No ano passado, a ANVISA anunciou novas regras de rotulagem nutricional para diversos produtos. Para alimentos em geral, o prazo de adequação se encerra em outubro deste ano.
Por exemplo, a conhecida Tabela de Informação
Nutricional deverá ter apenas letras pretas em fundo branco. Além disso, será
obrigatório declarar açúcares totais e adicionados na frente da embalagem,
ajudando o consumidor na comparação de produtos.
O intuito de mudar a rotulagem é fazer com que as
pessoas não se confundam ao escolher os produtos: com a rotulagem anterior,
afinal, muitos ingredientes ficavam nas "entrelinhas". Nesse
contexto, o consumidor realmente precisa entender e escolher claramente que
produtos consumirá, visto que os processados normalmente têm ingredientes como
gorduras (principalmente trans e saturadas), aditivos químicos e açúcares.
Embora os açúcares estejam presentes em muitos alimentos naturalmente, também
podem ser adicionados – e seu consumo em excesso pode levar à obesidade,
impacto na saúde pública e aumento no longo prazo de doenças crônicas como
diabetes, doenças cardiovasculares e doenças neurodegenerativas. Pode-se
consumir alimentos processados, mas não devem ser a base da alimentação. A
frase "descasque mais e desembale menos" faz total sentido, afinal,
os processados costumam ser muito calóricos e não tem o mesmo poder de
saciedade que os alimentos in natura (exemplo: frutas, legumes e
verduras).
Do ponto de vista burocrático, a regulamentação não
é leve. A própria ANVISA elaborou um novo manual de adequação com mais de 50
páginas – o que, por si só, evidencia a complexidade do processo. Regulando
todas as categorias tuteladas pela agência existem mais de 800 RDCs (Resoluções
da Diretoria Colegiada), um dos vários instrumentos normativos oficiais da
mesma do órgão.
Todo esse conjunto de medidas para o mercado
nutricional pode ser repleto de boas intenções. No entanto, pouco se considera
duas consequências importantes, chamadas de externalidades negativas. O aumento
do custo de rotulagem para o produtor, que ocasionalmente deve aderir às
alterações impostas elevará o custo do produto, reduzindo a gama de opções
disponíveis para o consumidor mais pobre. Além disso, muito embora seja
possível estabelecer indicadores para auferir a eficácia da medida no longo
prazo, é muito difícil determinar se as eventuais mudanças geram uma relação de
causalidade, de fato, e não apenas uma mera correlação.
Sabe-se que é durante a infância que a maioria dos
hábitos é enraizada: portanto, estimular uma alimentação saudável para as
crianças é um aspecto fundamental nas discussões de saúde pública.
Infelizmente, a obesidade infantil tem aumentado e isso é consequência direta
do consumo de alimentos ultraprocessados e processados. De acordo com a
Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), realizada pelo Instituto de Geografia
e Estatística (IBGE), em 2019, aproximadamente 16% das crianças brasileiras
entre cinco e nove anos apresentam excesso de peso. Nesse sentido, elas
precisam ter um consumo limitado de alimentos processados, além de ter acesso à
educação nutricional para construir bons hábitos de vida, evitando doenças e
promovendo saúde.
Embora a exposição direcionada de dados nutricionais possa auxiliar minimamente na mudança deste cenário no Brasil, é pouco provável que o brasileiro médio saiba exatamente como analisar tais dados e aplicar suas conclusões de forma efetiva. Muito mais relevante é o fomento da educação preventiva, já na primeira infância, com a introdução de conhecimentos básicos sobre o tema. Se a população não entender as informações técnicas, obrigar o produtor a expô-las pode se tornar só mais uma medida decorativa.
Bruna Ruschel - nutricionista pós-graduada em nutrição esportiva, nutrigenômica e mestranda pela USP.
Mariana Diniz Lion - advogada, pós-graduada em Escola Austríaca de Economia pelo IMB, especialista em compliance pela ESENI e consultora jurídica.
Ambas são membras do Instituto de Formação de Líderes de São Paulo (IFLSP).
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