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sábado, 23 de maio de 2020

Em um mês de quarentena, as pessoas estão mais ansiosas e irritadas, mas conseguem enxergar aspectos positivos no confinamento


Pesquisa realizada pelo IPEFEM de 18 de março a 14 de abril mostra efeitos emocionais, comportamentais e físicos da quarentena na vida das pessoas. Segunda fase da pesquisa será concluída em agosto


Com a prolongação da quarentena e aumento do número de vítimas pelo novo coronavírus, muito tem se questionado a respeito dos efeitos psicológicos e como têm afetado a população neste período. Antecipando esta preocupação, o Instituto de Pesquisas e Estudos do Feminino (IPEFEM) fez uma pesquisa que envolveu 491 pessoas - entre homens e mulheres - para investigar os efeitos do isolamento social na vida destas pessoas, sejam emocionais, comportamentais e físicos.

Entre os dados mais preocupantes, 54% das pessoas avaliam o próprio estado de saúde mental como regular, ruim ou péssimo, e a ansiedade é a manifestação mais presente, atingindo 60% da amostra. Nos aspectos físicos, dificuldade de concentração e dores em geral, levam 27,5% dos entrevistados a fazer uso de algum medicamento, principalmente analgésicos e antitérmicos. 44% dos entrevistados notaram alguma mudança física, principalmente o ganho de peso (57%).

Diante destes números, alguns podem pensar que as pessoas estão odiando ficar em casa, mas não é isso que a pesquisa aponta. Apesar do sentimento de sobrecarga sentido principalmente entre as mulheres - 54% se sentiram um pouco ou muito sobrecarregadas -, a possibilidade de ficar mais próximo das pessoas que estão em quarentena na mesma casa (filhos, parceiros ou os pais)  faz com que 76% da amostra considere que a quarentena tem proporcionado não só consequências negativas, mas positivas também.

Caminhos e soluções
Para a fundadora do IPEFEM, Ana Tomazelli, os resultados da pesquisa são importantes primeiro porque ajudam as pessoas a nomear o que sentem - princípio do diagnóstico - e também porque mostram que não estão sozinhas no que sentem. “A quarentena não inaugura nada, mas põe uma lupa naquilo que não estava bom e que deixamos de lado porque tínhamos distrações. Com a supressão das distrações, esse volume interno de cada pessoa aumenta, as questões se agravam e principalmente as relacionais humanas e afetivas se aprofundam, mas também para aqueles que estão sozinhos e que, até então, estavam confortáveis com a sua solitude. Quando eu percebo e nomeio que estou irritada, por exemplo, eu assumo o controle e posso decidir o que fazer com isso. E eu quero acreditar que quem nomeia vai procurar fazer alguma coisa a respeito do que sente”, explica.

“O número dá uma borda para não nos sentirmos sozinhos. Não é que a gente fica feliz com a desgraça do outro, mas saber que não sou só eu que estou sobrecarregada, com dor nas costas, irritação, nos dá um alento de que está tudo bem”.

A pesquisa continua até agosto. A primeira fase da segunda etapa já está disponível. Para participar, basta responder as questões no link: https://pt.surveymonkey.com/r/IPEFEM_COVID19_052020 ou acompanhar pelo link na bio do instagram @ipefem. As pessoas que já participaram de pesquisas anteriores receberão os links automaticamente por e-mail.

Além da pesquisa, o IPEFEM oferece também tratamento terapêutico para aqueles que não podem pagar. Para isso, é necessário entrar em contato pelo whatsapp (11) 95556-0065 e preencher um formulário.

Confira as principais conclusões do estudo:


ASPECTOS EMOCIONAIS

●     Pouco mais da metade dos entrevistados avaliou o estado de saúde mental como regular, ruim ou péssimo nas quatro semanas, chegando a 63% dos entrevistados na quarta semana.

     Em geral, o estado de saúde emocional e mental das mulheres é mais crítico em comparação aos homens. Na segunda semana, por exemplo, 66% das mulheres avaliaram seu estado de saúde emocional / mental como regular/ruim ou péssimo, contra 43% dos homens. 

     As profissionais da área da saúde mostraram estado de saúde emocional pior quando comparadas à amostra total - superior em 8 pontos percentuais na primeira semana

     Pessoas com doenças pré-existentes relacionadas à saúde mental têm pior resultado no estado de saúde emocional e mental em comparação a amostra total. Na última semana, por exemplo, 84% avaliaram seu estado como regular, ruim ou péssimo.

     A ansiedade foi a emoção mais presente em todas as semanas, com uma média de 60%.

     Depois da ansiedade, medo, insegurança, angústia e dúvida foram as emoções mais relatadas nas duas primeiras semanas, com percentuais em torno de 40% das amostras. Na terceira semana, a preocupação fica praticamente empatada com a ansiedade em primeiro lugar, e o tédio (35%) e o desânimo (31%) aparecem entre as emoções mais presentes. Na quarta semana, a esperança (30%) surge entre as principais respostas.

     Entre as profissionais de saúde, a ansiedade é ainda mais elevada (71%), porém demonstram menos angústia e dúvida em comparação a amostra total.

     A ansiedade também é maior para pessoas com preexistência de distúrbios relacionados à saúde mental (83).

     Todas as emoções são mais intensas para as mulheres, com exceção da “dúvida”, que além de ser mais intensa para os homens, figura em 1º lugar, antes mesmo de ansiedade, que aparece para eles com 50%. 

     O desânimo aparece apenas para as mulheres, entre as emoções mais presentes (44%), enquanto que confiança aparece apenas para os homens (43%).



ASPECTOS FÍSICOS

     A dificuldade de concentração foi a manifestação física mais presente ou persistente entre os entrevistados em três das quatro semanas, chegando a 25% dos entrevistados na quarta semana. Na terceira semana, foi a insônia que ficou em primeiro lugar com 24%.

     Nas quatro semanas, por conta das manifestações físicas, uma média de 27,5% dos entrevistados fez uso de algum medicamento, principalmente analgésicos e antitérmicos. Na 3ª semana, antidepressivos, ansiolíticos, calmantes, medicações para dormir e antiácidos ou remédios para o estômago, surgem entre as medicações mais utilizadas, justamente quando a preocupação e a insônia aparecem como principais emoções e manifestações físicas, respectivamente.

     44% dos entrevistados notaram alguma mudança no corpo. O ganho de peso foi a principal mudança nas 3 primeiras semanas, percebido por 57% da amostra. A diminuição da disposição foi ficando mais evidente ao longo das semanas, e atingiu 65% dos entrevistados na 4ª semana. 

     A vontade de consumir mais bebidas alcóolicas foi manifestada por 16% das pessoas na 1ª semana e chegou a 35% na 3ª semana.



ASPECTOS COMPORTAMENTAIS

     Em geral, 79% da amostra teve que promover mudanças na casa ou na rotina. Principalmente adaptações para realizar home office, afastamento de empregados domésticos e adaptação com os filhos em casa, sem poder ir para a escola.

     Os entrevistados demonstraram preocupações maiores com a família, casa ou o futuro, muito mais do que consigo.  

     A irritação (41%) foi o comportamento mais percebido pelos entrevistados na última semana da pesquisa, superando preocupações com família, casa ou futuro.

     No período das quatro semanas, em média, 48% da amostra se sentiu muito ou um pouco sobrecarregada.

     As mulheres se sentiram mais sobrecarregadas (54%) em comparação aos homens (41%).

     Conversas online com amigos e familiares, a companhia de quem está na mesma casa em quarentena, atitude mental positiva e orações foram as principais ferramentas apontadas para tentar manter a saúde mental e emocional durante o primeiro mês da quarentena. TV, filmes e principalmente música foram ganhando espaço no decorrer das 4 semanas. Música ficou em primeiro lugar na 3ª semana, com 54% das menções, justamente no período em que a imprensa registrava a explosão das lives e transmissões de shows.

     O trabalho foi apontado pela maioria dos homens (57%) como principal ferramenta para manter a saúde mental e emocional durante a 2ª semana da quarentena, contra 33% das mulheres. 

     Aliás, as mulheres lançam mão de uma variedade maior de opções para manter a saúde mental, e ao contrário dos homens, optam pelas conversas online com amigos e parentes como uma das principais alternativas (46% delas fizeram isso, contra 29% dos homens). 

     No geral, 76% da amostra acredita que a quarentena tem proporcionado consequências tanto positivas como negativas.

     A principal consequência positiva foi a oportunidade de maior aproximação com as pessoas (famílias, filhos ou parceiro, parceira) seguido por cuidar de si, cuidar do auto desenvolvimento e, em um terceiro patamar, cuidar da casa, estudar e guardar dinheiro.

     75% dos entrevistados discordaram de ideias e comportamentos apresentados por outras pessoas. A indiferença ou desrespeito às regras de isolamento foi o principal motivo da discórdia, com 62% das respostas. Questões políticas assumiram o 2º lugar das discordâncias na 3ª e principalmente na 4ª semana, quando 66% da amostra afirmou ter entrado em discordâncias em função disso. 




Sobre a pesquisa

O público da pesquisa é formado na sua maioria por mulheres - cis ou trans - e inclui também profissionais da área da saúde linha de frente no combate à pandemia, pessoas com preexistência de doenças mentais diagnosticadas e pessoas que fazem uso de medicamentos controlados. A pesquisa foi realizada por meio de um questionário online, de 18 de março a 14 de abril. Os resultados foram contabilizados semanalmente, levando em consideração aspectos externos que impactaram cada uma das semanas como: expectativa com relação ao início oficial da quarentena na semana um; a demora no pagamento do auxílio emergencial e tensão no governo com o então Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta na semana dois; a prorrogação da quarentena e quase demissão de Mandetta na semana três; e por fim, o aumento no número de mortes no Brasil na semana quatro.


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