de Ebola, que viajarão para a Guiné assim
que os processos administrativos e de visto permitirem. Podemos descobrir que
se trata de um pequeno surto, fácil de controlar e conter, ou podemos descobrir
que o problema é maior e mais complexo.
P: Que medidas têm de ser adotadas no início de uma
resposta ao Ebola?
Anja: Primeiro precisamos ter uma visão clara do
problema. Uma equipe de vigilância epidemiológica, com um epidemiologista de
MSF, partiu na segunda-feira, 15 de fevereiro, para as áreas afetadas de
N'Zerekore e Gouéké, no extremo sul do país. Eles já começaram a fazer o
trabalho de vigilância epidemiológica, mas ainda não temos total clareza sobre
o que estamos enfrentando.
Depois, há uma série de medidas básicas e
importantes, que devem ser tomadas de forma rápida e adequada como:
- rastrear
contatos (identificar todas as pessoas que estiveram em contato com alguém
que foi diagnosticado com Ebola, para monitorar sua saúde e interromper a
cadeia de transmissão);
- ter
instalações médicas com a estrutura adequada para isolar e tratar os
pacientes com Ebola;
- garantir
que haja práticas funerárias seguras para qualquer pessoa que morra de
Ebola ou com suspeita da doença;
- transmitir
informações úteis e claras sobre educação em saúde;
- certificar-se
de que haja uma boa triagem estabelecida em todas as unidades de saúde, para
minimizar as chances do Ebola ter consequências indiretas no resto do
sistema de saúde;
- envolver
a comunidade.
O envolvimento da comunidade é de importância vital
para o sucesso do trabalho. Precisamos investir tempo e energia para falar e
ouvir as comunidades das áreas afetadas. É preciso adaptar a nossa resposta à
epidemia de acordo com as demandas locais, mas também é preciso que eles se
adaptem para evitar os riscos de contágio pelo Ebola. Tem que ser uma conversa
de mão dupla.
P: E quanto à perspectiva de uma vacina contra o
Ebola?
Anja: Certamente a existência de vacinas contra o Ebola
é uma das principais diferenças em relação ao surto enfrentado entre os anos de
2014 e 2016. E esta é uma ótima notícia, mas precisamos ter cuidado com as
expectativas. É improvável que haja vacinas suficientes para cobrir regiões ou
prefeituras inteiras. Isso significa que as decisões sobre como será o uso da
vacina precisam ser explicadas de forma muito clara, para evitar mal-entendidos
e possível desconfiança nas comunidades afetadas pela doença.
E, mais uma vez, tudo se resume ao engajamento da
comunidade. Já vimos isso acontecer muitas vezes no passado. Se uma comunidade
se sente envolvida, ouvida e capacitada, a resposta ao Ebola provavelmente
correrá bem, com ou sem vacinas. Mas, se uma comunidade se sente marginalizada,
ignorada e fica nervosa ou desconfiada, então a resposta ao Ebola provavelmente
enfrentará múltiplas dificuldades, com ou sem vacinas.
P: E quanto aos novos tratamentos do Ebola?
Anja: É verdade que não existiam tratamentos para o
Ebola no início do surto de 2014 e, portanto, essa é uma diferença
significativa neste momento. Ainda não sabemos qual dos tratamentos será usado
na Guiné, mas o próprio fato de ter uma opção de tratamento é bom por dois
motivos:
- aumentam
significativamente as chances de sobrevivência do paciente, principalmente
se o doente iniciar o tratamento razoavelmente cedo;
- significa
que temos melhores chances de incentivar as pessoas a virem mais cedo para
o tratamento e isolamento. Antes que houvesse um tratamento disponível,
era compreensível que as pessoas ficassem longe dos Centros de Tratamento
de Ebola, que muitas vezes eram temidos como locais de morte. Mas com um
tratamento disponível, isso pode mudar substancialmente. Isso é importante
para o controle de surtos, porque quando alguém com Ebola está isolado,
não espalha o vírus para outras pessoas.
P: Como MSF atuará na Guiné?
Anja: Teremos uma pequena equipe multidisciplinar
especializada em Ebola capaz de lidar com praticamente todos os aspectos ao
combate à doença. Já temos um primeiro time avançado, que se mudou para a área,
para ajudar na vigilância epidemiológica. Eles também vão entender o que a
comunidade conhece sobre a doença para adaptar de forma adequada as informações
de educação em saúde para a população. Quando a equipe dedicada ao Ebola
chegar, eles combinarão forças e tomarão decisões rápidas sobre onde e como MSF
pode ajudar mais. A equipe terá as habilidades e ferramentas para fazer o que
for necessário. Desde o tratamento médico do Ebola até o trabalho de vigilância
epidemiológica, educação em saúde, rastreamento de contatos, engajamento da
comunidade ou vacinação.
Há algo essencial a ser lembrado, tanto para MSF
quanto para todas as outras equipes envolvidas na resposta. Você precisa trazer
suas habilidades técnicas (médicas ou epidemiológicas ou de controle de
infecção ou educação em saúde), mas você também precisa utilizar suas
habilidades interpessoais para o engajamento comunitário. Ambas são necessárias
em uma resposta à epidemia de Ebola.
Sobre Médicos Sem Fronteiras
Médicos Sem Fronteiras é uma organização
humanitária internacional que leva cuidados de saúde a pessoas afetadas por
conflitos armados, desastres naturais, epidemias, desnutrição ou sem nenhum
acesso à assistência médica. Oferece ajuda exclusivamente com base na
necessidade das populações atendidas, sem discriminação de raça, religião ou
convicção política e de forma independente de poderes políticos e econômicos.
Também é missão da MSF chamar a atenção para as dificuldades enfrentadas pelas
pessoas atendidas em seus projetos. Para saber mais acesse o site de MSF-Brasil.
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