Fenômeno cresce entre a Geração Z, mas já se espalham entre profissionais mais maduros e desafia para o desenvolvimento da adaptabilidade
Se antes o ideal era construir uma carreira linear em uma única
área, hoje os profissionais têm desafiado esse modelo. A chamada “carreira
multipotencial” cresce em todo o mundo e já é uma realidade no Brasil,
transformando a forma como se entende trabalho, propósito e estabilidade.
Dados da FGV mostram que 34% dos brasileiros da Geração Z
conciliam pelo menos duas fontes de renda. Essa pluralidade vai de atividades
tradicionais, como CLT e empreendedorismo, até trabalhos digitais como produção
de conteúdo, design, programação e até a atuação em plataformas de ensino e
consultoria online. Uma pesquisa da McKinsey reforça a tendência: globalmente,
60% dos jovens afirmam que preferem carreiras que lhes permitam explorar
diferentes áreas ao longo da vida.
As razões variam. Há, por um lado, a necessidade financeira — em
um país onde o custo de vida aumenta e os salários muitas vezes não acompanham
a inflação, diversificar a renda é um recurso para manter estabilidade.
Mas também há o fator aspiracional: o desejo de autonomia, de
construir um estilo de vida mais alinhado a valores pessoais e de encontrar
significado no trabalho. Com a expansão da gig economy e da economia digital, a
prática tende a se intensificar nos próximos anos.
“Os profissionais dessa geração não se contentam mais em caber em
caixinhas pré-definidas. A carreira multipotencial reflete uma mudança
estrutural no mercado: pessoas que transitam entre áreas, acumulam diferentes
competências e constroem trajetórias menos lineares. Para as empresas, isso
exige uma revisão de modelos tradicionais de gestão de talentos. Conquistar
esse perfil vai além de oferecer benefícios; passa por criar ambientes que
valorizem a diversidade de experiências, possibilitem mobilidade interna e deem
espaço para inovação”, avalia Ana Paula Prado, CEO da Redarbor Brasil, detentor
do Infojobs.
Para as organizações, o fenômeno abre uma frente ambígua. De um
lado, colaboradores com múltiplas habilidades são capazes de inovar, conectar
áreas distintas e propor soluções criativas que dificilmente surgiriam em
equipes homogêneas. Esse perfil abre portas para possibilidades novas e
dinâmicas de carreira e posições em empresas estratégicas. De outro, a alta
rotatividade e a busca constante por novos desafios, se não forem bem
planejadas, podem gerar instabilidade profissional. Investir em oportunidades
com programas de desenvolvimento contínuo, trilhas de carreira flexíveis e
abertura para projetos paralelos (side projects) são algumas das alternativas
para se manter relevante e em destaque no mercado. Não basta buscar por uma
carreira multidisciplinar, mas se desenvolver como um profissional desse porte.
O que antes poderia ser visto como falta de foco hoje é
reconhecido como versatilidade em profissionais disciplinados e flexíveis. “O
modelo tradicional de emprego (linear, vitalício e previsível) está deixando de
ser a principal referência de sucesso. Em seu lugar, ganham força trajetórias
construídas a partir da combinação de diferentes competências, interesses e
experiências.” aponta a CEO do Infojobs.
Ana Paula ressalta ainda que o movimento multicarreiras, em muitos
casos, não é apenas uma escolha individual, ele também está associado ao
cenário financeiro de milhares de jovens no Brasil. “Geralmente, o início da
carreira está associado a remunerações mais baixas, já que se tratam de
posições de entrada no mercado. Por isso, é comum que os jovens busquem
combinar diferentes fontes de renda — o que, além de complementar a experiência
profissional, contribui para ampliar conhecimentos e desenvolver habilidades
relevantes para o futuro”, comenta.
“Para quem busca construir esse tipo de trajetória, o diferencial
estará em desenvolver essas ‘multi habilidades’ que fazem a diferença
independente da área de atuação, como por exemplo inovação, criatividade,
pensamento analítico, flexibilidade e foco em resultados. Esse é o caminho para
transformar o potencial em grandes oportunidades”, conclui. Por outro lado, as
empresas que conseguirem adotar mais abertura, flexibilidade e estratégias de
gestão estarão mais preparadas para acompanhar essa pluralidade e, assim,
atrair e reter os melhores talentos.
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