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quarta-feira, 1 de junho de 2016

Conferência Humanitária da ONU e a crise civilizatória



                         
No último dia 25 de maio a Marinha Italiana divulgou imagens de um barco lotado com mais de 500 imigrantes, balançando violentamente antes de virar jogando ao mar as pessoas que transportava. Cinco deles morreram.
As imagens chocaram o mundo e somaram-se a inúmeras outras que permeiam o noticiário dos telejornais quase que diariamente.

A crise humanitária evidenciada nos últimos anos pela fuga de milhares de pessoas que tentavam escapar das guerras, de perseguições e da pobreza no Oriente Médio e África é que levaram a ONU a realizar a Conferencia Humanitária Mundial, em Istambul, entre os dias 23-24 de maio.

Embora tivesse a participação de representantes de mais de 170 países, somente 55 chefes de Estado ou de governo compareceram. Das grandes potências somente a chanceler alemã Angela Merkel esteve. A baixa presença de líderes mundiais pode parecer decepcionante, mas considerando ser a primeira conferência sobre o tema, pode se tornar uma iniciativa que dará início a uma mobilização mais ampla para enfrentar o problema.

O cenário global mostra a necessidade de haver um consenso internacional para melhorar a ajuda às vítimas de conflito armado e desastres naturais. O volume de pessoas deslocadas na atualidade colocou em colapso o sistema de ajuda internacional. Inclui-se nessa conta 130 milhões de deslocados fugindo da guerra na Síria ou no Sudão, da fome na África ou os desabrigados pelo terremoto no Equador.

Nesse contexto, a realização da Conferencia já é um fato positivo pois a ação humanitária tem ficado em segundo plano diante de outros desafios globais, como a questão climática que tem conseguido mobilizar lideranças globais a participarem de seus encontros.

Durante a Conferência os participantes buscaram desenvolver novos métodos para o sistema humanitário centrados em cinco âmbitos de responsabilidade: prevenção de conflitos, proteção de civis, não deixar ninguém para trás, colocar fim à necessidade de ajuda humanitária e investir na humanidade.

Como resultado da Conferencia Humanitária foi acordado um “Grande Pacto” contemplando 51 medidas que buscarão criar um sistema de ajuda humanitária mais eficiente e flexível, localizado e colaborativo. O objetivo é “não somente manter as pessoas vivas, mas dar-lhes a oportunidade de terem uma vida digna”, como observou Ban Ki-Moon, Secretário Geral da ONU.

Discutiu-se que uma forma de tornar mais efetiva e eficiente a ajuda humanitária é fortalecer as comunidades locais como a melhor maneira de enfrentar as crises humanitárias. O sistema, em vigor, privilegia as organizações intermediárias que absorvem boa parte da ajuda, atualmente menos de 2% do financiamento total vai para os atores locais, que estão em contato direto com as pessoas afetadas. A ONU buscará incrementar essa taxa em 20 e 30% para o ao de 2020 como apoio das medidas propostas no Grande Pacto.

Durante a Conferencia 30 doadores e agencias assistenciais assinaram o documento final e países individualmente como a Bélgica e a Suíça, se comprometeram a ajudar financeiramente.

Essa primeira Conferencia Humanitária é um passo à frente e a sua realização reunindo mais de 5000 delegados para reestruturar o atual sistema humanitário é de grande significado. Seu efeito multiplicador dependerá de muitos atores que acompanharam o debate e tenderão a apoiar a implementação das 51 medidas. A atual crise humanitária na realidade questiona os fundamentos de nossa civilização.

Somente com a participação de milhares de indivíduos e organizações superaremos essa crise civilizatória resgatando e reforçando valores como o de solidariedade, sintetizado nas palavras do Secretário Geral da ONU no encerramento: “Somos somente uma humanidade com uma grande responsabilidade compartilhada”.


Reinaldo Dias - professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Campinas. Doutor em Ciências Sociais e mestre em Ciência Política. É especialista em Ciências Ambientais.

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