Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla começa no dia 21 com o tema 'Superar barreiras para garantir inclusão', mas empregadores e especialistas criticam dificuldade em cumprir legislação
Comemorada de 21 a 28 de agosto, a
Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla tem neste ano
o tema “Superar barreiras para garantir inclusão”, com a inserção no mercado de
trabalho como um dos principais obstáculos para esse público. Esse é um direito
de toda pessoa, com deficiência ou não, que possibilita a concretização das
capacidades individuais e das dignidades coletivas e sociais.
Essa massa corresponde a 24% da
população nacional, ou 46 milhões de pessoas nos números do Censo 2010, o
último realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
São aqueles que declararam ter algum grau de dificuldade, em ao menos uma das
habilidades investigadas: enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus; ou ter
deficiência mental ou intelectual.
O mais conhecido dispositivo legal
criado para salvaguardar oportunidades e direitos à pessoa com deficiência
(PcD) é a Lei nº 8.213/1991, que obriga empresas com mais de cem funcionários a
preencher de 2% a 5% dos postos de trabalho com beneficiários reabilitados ou
PcD. A legislação, contudo, não entrega a inclusão que promete.
Por um lado, especialistas em PcD
afirmam que a fiscalização falha tanto no cumprimento das cotas quanto na
adequação de ambientes de trabalho, além de enfrentar resistências culturais ou
mero preconceito. De outro, empregadores reclamam que ficaram com todo o ônus
do cumprimento da lei, sem contrapartidas que viabilizem a inclusão, como
programas de capacitação.
Direito fundamental
Defensor público federal especialista
em Direitos Humanos e Sociais, André Naves afirma que o trabalho é uma garantia
de satisfação da identidade e da realização do indivíduo. “É essencial ao
trabalho a característica inclusiva e, ainda que não se confunda com a
remuneração, esta é necessária à sobrevivência individual. As barreiras à
inclusão de uma parcela da população ao trabalho trazem prejuízos individuais,
mas também sociais, já que a falta de diversidade inibe a inovação econômica e
a construção efetiva de políticas públicas”, diz.
Naves considera a fiscalização do
cumprimento das cotas como falha no país, o que torna ainda mais necessária uma
profunda mudança cultural na sociedade e maior publicidade de informações sobre
PcD, para que a lei cumpra o objetivo. “O Brasil e os que lideram as atividades
econômicas precisam entender que a pluralidade e a diversidade são lucrativas e
essenciais à sobrevivência empresarial.”
As próprias empresas de recursos
humanos reconhecem os benefícios na contratação de pessoas com deficiência para
a atividade econômica. Há a melhoria da acessibilidade, que a torna mais apta a
receber todos os tipos de consumidores e a aprender a atendê-los.
Para o quadro de funcionários, é uma
oportunidade de aprendizagem sobre inclusão, que gera um melhor clima
organizacional, respeito às diferenças e criatividade na criação de soluções ao
mercado. Ainda, a convivência serve de estímulo à cooperação, que tende a
melhorar o ambiente e promover maior produtividade.
Multas e entraves
Mesmo sem ser 100% eficaz, a lei das
cotas ainda está entre as principais responsáveis pela concessão de vagas a
pessoas com deficiência nas empresas. Contudo, empregadores consideram que há
inúmeras dificuldades para a ocupação de um cargo por esse público, como a
inadequação de instituições de formação profissional, nas ações do governo e em
barreiras de ordem social, como urbanísticas, arquitetônicas, nos transportes e
nas comunicações.
O vice-presidente institucional da
Federação Nacional dos Sindicatos de Empresas de Recursos Humanos, Trabalho
Temporário e Terceirizado (Fenaserhtt), Ermínio Lima Neto, considera que a lei
das cotas tem caráter mais punitivo do que inclusivo, com um peso
desproporcional ao setor econômico, para tirar do Estado a responsabilidade
pela inclusão.
“Não somos contra as cotas, mas que sejam aplicadas
racionalmente, a entender as características de cada segmento”, afirma Lima
Neto, que representa cerca de 35 mil empresas que empregam em torno de 2,5
milhões de pessoas, em média, por ano.
No trabalho temporário e em serviços
terceirizados, por exemplo, 90% da mão de obra presta serviços diretamente nas
instalações dos clientes, que também têm de cumprir as próprias cotas. O
representante da Fenaserhtt levou no último dia 14 de junho as demandas das
empresas, em audiência pública no Tribunal Superior do Trabalho (TST) sobre a
contratação de pessoas com deficiência.
Para ele, as leis deveriam amenizar
crises e entraves, e não causar dificuldades por meio de multas. “O Estado não
cumpre o papel social de oferecer educação para que essas pessoas estejam
capacitadas ao mercado, que é o básico, então por que as empresas devem ser
obrigadas a arcar com todas as obrigações da Lei de Cotas?”, questiona Lima
Neto.
Inclusão
Assistente social, uma das
idealizadoras e presidente do Conselho do Grupo Chaverim, Ester Rosenberg Tarandach
afirma que as pessoas com deficiência precisam ter a própria autonomia, o que
inclui as oportunidades de trabalho. A entidade, localizada na capital
paulista, trabalha com a sociabilização de pessoas com deficiência intelectual
e psicossocial, por meio de atividades socioculturais, esportivas e de lazer.
“Mas a sociedade também precisa ampliar o próprio conceito de acessibilidade”,
diz.
Leonel Becker, de 61 anos, é um dos
participantes das atividades no Chaverim, em São Paulo. Ele é motorista há
quase 12 anos na empresa Poladian Produções Artísticas, que promove eventos e
shows. “Consegui o emprego depois de ver um anúncio no jornal Diário de S.
Paulo e passar por processo seletivo”, conta Becker.
Outra profissional que é atendida pela
Lei de Cotas é Joice Heliszkowski, de 44 anos. Ela trabalha há 15 anos como
mensageira na TV Cultura. Depois de passar por uma capacitação de trabalho em
2007, foi chamada em processo seletivo feito pelo Centro de Integração
Empresa-Escola (CIEE) para ingressar na emissora.
Semana nacional
A Federação Nacional das Apaes (Fenapaes) desenvolve desde 1963 uma campanha anual que busca a inclusão de pessoas com deficiência. A Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla foi instituída como parte do calendário nacional pela Lei nº 13.585/2017, justamente para ampliar os esforços pela conscientização da sociedade sobre a necessidade de organização social e de políticas públicas para promover a inclusão.
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