Médicos e autoridades da saúde seguem
divergindo quanto a faixa etária e a periodicidade da realização do exame
As divergências que já vêm de longa data voltaram à tona há
alguns dias, quando a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) fez consulta
pública sobre as atualizações do Manual de Boas Práticas em Atenção Oncológica,
usado no Programa de Certificação de Boas Práticas em Atenção à Saúde. Órgão
regulador dos planos de saúde, cabe à ANS fiscalizar o serviço prestado e criar
normas e outras iniciativas que melhorem o atendimento à população. Para
autoridades públicas, como o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional do
Câncer (Inca), o ideal é que a mamografia seja feita a cada dois anos por todas
as mulheres entre 50 e 69 anos. Entretanto, algumas entidades médicas, como a
Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), preconiza que o exame seja anual a
partir dos 40 anos.
De acordo com a Dra. Maria Julia Gregorio Calas, presidente da
Sociedade Brasileira de Mastologia – Rio de Janeiro, há décadas a realização da
mamografia é motivo de preocupação, pois, historicamente o rastreamento
mamográfico no país, tendo a mamografia como exame mais eficaz para o
diagnóstico precoce do câncer de mama, se mantém abaixo dos 70% de cobertura
populacional, preconizado pela Organização Mundial de Saúde. “Não foram poucos
os levantamentos feitos ao longo dos anos que comprovaram esse déficit. O
acesso é um problema crônico e a discussão da periodicidade é tudo que não
precisamos, pois primeiro temos que potencializar a acessibilidade das mulheres
ao exame”, alerta a mastologista.
Maria Julia lembra um levantamento realizado pela Dr. Sandra
Gigoia, membro da SBM Rio, através do DataSus, constatando que a cobertura
nacional era baixa. Nas Regiões Sul e Sudeste a piora dos resultados no período
de 2013 a 2018 foram notórias. Segundo ela, teoricamente são duas regiões que
deveriam servir de exemplo para o resto do país, pois contam com grandes
centros de atendimento e detêm um corpo médico muito maior, além de
contemplarem maior distribuição de mamógrafos. “É inacreditável grandes centros
amargarem um índice baixo de realização desse exame tão importante para as
mulheres em pleno século XXI”, afirma indignada.
Maria Julia sugere alguns caminhos para os gestores públicos aumentarem a cobertura mamográfica de forma organizada. Primeiro a conscientização da população sobre a mastologia enquanto especialidade que cuida da saúde das mamas (mais de 70% da população não sabe disso), segundo ajustar o fluxo do atendimento, diminuindo o tempo para a realização da mamografia, do diagnóstico (biópsia) e do início de tratamento. “Não precisamos mais de leis, mas, sim, que as existentes sejam cumpridas. Todo cidadão tem direito à saúde. Está na Constituição. Tem lei que garante a mulher o direito de realizar a mamografia. Lei que prevê o início do tratamento em até 60 dias após o diagnóstico, entre outras. Mas, infelizmente, não é bem isso que acontece”, alerta novamente a médica.
A presidente da SBM Rio lembra que a introdução do rastreamento
mamográfico organizado tem diminuído drasticamente a mortalidade por câncer de
mama em muitos países. Para ela, pelas dimensões territoriais do Brasil, há uma
complexidade, porém, com ações coordenadas é possível melhorar o acesso das
mulheres à prevenção e o tratamento. “A nossa dificuldade não é em relação ao
número de mamógrafos, pois há equipamentos em número suficiente, embora
a grande maioria seja de tecnologia ultrapassada (CR). O que precisamos é
aumentar a cobertura, através de organização, com melhor fluxo para a navegação
das pacientes e capacitação contínua dos profissionais. Isso otimizaria os
recursos já existentes e proporcionaria resultados significativos com melhor
eficiência, menor impacto financeiro e, acima de tudo, minimizando a
mortalidade”, conclui.
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