A política armamentista implementada pelo governo Bolsonaro soma, nos últimos dois anos, mais de 30 atos normativos publicados que facilitam a aquisição e o porte de armas de fogo e munições.
Quatro novos decretos
editados no final da noite do dia 12 de fevereiro alteram sobremaneira decretos
e leis anteriores, e entre as principais mudanças, aumenta de quatro para seis
a quantidade de armas que uma pessoa com registro poderá comprar. E de mil para
dois mil a quantidade de munição que atiradores e caçadores poderão comprar por
ano para armas de uso restrito.
Um dos decretos permite
que atiradores e caçadores comprem até 60 e 30 armas, respectivamente, sem
necessidade de autorização expressa do Exército, a qual somente será necessária
se ultrapassada essa quantidade.
A fiscalização, que é
realizada pelo Exército, perde força com a edição dos novos decretos, pois
agora, deixam de ser produtos controlados as miras para armas, as máquinas e
prensas para recarga de munições, além de obrigar o Exército a comunicar com no
mínimo 24 horas de antecedência a realização de vistorias dos arsenais, o que é
absolutamente contraproducente.
Outro ponto de destaque
é o direito de circular e carregar a arma fora de casa, o que também foi
flexibilizado. Quem tiver o porte poderá ter até duas armas em trânsito ao
mesmo tempo, além de outras flexibilizações quanto à comprovação de aptidão
psicológica.
A retórica armamentista
é falaciosa e assustadora especialmente pelo fato de que o Brasil possui o
maior número de homicídios perpetrados com uso de arma de fogo no mundo com seu
crescimento, estatística e umbilicalmente, ligado à proliferação das armas.
O discurso (falacioso)
apto a conquistar apoiadores, é o de garantir maior segurança às famílias, pois
em tese, cidadãos armados podem defender sua família de criminosos. Contudo, na
prática, os dados denotam uma conclusão diferente.
Dados do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública demonstram que 40% das armas apreendidas no
Brasil na mão de criminosos tem origem lícita, ou seja, foram adquiridas por
pessoas aptas e capazes, e acabaram caindo nas mãos da criminalidade.
Apesar de se dizer
atender aos anseios populares e garantir mais segurança à população, dados do
Atlas da Violência demonstram que após o Estatuto do Desarmamento, a taxa média
anual de mortes por arma de fogo subiu 0,9% de 2003 a 2018, contra a média de
6% nos anos anteriores (1980-2003), logo, menos armas, menos homicídios.
Não obstante, os
defensores das armas se abrigam sob o argumento de que no ano de 2019, após a
edição dos primeiros decretos no ano anterior, o número de homicídios por arma
de fogo reduziu e tal redução se deu em razão do aumento do número de armas em
circulação. Mentira!
O fato é que o país teve
alta recorde de homicídios cometidos por armas de fogo no ano de 2017,
atingindo patamares históricos, enquanto em 2018 e 2019, houve queda expressiva
de 11,6% e 21,5%, respectivamente.
A conclusão lógica (e
rasa) é: “mais armas, menos crimes”, ignorando todos os fatores que impactam na
violência (relação de causalidade), como o quesito social, cultural, o sistema
jurídico penal e a própria boa aplicação das leis.
Reflexo disto é que no
ano de 2020 o país teve uma alta de 5% nos assassinatos após os dois anos
consecutivos de queda.
Enquanto de um lado se
facilita o acesso a armas, por outro se flexibiliza o controle sobre elas, o
que impacta também na capacidade de se investigar o cometimento de crimes
contra a vida, resultando em impunidade.
Se os anseios populares
são por maior segurança, o dever do Poder Público é prover segurança, e não
armar a população indiscriminadamente e sem qualquer amparo técnico que apoie a
medida, apenas torcendo para que o final seja feliz, conclusão esta que
cientificamente não se alcançará.
Vinicios Cardozo - advogado, especialista em Direito e Processo Penal,
pós-graduando em Ciências Penais pela Escola Superior da Advocacia (ESA) sócio fundador
e coordenador do núcleo de ações criminais e de compliance officer do
escritório GMP | G&C Advogados Associados, coordenador do Grupo Permanente
de Pesquisas "Teses Defensivas" na OAB Paraná (2018-2019), membro da
Comissão da Advocacia Dativa da OAB Paraná e ex-presidente da Comissão dos
Advogados Representantes da Subseção de São José dos Pinhais no Foro Regional
de Piraquara.
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