No cenário
nacional, os leitores certamente observaram o correto empenho da imprensa em
combater a destinação de R$ 3,8 bilhões para a campanha eleitoral de 2020. Os
parlamentares reconheceram que o aumento custaria caro a eles politicamente.
Recuaram de sua intenção diante da pressão da grande imprensa, das ruas e das
redes sociais.
No entanto
cabe perguntar, por que o desinteresse da imprensa em cumprir o mesmo papel
quando o Congresso aprova uma Lei de Abuso de Autoridade que vai inibir a
persecução penal, jogando insegurança em todas as autoridades envolvidas no
processo? Onde foi parar o dever de enxergar o que lhe malfazem, devassar o que
lhe ocultam e velar pelo que interessa à sociedade?
Durante
muitos anos, atribuí a criminalidade solta e ativa nas ruas à formação
ministrada nos cursos de Direito que seguem o bate-bate do metrônomo
ideológico. Segundo ele, o ser humano é perfeito, o capitalismo o degenera e,
por isso, do criminoso não se poderia esperar outra conduta. Ele é um agente na
mesma revolução em que operam tais mestres. A tarefa dos intelectuais em
posição de poder é devolver o parceiro rapidamente às ruas. Tornou-se evidente,
agora, que há outro fator intervindo para manter a impunidade. Refiro-me ao
parlamento onde matérias restritivas à persecução penal têm tramitação urgente
enquanto matérias para acelerar o ritmo processual e manter bandido preso não
são do gosto e não despertam entusiasmo no plenário. O interesse próprio tanto
acelera algumas deliberações quanto breca outras. E a grande mídia? Nada!
Todo dia,
criminosos com várias passagens pela polícia, ficha criminal extensa, mas em
inaceitável liberdade, continuam matando e roubando. E a sociedade que se dane.
Que Senado e
Câmara fazem um jogo de cena, enrolam e não votam, está todo mundo vendo. A
questão que me incomoda, também indignaria Ruy Barbosa: por que a grande
imprensa não pressiona? Por que não aponta responsáveis pela resistência às
mudanças, sejam elas por emenda à Constituição, sejam por lei ordinária? Por
que divulgaram que o pacote anticrime do ministro Moro "sofreu alterações"
quando, na verdade, foi desfigurado para produzir, em alguns casos, o oposto do
que pretendia o projeto original?
Seria de se esperar. Afinal,
considero gravíssimo que o STF tenha acolhido, depois de dezenas de crimes
julgados, a tese que inventou o adereço processual segundo o qual o denunciado
fala depois do denunciante nas rotineiras e inócuas alegações finais dos
processos. E digo o mesmo da ultrajante decisão do STF que empurrou o trânsito
em julgado para o dia de São Nunca. Tudo irrelevante para a mídia.
Se a imprensa dedicasse às
atividades dos demais poderes contra o bem comum e no interesse próprio 10% do
empenho com que acompanha, escrutina e critica o governo, o combate à
criminalidade andaria mais adiantado e nossa segurança ampliada.
Percival Puggina - membro da Academia
Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a
tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo
Pensar+.
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