O vento já não era
favorável para os unicórnios – startups que atingem valor superior a US$ 2
bilhão – muito antes da pandemia do novo coronavírus. Chamadas por muitos
especialistas de incineradoras de dinheiro, a grande maioria delas se quer deu
lucro. Na busca desenfreada por crescimento rápido, a maioria se atropela ao
colocar dinheiro demais em uma única ideia, o que tem deixado os investidores
em alerta. Nesse contexto, quem está ganhando espaço são as startups camelos,
aquelas capazes de sobreviver mesmo em ambientes inóspitos.
A mudança de
cenário no segmento de startups não é nova. Em 2017, nasceu o movimento Zebras
United, um manifesto elaborado pelas empreendedoras norte-americanas Mara
Zepeda, Aniyua Williams, Astrid Scholz e Jennifer Brandel. As zebras criticam
os valores de "crescer rápido e sair de cena", defendendo startups
mais sustentáveis e que tenham forte impacto social. O animal foi escolhido pelo
fato de ser "preto e branco", marcando a realidade e transparência, o
que contrasta totalmente com os seres mitológicos bilionários.
Mas, há de se
convir que 2020 tem sido um ano de grande ruptura. A fragilidade da vida, o
isolamento social e a quebra da economia tem levado setores inteiros a
repensarem seus negócios. Com as startups não seria diferente. A farra do
dinheiro fácil nas rodadas de investimentos parece ter chegado definitivamente
ao fim. Agora, para sobreviver, é preciso ser resistente ao ambiente árido e
sem fontes de recursos abundantes.
Foi então que o
investidor Alex Lazarow, em sua coluna no Portal Entrepreneur, defendeu
que o modelo de unicórnios apregoado pelo Vale do Silício não faz sentido fora
de suas fronteiras, onde o ecossistema é muito menos favorável. O especialista
aponta que fora dali, o mascote mais apropriado são os camelos, já que eles
"se adaptam a vários climas, sobrevivem sem comida ou água por meses e,
quando chegar a hora certa, podem correr rapidamente por períodos prolongados".
Assim como no caso das zebras, pesa o fato de os camelos serem animais reais e
não fictícios. Eles são capazes de sobreviver nos lugares mais difíceis da
Terra, lutando diariamente por sua sobrevivência.
Lazarow
compartilha importantes lições a serem aprendidas com as startups camelos, que
ganham relevância ainda mais notória no contexto atual. Uma delas é sobre o
perigo de produtos e serviços gratuitos. "Em mercados mais difíceis e
menos desenvolvidos que o Vale do Silício, não é simples oferecer gratuidades
em prol do crescimento rápido. As empresas precisam gerar receitas para serem
sustentáveis. "Para atrair clientes, os inovadores precisam oferecer uma
solução que valha a pena pagar e serão recompensados se o fizerem".
Afinal, a razão de ser de uma empresa do regime capitalista será sempre a
geração de riquezas.
Outro alerta é
quanto ao gerenciamento de custos. Para ele, os inovadores precisam equilibrar
a curva de despesas com a de receitas. Novas contratações – que normalmente são
os maiores custos dessas empresas – devem estar condicionadas ao aumento das
receitas. Assim como o marketing precisa ser escalado em um ritmo adequado ao
crescimento da empresa. Da mesma forma, o investidor aponta para a necessidade
de só captar recursos extremamente necessários. "O capital de risco é uma
ferramenta poderosa, mas não funciona para todos os tipos de
empreendedores". E completa: "camelos tendem a ser mais criteriosos
em relação a tomar ou não investimentos externos, de quem e em que termos".
Por fim, o mais
importante, em especial em um momento como o qual estamos enfrentando, é manter
o foco no longo prazo. "Nem sempre a corrida é sobre quem chega ao mercado
primeiro. É sobre quem sobrevive por mais tempo", afirma. A
maturidade continua fazendo a diferença. A cultura de adaptabilidade e
resiliência de uma empresa fazem muita diferença quando são colocadas em
situações de apuros. "Os camelos crescem em jorros controlados, optando
por acelerar e investir no crescimento quando a oportunidade exigir". Que
empresas de todos os portes e segmentos sejam mais camelos para encarar esse
desafiador 2020!
Marília
Cardoso - sócia-fundadora da PALAS, consultoria pioneira
na implementação da ISO 56.002, de gestão da inovação.
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