Muitas escolas
optaram por aulas on line (Divulgação) |
Escolas particulares do país
deixaram de oferecer o ensino presencial como medida de contenção do contágio
do novo coronavírus. Por conta disso, a redução da mensalidade escolar e a
alteração no contrato etsão sendo cogitadas
Em meados de março, as escolas
particulares do país deixaram de oferecer o ensino presencial, como medida de
contenção do contágio do novo coronavírus. Diante deste cenário, a redução da
mensalidade escolar e a alteração no contrato estão sendo cogitadas.
A advogada Isabella Bittencourt
Mäder Gonçalves Giublin, pós-graduada em licitações e contratos
administrativos, pontua que por se tratar de uma relação consumerista, de
contrato entre particulares, assim como em qualquer outro contrato dessa
natureza, regrado pelo Direito Civil, é possível a revisão contratual, por
disposição legal, ainda mais considerando que a prestação se torna – ainda que minimamente
– desproporcional. E, assim, a legislação socorre os contratantes prejudicados
em situações como tal. “O que não se permite é um excesso de oportunismo, como
o pedido de isenção do pagamento da mensalidade, por exemplo”.
Muitas medidas econômicas foram
tomadas pelo governo, desde redução ou ampliação do prazo para pagamento da
carga tributária, flexibilização das normas trabalhistas, oferecimento de
crédito etc., portanto, observa a advogada, que tais medidas são afetas às
decisões governamentais, da relação entre particulares e governo.
Em relação a projetos de lei
que propõem a redução do valor da mensalidade escolar durante o isolamento
social, Isabella percebe que a justificativa é nobre, mas não encontra respaldo
na lei, pois é absolutamente contrário ao que dispõe a Constituição Federal a
respeito das relações entre particulares. O fato é que, tanto as escolas,
quanto as famílias, precisam chegar a um senso comum que atenda às necessidades
desta situação crítica pela qual o país está passando. “Fica claro que o ônus
deva ser dividido entre ambas as instituições, para que, no final, não penda
para um lado ou outro, muito menos para os alunos, maiores prejudicados no
contexto em que estamos vivemos”, assegura.
Aos olhos da lei
“Como a situação de desconto de
mensalidade escolar não se trata de proposta de mudança de diretrizes como a
educação em si, mas, proposição de alteração da relação contratual entre
particulares, não vislumbro que essas propostas legislativas dos estados possam
ser levadas adiante”, pontua Isabella Giublin.
Para ela, em regra, não se
pode, por meio de projeto de lei estadual, versar sobre desconto de
mensalidade, porque se trata de uma relação entre particulares, regida pelo
Direito Civil. E a esse respeito, a advogada entende que não cabe aos
municípios ou estados da federação legislar sobre a matéria, mas apenas à
União. Porém, Isabella reconhece que essa é uma questão bastante controvertida,
pois muitos enquadram como matéria afeta à relação de consumo, sobre a qual
poderiam estados e municípios legislarem. E arremata destacando que “cabe a
cada um dos interessados, no caso os pais, contratantes, postular a redução
diretamente com a escola”, ressalta.
Restituição total ou parcial
A advogada salienta que falar
em possível restituição total ou parcial dos valores pagos durante o período de
suspensão de aulas é um tanto difícil. “O que se defende é que não está havendo
a contraprestação esperada, não por escolha da escola, porém, sempre nas
situações em que exista desproporcionalidade nas prestações dessa natureza, o
contratante pode pleitear a modificação das cláusulas contratuais que resultem
numa disparidade ou uma onerosidade excessiva em razão de um fato superveniente”.
Em sua opinião, a restituição
total não encontra respaldo legal. “Afinal, o contrato está sendo mantido,
ainda que aluno não esteja assistindo às aulas, e a escola também deve cumprir
com suas obrigações, seja com a folha de pagamento de seus funcionários, seja
com o adimplemento de outras despesas correntes”. Além disso, tem
responsabilidade sobre o aprendizado do aluno, a manutenção das despesas
internas da escola, bem como de seus compromissos com livreiros, material
escolar e outros compromissos assumidos para a vigência do ano letivo. “No
caso, existe a opção de rescisão, mas não a restituição total”, frisa.
Quanto à restituição parcial, a
advogada afirma ser discutível e apenas plausível se a escola não ofereceu
desconto no período em que esteve fechada. “No entanto, é sempre bom
lembrar que a escola não foi quem deu causa à situação da suspensão das aulas
e, assim, prevalece a regra de quando houve a contratação, sendo a revisão ou
alteração do contrato uma exceção”.
Dois lados da moeda
Por outro lado, Isabella
acredita que muitas escolas tenham se utilizado da flexibilização dos direitos
trabalhistas para o enfrentamento econômico da pandemia, seja antecipando as
férias dos seus funcionários, seja utilizando o regime especial de compensação
de jornada pelo banco de horas, ou reduzindo proporcionalmente a jornada de
trabalho e salário, ou suspendendo temporariamente o contrato de trabalho,
dentre outros. “Com isso, é certo que houve, ainda que minimamente, uma redução
de despesas para a escola. Sem contar na redução de gastos como: energia
elétrica, água, gás, alimentação (ao menos para as escolas que trabalham em
regime de período integral)”, pontua.
Por sua vez, a advogada relata
outras situações. Muitos pais tiveram que se socorrer a planos “a”, “b” e “c”,
deixando seus filhos em casa, o que certamente fez aumentar os gastos na
residência ou contratando pessoas para cuidar de seus filhos, ou deixando seus
empregos. Ainda, e mais importante, não se pode perder de vista o fato de que
muitos desses pais que mantêm filhos nas escolas privadas podem ter sido
demitidos ou podem ter tido seus salários reduzidos ou seus contratos
suspensos; ou no caso dos pais trabalhadores autônomos, certamente estão
enfrentando sérias dificuldades financeiras, pelo altíssimo impacto na economia
como um todo.
Isabella reforça que a balança
pende para os dois lados, tanto da escola, quanto dos pais, de modo que parece
razoável uma diminuição da mensalidade (seja com restituição, seja com desconto
nas parcelas subsequentes), cujo valor deverá ser analisado caso a caso, com
uma solução que atenda a racionalidade econômica das partes.
Consenso é o melhor remédio
A resolução consensual é sempre
preferível, ainda mais nesse momento crítico pelo qual estamos passando, observa,
salientando que o Judiciário já está abarrotado e nem sempre traz uma solução
que seja adequada a ambas as partes. “Assim como em outros contratos privados –
a exemplo de contratos de locação, que muito se tem discutido a respeito de
descontos ou da dilação no pagamento da locação – a mensalidade escolar segue a
mesma linha”, aponta.
“O ideal, no momento, é a
tentativa de solução amigável”, argumenta, destacando que as alternativas
propostas, visam manter o vínculo contratual. “Porém, caso não seja possível
a redução da mensalidade – pelo tempo em que durar a situação do estado de
emergência – ou a revisão do contrato, cabe ao contratante pedir a sua
resolução”, sugere a advogada. Ressalta que como muitos têm receio de perder a
vaga na escola, ou como muitas crianças não podem perder o período letivo, caso
não seja factível a resolução do contrato, “podem os interessados, sim, buscar
a via judicial, desde que devidamente comprovado esse desequilíbrio
contratual”.
Finalizando, Isabella qualifica como boa alternativa
as escolas oferecerem as aulas por meio de plataformas digitais. “Não apenas do
ponto de vista das solicitações para suspensão ou redução do pagamento de
matrículas, mas principalmente pelo aluno, para evitar que perca conteúdo e
mantenha o vínculo com a escola”. Muitas escolas optaram por esse tipo de aulas,
o que tem modificado as rotinas das famílias durante a pandemia e
trazido opções para manutenção do serviço pedagógico prestado. Ela
acredita que é uma nova adaptação, tanto dos alunos, quanto dos professores, e
busca minimizar o prejuízo didático-pedagógico pela falta de aulas presenciais.
“A preocupação dos pais vai além da educação em si, como perda do ano letivo ou
atraso nos conteúdos, mas o distanciamento de colegas, a ausência de sociabilização
e a necessidade de nova adaptação escolar para as crianças menores, o que pode
ser minimizado com as aulas à distância”, sustenta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário