A Organização Mundial da Saúde (OMS)
estima que aproximadamente 134 milhões de eventos adversos ocorrem globalmente
a cada ano devido a cuidados inseguros em instituições de saúde, levando a
cerca de 2,6 milhões de mortes anuais, especialmente em países de baixa e média
renda. Entre esses eventos, destacam-se erros de medicação, procedimentos
cirúrgicos inseguros, infecções relacionadas à assistência à saúde, erros de
diagnóstico e identificação incorreta do paciente. O custo global apenas com
erros de medicação — dos quais 50% são evitáveis — chega a US$ 42 bilhões por
ano, enquanto o custo total de cuidados inseguros ultrapassa US$ 1,17 trilhão.
No Brasil, os dados mais recentes da ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária -, referentes a 2024, mostram que as instituições de saúde notificaram um total de 426.148 eventos adversos. Desses, 153.325 não causaram dano ao paciente, enquanto 216.530 tiveram impacto leve, 44.822 impactos moderados, 9.013 foram considerados graves e, infelizmente, ocorreram 2.458 óbitos. Esses números podem ser ainda maiores, pois muitas instituições não notificam os eventos de forma adequada ou simplesmente não realizam a notificação.
Entre as
ocorrências mais graves estão a administração incorreta de medicamentos, seja
por dosagem ou tipo errados, e a realização de cirurgias em locais equivocados
no corpo dos pacientes. Além
disso, destacam-se casos de lesão por pressão, divididos em três tipos:
contusão (lesão dos tecidos moles causada por trauma), entorse (alongamento dos
ligamentos) e luxação, considerada a mais grave, em que há deslocamento do osso
da articulação. Esses dados refletem a seriedade das falhas no sistema
de saúde brasileiro e o impacto que podem ter na segurança do paciente.
Um novo cenário de
esperança para a segurança do paciente
- O dia 28 de abril marcou um avanço importante: a sanção da Lei nº 15.126, que
altera a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.80/1990) para incluir oficialmente a
atenção humanizada como um dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS).
Desde 2003, o Ministério da Saúde já orientava a prática da humanização por
meio da Política Nacional de Humanização (PNH), mas agora passa a fazer parte
dos princípios legais do sistema de saúde brasileiro.
Atenção
humanizada: Envolve ações como acolhimento com
escuta qualificada, respeito à dignidade e cultura, valorização do vínculo
entre profissional e usuário, comunicação transparente e um ambiente de cuidado
mais sensível, ético e acolhedor. O objetivo é que esse cuidado mais humano
contribua para aumentar a satisfação dos pacientes, melhorar a adesão aos
tratamentos e, consequentemente, reduzir eventos adversos.
Segundo a coordenadora do Grupo
Temático de Trabalho da Experiência do Paciente da SOBRASP (Sociedade
Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente), Kelly
Rodrigues, “a humanização no atendimento ao paciente envolve uma série de atos
que visam tornar a experiência mais acolhedora, respeitosa e centrada em suas
necessidades físicas e emocionais. Estar mais próximo do paciente, cuidando da
pessoa e não somente da doença, traz como consequência um cuidado mais seguro”.
Investir na redução de danos ao
paciente não só gera economia para o sistema de saúde, mas também resulta em
melhores resultados clínicos. Estudos da OMS indicam que, com o engajamento do
paciente no tratamento, é possível reduzir em até 15% os danos relacionados à
assistência.
Entre as ações essenciais de
humanização, destacam-se:
·
Acolhimento e escuta ativa: Ouvir
atentamente as preocupações do paciente e de seus familiares é fundamental para
um diagnóstico mais preciso e um tratamento mais eficaz. Existem vários tipos
de escuta ativa, mas duas são consideradas as melhores: escuta empática e
generativa. “Na empática, o profissional desenvolve uma conexão emocional com o
outro e entra em um nível mais profundo da escuta. Fica com a mente e o coração
abertos, sem deixar os próprios julgamentos atrapalharem essa conexão humana
criada. Na generativa, o profissional se sente conectado com algo maior do que
ele mesmo. Fica com o coração e a mente abertos, totalmente concentrado no
outro. A prioridade passa a ser ajudar o outro com a geração de ideias e
possíveis soluções para suprir as necessidades compartilhadas por esta pessoa”,
explica a especialista.
·
Comunicação clara e transparente: Informar o
paciente sobre procedimentos e benefícios de forma compreensível garante maior
confiança e participação. Segundo Kelly, a comunicação é uma das ferramentas
mais importantes na entrega da experiência. Como outras competências, envolve
conhecimento, habilidade e atitude. “Para que o profissional possa se comunicar
bem com o paciente, é necessário que conheça o assunto, tenha conteúdo
confiável para argumentar, esclareça, oriente e saiba a forma correta de
transmitir a mensagem. Na maior parte das reclamações recebidas pelas
instituições de saúde, os pacientes e familiares se referem não ao que foi
dito, mas à maneira como foi dito. Geralmente, existe uma lacuna entre o que
achamos que estamos comunicando e o que estamos transmitindo de fato. Então, a
comunicação efetiva não é sobre o que você quis transmitir, mas sobre o que o
outro compreendeu”, ressalta Kelly.
·
Apoio emocional: Gestos
simples, palavras de conforto e empatia podem transformar a experiência do
paciente durante o tratamento.
·
Valorização da participação do
paciente e da família: Incentivar a participação ativa evita falhas e
aumenta a segurança do cuidado.
·
Respeito e dignidade: Tratar o
paciente com respeito, usando linguagem acessível, é um direito fundamental.
·
Profissionalismo e competência: A humanização
também exige profissionais bem treinados, com habilidades técnicas e humanas
Benefícios
da humanização:
· O
paciente se sente acolhido e respeitado e é mais propenso a seguir as
orientações do profissional de saúde.
· A
humanização permite uma relação mais próxima entre paciente e profissional de
saúde, o que pode levar a um diagnóstico mais preciso e um tratamento eficaz.
· Uma
comunicação clara e transparente, a escuta ativa e a valorização da
participação do paciente podem reduzir a ocorrência de conflitos e
mal-entendidos.

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