Testes foram feitos in vitro com culturas de glioblastoma, câncer agressivo e com poucas opções de tratamento. Próximo passo é testar o efeito das substâncias em células nervosas normais e em animais (foto: NCI/Unplash)
Um dos tipos mais letais de tumor é o glioblastoma, já que poucos medicamentos se mostram eficazes em combater esse crescimento desajustado de células da glia, que compõem o tecido cerebral. O padrão atual de tratamento é a remoção cirúrgica do tumor, seguida de quimioterapia com temozolomida, radioterapia e nitrosoureias (como lomustina). Embora tenha havido certa melhora na sobrevida de pacientes ao longo dos anos, o prognóstico ruim permanece, pois essas células tumorais têm altíssima capacidade de resistir aos fármacos existentes e, muitas vezes, voltam a crescer após operação.
Agora, um
estudo publicado na
revista Scientific Reports mostrou resultados promissores
de duas substâncias que conseguiram inibir a proliferação dessas células
tumorais. Para o teste, in vitro, foram
avaliados 12 compostos gerados como subprodutos durante a síntese total do
cloridrato de apomorfina (APO). Dois deles, chamados de A5 (derivado de
isoquinolina) e C1 (derivado de aporfina), mostraram capacidade de promover a
morte das células de glioblastoma. Além disso, conseguiram bloquear a formação
de novas células-tronco tumorais e potencializaram o efeito da temozolomida,
hoje o principal quimioterápico utilizado no tratamento.
“Mais estudos são
necessários para melhor caracterizar a ação em células tumorais e normais, mas
os resultados obtidos sugerem uma potencial aplicação terapêutica desses
compostos como novos agentes citotóxicos úteis no controle dos glioblastomas”,
explica Dorival Mendes Rodrigues-Junior,
do departamento de bioquímica médica e microbiologia da Universidade de
Uppsala, na Suécia, um dos autores do artigo.
Para desenhar o estudo, os
pesquisadores se debruçaram sobre a obtenção do cloridrato de apomorfina, que
envolve uma série de reações químicas sequenciais, na qual cada passo gera um
composto que é consumido na etapa seguinte. Em uma pesquisa anterior, o grupo
havia avaliado o grau de eficácia de 14 desses compostos em células de câncer
epidermoide de cabeça e pescoço. Tanto o A5 quanto o C1, também naquela
ocasião, haviam se mostrado promissores e a opção foi por expandir os testes.
“Diante da relevância e urgência em se identificar novas substâncias
terapêuticas que possam ser úteis para o tratamento de glioblastoma, avaliamos
o mesmo painel utilizado no estudo anterior, mas agora para este outro tipo de
tumor”, explica Rodrigues-Junior.
O projeto sobre
marcadores moleculares de carcinoma espinocelular de cabeça e pescoço conta
com apoio da
FAPESP e envolve outro autor que também assina a publicação mais recente, André
Vettore, do Departamento de Ciências Biológicas da Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp), campus Diadema.
“Esse estudo
apresenta resultados interessantes, mas são apenas os primeiros passos de uma
longa caminhada. Essa potencial utilidade dos compostos A5 e C1 no controle de
células de glioblastoma precisa agora ser analisada em modelos in vivo, bem como ter seus efeitos avaliados em células
neurais não tumorigênicas”, adverte Vettore. Para o pesquisador, caso os
resultados obtidos nesses ensaios sejam promissores, é possível supor que, no
futuro, a eficácia seja avaliada em estudos clínicos. “Satisfazendo todas as
etapas, esses compostos poderão ser, por fim, úteis no tratamento de pacientes
acometidos com glioblastoma”, diz.
Produtos naturais
bioativos
O estudo foi
elaborado para avaliar as atividades antitumorais in vitro de 12 compostos aromáticos obtidos como
intermediários na síntese total da apomorfina. Essa substância alcaloide tem
interação com a via da dopamina e já é amplamente utilizada para controlar as
alterações motoras causadas pela doença de Parkinson.
Os alcaloides representam uma das
classes mais conhecidas de produtos naturais com múltiplas propriedades
farmacológicas e são estudados por ação anticonvulsivante, antiagregante
plaquetário, anti-HIV, dopaminérgico, antiespasmódico e anticancerígeno.
A FAPESP incentiva
estudos com essas substâncias por meio de um projeto conduzido
no Departamento de Química da Unifesp, em Diadema, sob a coordenação de Cristiano Raminelli,
outro autor da publicação na Scientific Reports.
Assinam também o estudo Haifa Hassanie, Gustavo Henrique Goulart Trossini,
Givago Prado Perecim, Laia Caja e Aristidis Moustakas.
O artigo Aporphine and isoquinoline derivatives block glioblastoma cell
stemness and enhance temozolomide cytotoxicity pode ser lido
em: www.nature.com/articles/s41598-022-25534-2.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/pesquisadores-identificam-dois-compostos-capazes-de-inibir-o-crescimento-de-celulas-de-tumores-cerebrais/40604/
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