Daniel Toledo,
advogado especialista em Direito Internacional, analisa os impactos da decisão
e aponta contradições que podem levar à sua suspensão pela Suprema Corte
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump,
iniciou seu novo mandato com uma medida polêmica: a assinatura de uma ordem
executiva que visa encerrar a concessão automática de cidadania para filhos de
imigrantes indocumentados nascidos no país. Embora tenha gerado apoio entre
seus eleitores, a decisão também levantou preocupações jurídicas
significativas.
Segundo Daniel
Toledo, advogado que atua na área do Direito Internacional, fundador da Toledo e Associados, escritório de
advocacia internacional com unidades no Brasil e nos Estados Unidos, a medida
enfrenta barreiras constitucionais e pode ser revogada pela Suprema Corte. “A
ordem executiva de Trump desafia diretamente a 14ª Emenda da Constituição dos
Estados Unidos, que desde 1868 garante cidadania automática a qualquer pessoa
nascida em solo americano”, revela.
Para o advogado, essa emenda tem raízes históricas
profundas, inclusive ligadas à abolição da escravidão e à igualdade racial.
“Mudar algo tão fundamental exige uma nova emenda constitucional, o que implica
a aprovação de dois terços do Congresso e a ratificação por três quartos dos
estados. Esse nível de apoio é extremamente improvável”, explica.
Toledo destaca ainda que a jurisprudência da
Suprema Corte é amplamente conservadora quanto à interpretação da 14ª Emenda.
“As decisões anteriores reforçam o princípio de cidadania por nascimento,
tornando difícil justificar uma mudança com base apenas em uma ordem executiva.
A equipe jurídica de Trump parece ter utilizado argumentos frágeis,
especialmente relacionados à jurisdição, para sustentar a medida”, afirma.
Jurisdição e contradições
legais
O principal argumento da ordem executiva é que
filhos de imigrantes indocumentados não estão sob jurisdição total dos Estados
Unidos, o que justificaria a exclusão do direito à cidadania. No entanto,
Toledo aponta inconsistências nesse raciocínio. “Se o território americano não
tem jurisdição suficiente para conceder cidadania a essas crianças, como
poderia exercer jurisdição para deportar ou punir seus pais? Essa contradição
mina a base jurídica da medida”, avalia.
Segundo o advogado, o conceito de jurisdição
territorial se baseia na presença física de uma pessoa no território, o que,
por analogia, tornaria essa argumentação insustentável. “A medida cria um
dilema. Se os EUA não têm jurisdição para reconhecer direitos, não podem
exercer deveres punitivos. Isso coloca em risco outras políticas de imigração,
como deportações e prisões realizadas pelo ICE”, alerta Toledo.
A Suprema Corte dos Estados Unidos já se pronunciou
em decisões anteriores, como no caso United States v. Wong Kim Ark, que
estabeleceu um precedente ao confirmar que a 14ª Emenda garante a cidadania
para todas as pessoas nascidas em solo americano, independentemente da situação
imigratória de seus pais. “Essa decisão consolidou o princípio do jus soli,
garantindo que nenhuma interpretação presidencial pudesse restringir direitos
fundamentais assegurados pela Constituição”, explica o especialista.
Além disso, ações judiciais recentes, como o
processo movido pela ACLU, destacam que alterações na concessão de cidadania
por nascimento excedem os poderes presidenciais e são prerrogativas exclusivas
do Congresso. Esses argumentos reforçam a tendência de que a Suprema Corte
rejeite qualquer tentativa de redefinir o escopo da cidadania automática nos
Estados Unidos.
O provável destino da medida
Embora a ordem executiva já esteja em vigor, Toledo
acredita que sua aplicação será temporária. “A medida será inevitavelmente
questionada judicialmente e, com base no histórico da Suprema Corte, a chance
de ser derrubada é alta. Para fazer essa mudança de forma constitucional, Trump
precisaria seguir os trâmites legislativos adequados, algo que demanda um apoio
político que ele não tem no momento”, conclui.
Apesar de discordar da abordagem legal adotada,
Toledo reconhece que o debate sobre o uso estratégico da cidadania por
nascimento é legítimo. “É preciso haver um controle mais eficaz, mas a solução
deve ser construída com base em medidas legais sólidas, e não em decisões
executivas que geram mais dúvidas do que resultados práticos”, afirma.
Para o advogado, o episódio serve como um lembrete
de que mudanças em questões constitucionais exigem rigor técnico e diálogo
político. “Medidas precipitadas como essa criam instabilidade jurídica e
alimentam conflitos que poderiam ser evitados com uma abordagem mais
estruturada”, conclui.
Daniel Toledo - advogado da Toledo e Advogados Associados especializado em Direito Internacional, consultor de negócios internacionais, palestrante e sócio da LeeToledo PLLC. Toledo também possui um canal no YouTube com mais de 430 mil seguidores com dicas para quem deseja morar, trabalhar ou empreender internacionalmente. Ele também é membro efetivo da Comissão de Relações Internacionais da OAB Santos, professor honorário da Universidade Oxford - Reino Unido, consultor em protocolos diplomáticos do Instituto Americano de Diplomacia e Direitos Humanos USIDHR. Para mais informações, acesse o site.
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