O relatório "A educação no Brasil, uma perspectiva internacional", divulgado recentemente pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em parceria com as organizações Todos Pela Educação e Itaú Social, lança luz aos problemas da educação brasileira, aponta soluções e, mais uma vez, identifica o principal vetor de nossa crise educacional: a desigualdade. O Brasil, que há poucos anos vislumbrava um início de década em 2020 alcançando metas razoáveis com o Plano Nacional da Educação (PNE) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), vem colecionando recordes do avesso, como se a cada ano e a cada problema que nos foge do controle, regredíssemos décadas.
Os efeitos da pandemia de covid-19, causada pelo
vírus SARS-CoV-2, têm alargado também as defasagens em termos da desigualdade
na educação brasileira. Com o prolongado período de fechamento das escolas, o
cancelamento das atividades presenciais e o retorno das escolas privadas, fica
evidente que o preço a ser pago é, mais uma vez, muito mais alto para aqueles
alunos com dificuldade de acesso, desprovidos de equipamentos tecnológicos e
moradores das periferias, onde a falta da escola tem sido apenas mais um entre as
dezenas de problemas enfrentados.
O relatório aponta que, de 2001 a 2018, as taxas de
conclusão nos estudos melhoraram de 90% para 95% nos anos iniciais do ensino
fundamental; de 67% para 86% nos anos finais e 22% para 67% no ensino médio.
Ainda que o avanço seja importante, o problema no ensino médio, no qual a
escolha entre estudar e trabalhar se torna mais relevante, ainda é grave. Dados
do Instituto Datafolha divulgados em janeiro de 2021 mostram que 4 milhões de
estudantes entre 6 e 34 anos abandonaram os estudos em 2020, uma taxa de 8,4%
que chega aos 10,8% na educação básica. Dados do Fundo das Nações Unidas pela
Infância (Unicef) de 2021 mostram que os perfis desses estudantes já são bem
conhecidos: pretos, pardos, indígenas, e vivem nas regiões Norte e
Nordeste do país. Números que representam nada menos do que um retrocesso de 20
anos na educação.
O relatório da OCDE aponta ainda que, em 2018, 37%
dos homens e 28% das mulheres do Brasil, entre 25 e 34 anos, não tinham
formação média ou superior. O número é superior ao de países como Colômbia,
Argentina, Chile e também acima da média da OCDE, de 17% para homens e 13% para
mulheres. Mas o relatório é claro ao indicar que o problema educacional no
Brasil começa muito antes: no acesso à educação básica, a desigualdade entre as
crianças é tamanha, que irá acompanhá-las por todo o ensino fundamental e
médio, condicionando, inclusive, aqueles que poderão acessar um ensino superior
de qualidade. Da desigualdade de formação para a desigualdade de renda, é um
pequeno passo.
Ainda que o tom seja de desesperança, nem tudo é
retrocesso. A aprovação do novo Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) é um exemplo
de que a articulação pelo futuro da educação no Brasil ainda existe. O
relatório aponta, ainda, saídas interessantes como vincular gastos aos
resultados, desenvolvimento da profissão docente e intervenções na primeira
infância. Na onda do retrocesso, parece que canções antigas que questionam “que
país é esse” ou que acusam o futuro de não ser mais como era antigamente,
infelizmente ainda soam bem atuais. Peço licença ao Sr. Renato Russo para
sentir saudade “de tudo o que eu ainda não vi”.
Walcir Soares Junior
(Dabliu) - doutor em Desenvolvimento Econômico com foco em políticas públicas
educacionais e professor de Economia na Universidade Positivo.
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