Há de parecer um contrassenso. Há algumas décadas, temia-se pela empregabilidade dos mais idosos. Dizia-se que eles seriam rapidamente superados e, muito provavelmente, substituídos pela juventude que se preparava para entrar no mercado de trabalho. Em reportagens sobre o assunto, li que indústrias japonesas tinham uma sala de estar e de convivência onde seus velhinhos podiam se sentir úteis, convidados a opinar perante certas situações específicas. Cortesias orientais para antigos ocupantes de um mundo que rejuvenescia. Não sei se tais locais ainda existem.
A vida, porém, furou a bola de
cristal, ao menos no Brasil. No país do futuro, o Estadão do dia 14 deste mês
publicou matéria que merece ser lida, da qual extraí pequeno trecho:
“... Ou seja, de cada dez trabalhadores com até 24 anos de idade, quase oito
trabalham em situação vulnerável, segundo levantamento da consultoria IDados.
Em números absolutos, isso significa perto de 7,7 milhões de pessoas. Na
faixa etária entre 25 e 64 anos, o porcentual é de 39,6% e, acima de 65 anos,
de 27,4%.” O inteiro teor da matéria pode e deve ser lido aqui.
A constatação não surpreende
se recordarmos o minucioso relatório da UNESCO intitulado "Perfil dos
professores brasileiros" (2004) – sem dúvida o mais alentado e minucioso
que já li – constatou (tab. nº 55, pag. 108) que 72% dos nossos “trabalhadores
em educação” assumiam como sua principal função "formar cidadãos
conscientes". Apenas 9% priorizavam "proporcionar conhecimentos
básicos" e não mais de 8% sublinhavam a importância de "formar para o
trabalho". Noutro item da mesma pesquisa (tab. nº 64, pag. 127) 64,5% dos
professores tinha consciência, em grau alto e muito alto, de exercer um
"papel político". Infelizmente, não se requer nova investigação para
saber que de lá para cá, ao longo dos últimos 16 anos, também nisso a situação
só se agravou.
É só lembrar: o aparelhamento
e a ação política dos sindicatos da categoria; a partidarização das
universidades públicas; a ocultação de autores conservadores e liberais; a
orquestração depreciativa contra o projeto Escola Sem Partido; atos de
formatura que se assiste por aí. Nada de estranhar num país que cultua Paulo
Freire, que assume atitude religiosa perante a obra mais descaradamente
política que já li sobre educação e continua a influir em tantos no comando da
barra de giz ou do ponteiro lazer.
O PISA de 2018, divulgado em
dezembro de 2019, continha apenas uma notícia boa para o Brasil: a convicção de
que assim como está não dá para continuar. Lembre-se, porém, que, em nosso
país, tudo precisa mudar, contanto que, para cada um, tudo fique como
está. Resultado: num rol de 79 países, conseguimos as posições entre 58º
e 60º em leitura, entre 66º e 68º em ciências e entre 72º e 74º em matemática.
A variação decorre da margem de erro adotada pela pesquisa.
O resultado dessas posições de vanguarda, da formação de jovens de pouco estudo
e nenhum livro, entregues a seus “criativos e não reprimidos impulsos”, está
custando muito caro àqueles em quem se investiu de modo tão equivocado. Outro
dia, deu-me dó de uma atendente de caixa quando a vi, disfarçadamente, contando
nos dedos para calcular um troco de R$ 12 reais. Sem sucesso, apelou para a
calculadora.
Sempre que alguém se apresentar como trabalhador em educação, lhe falar em
educação para a cidadania, se disser freireano, saia correndo, chame a mulher e
as crianças e grite por socorro, SOS, Mayday, salve-se quem puder! Em seguida
seus filhos estariam falando em alternativos, fascistas, neoliberais,
negacionistas, golpistas, excluídos, oprimidos, bem
como em utopia, problematizar e por aí afora.
Percival Puggina =membro
da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto,
empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org);
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil
pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.
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