A prática do bullying, apesar de fortemente condenada, ainda é comum em
todo o mundo. Infelizmente, o autista de destaca como a “vítima perfeita” para
esse tipo de abuso. Isso porque o autismo não é uma deficiência visível, como a
Síndrome de Down. Especialmente nos níveis mais leves, ele se manifesta a
partir de nuances que não são tão fáceis de identificar. Uma das principais
características, porém, é a dificuldade em interagir socialmente, o que pode transmitir
a imagem de um indivíduo soberbo ou arrogante.
Justamente pela falta de habilidades sociais, o autista pode ser
considerado a “vítima perfeita”. Na maioria das vezes, ele não consegue
identificar uma série de situações de violência simbólica ou não sabe o que
fazer para evitar essa violência. Sou autista e vivi situações terríveis na
infância e adolescência em diferentes escolas. Meu filho, também autista,
sofreu os mesmos abusos de colegas de classe na primeira infância e só
posteriormente passou a ser protegido pela turma, quando as deficiências dele
se tornaram mais notórias, o que não acontece nos casos de autismo leve.
O bullying, veja bem, não se caracteriza por uma criança que xinga a
outra, um adolescente que briga com o outro. Como professor, já presenciei
esses atritos muitas vezes em sala de aula. Esses casos não costumam escalar,
sendo resolvidos facilmente pelos próprios envolvidos. O bullying tem como raiz
ataques coordenados e contínuos, muitas vezes praticados coletivamente, com a intenção
de humilhar, ofender e magoar. Quem é agredido, por estar sozinho ou se sentir
impotente, não consegue revidar na mesma proporção.
Essa perseguição constante afeta os autistas de forma mais pungente.
Dados mostram que as taxas de depressão e ansiedade são muito maiores em
pessoas com autismo leve que naquelas com desenvolvimento típico. Eles também
são mais propensos ao suicídio, até nove vezes mais comum nesse público. Então,
esse é um problema que só conseguiremos resolver coletivamente, olhando com
mais atenção para essa parcela da população.
Para enfrentar o bullying, principalmente da pessoa com autismo,
precisamos trilhar dois caminhos. Primeiro, é preciso trabalhar a
conscientização por meio de um calendário fixo de debates sobre deficiência. A
sociedade precisa saber o que é o autismo e conhecer essas diferenças para
respeitá-las. Outro caminho é incentivar o treino de habilidades sociais do
autista, capacitando-os para reconhecer, enfrentar e denunciar situações de
bullying. O ideal é que ambas as alternativas sejam realizadas
concomitantemente, é o que possui os maiores e mais sustentáveis resultados de
pesquisa.
É imprescindível refletirmos sobre o impacto devastador dessa forma de
violência e agirmos coletivamente para combatê-la. Somente através da união de
esforços e da construção de uma cultura inclusiva e respeitosa, poderemos
proteger os autistas e garantir que todos vivam em um ambiente seguro,
acolhedor e livre de discriminação. Juntos, podemos fazer a diferença e
promover uma sociedade mais empática e justa para todos.
Lucelmo Lacerda - Doutor
em Educação e autor do livro “Crítica à Pseudociência em Educação Especial”
Nenhum comentário:
Postar um comentário