Doença pulmonar rara desafia
médicos e leva pacientes à UTI antes mesmo do diagnóstico
Com progressão rápida, a condição crônica
incapacita os doentes, tornando-os dependentes da medicação para manter a
qualidade de vida e sobreviver
Desempregada,
aos 45 anos, Marion Boebel esperou 8 meses para receber um diagnóstico. A
estudante de direito Emanuelly Bueno teve sérias complicações aos 17 anos
durante o parto do seu primeiro filho. O que elas têm em comum? Ambas foram
parar na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) antes de receber o diagnóstico de
hipertensão pulmonar tromboembólica crônica (HPTEC), uma doença rara, de
difícil reconhecimento e extremamente debilitante.
Caracterizada
pela alta pressão sanguínea nos vasos do pulmão, a doença é causada pela
presença de coágulos fixos de sangue que bloqueiam ou estreitam o fluxo
sanguíneo, fazendo com que o coração tenha que trabalhar mais para bombear
sangue para o órgão. Como consequência, o paciente apresenta falta de ar
progressiva, principalmente ao realizar esforço. Além disso, pode sofrer com
possíveis sinais de insuficiência do lado direito do coração, fadiga,
palpitações, síncope e inchaço.
Apesar
de incapacitante em seu estágio avançado, a HPTEC é praticamente assintomática
em seu início e por isso o paciente pode levar anos até ser diagnosticado, como
explica o pneumologista e professor colaborador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP),
doutor Caio Júlio Cesar dos Santos Fernandes. “Os primeiros sintomas da
hipertensão pulmonar são parecidos com os de diversas doenças e isso, somado à
raridade da doença, ajuda a postergar o diagnóstico”, comenta o
especialista.
“O
tratamento para a HPTEC varia de paciente para paciente. É necessário avaliar o
estágio da doença, o número de coágulos, a insuficiência respiratória e
inclusive se a cirurgia é indicada”, explica Dr. Caio.
Conheça
a história das pacientes
Atualmente
a HPTEC é considerada rara, porque não há dados disponíveis sobre o número de
pessoas com a doença. A literatura médica estima uma incidência de 2 a 182
casos por milhão de habitantes adultos por ano, a prevalência é de 8 a 40 casos
por milhão. Mas para as pacientes isso não quer dizer nada, já que sendo rara
ou não, é uma questão de extrema importância e gravidade – Emanuelly, por
exemplo, que nunca tinha ouvido falar na doença, aos 17 anos passou por um
susto que a levou ao diagnóstico.
“Nessa
idade engravidei do meu filho e durante toda a gestação sentia dores muito
fortes nas costas, mas tudo o que me diziam era que se tratava de contrações,
até que durante o parto eu tive duas paradas cardíacas e hemorragia. Na época,
os médicos não contaram para os meus pais e minha cesárea levou em torno de 6
horas. Mesmo assim, ninguém investigou porque eu tinha tido tantos problemas e
somente após retornar ao hospital muito debilitada que recebi o diagnóstico”, conta a estudante.
Já
Marion, quando estava na UTI, recebeu inicialmente o diagnóstico de embolia
pulmonar, que acabou evoluindo para uma HPTEC: “Por oito meses, mais ou
menos, tudo o que eu sentia era cansaço e falta de ar, não conseguia fazer
nada, até o ponto de não conseguir sequer sair da cama. Procurei um posto de
saúde próximo à minha casa, mas ninguém conseguia descobrir o que era, diziam
que eu tinha depressão, quando na verdade eu tinha vários coágulos no pulmão”,
relata Marion. “No primeiro momento eu fiquei feliz, aliviada por finalmente
ter um diagnóstico. O problema é que eu não tinha noção de que estava entre a
vida e a morte”. Tanto Marion quanto Emanuelly estavam prestes a travar uma
nova batalha em busca do tratamento mais adequado.
A
estudante de direito tinha indicação para o procedimento cirúrgico e veio para
São Paulo. Após aguardar na fila, conseguiu fazer a cirurgia, porém continuou
com alguns trombos residuais. “Apesar dessa intervenção ter me ajudado muito
e melhorado minha condição, hoje ainda preciso tomar o riociguate e dependo
totalmente dele e de outros medicamentos para manter minha doença sob controle
e preservar minha qualidade de vida”.
Já
Marion aguarda a análise de seu caso para saber se pode ou não fazer a cirurgia
e passou a depender de anticoagulantes, remédios para evitar o inchaço e inclusive
para controlar a pressão do pulmão. “Hoje meu quadro é estável. O problema é
que um dos meus remédios, fornecidos pelo SUS, não chega. Faz três meses que
não recebo e isso é muito comum de acontecer, às vezes recebo um mês e passo
outros sem”, pondera.
Inclusão do medicamento no
SUS
Paula Menezes, presidente da
Associação Brasileira de Amigos e Familiares de Portadores de Hipertensão
Arterial Pulmonar (ABRAF), conta que a dependência do Sistema Único de Saúde
(SUS) por grande parte dos pacientes é comum e por isso muitos deles sofrem com
a falta de medicamentos, seja por problemas no abastecimento da rede de
distribuição ou até pela falta de reconhecimento e oferta de tratamentos mais
efetivos, principalmente para os casos mais graves como o da Emanuelly.
A empresária fundou a
associação após perder sua mãe para a doença, e hoje luta na linha de frente
para que todos os pacientes com diferentes graus de hipertensão pulmonar (HP)
tenham acesso ao diagnóstico, tratamento e uma melhor qualidade de vida. “A
ABRAF tem um papel bem amplo na vida dos pacientes, e atua junto ao governo
promovendo abaixo-assinados e apoio de parlamentares”.
Bayer
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