Os relacionamentos de benefícios mútuos compõem um novo estilo de vida. Denominados atualmente de Sugar, eles sugerem um enlace por troca de interesses entre um Sugar Daddy ou Sugar Mommy, denominação da pessoa mais madura e financeiramente estável que deseja promover patrocínios diversos ao companheiro; e um Sugar Baby, o rapaz ou moça que se habilite a ser "mimado" em troca de atenção, carinho ou companhia. O problema é que esse tipo de vínculo, muitas vezes, é confundido com consumo de afeto e até mesmo prostituição, já que estabelece recompensas financeiras em troca de uma ligação com o financiador, seja ela sexual, passional ou uma amizade.
Essa forma de relação
entre pessoas, em que a mais madura financia desejos e deleites de outra mais
jovem em troca de algum tipo de atenção, não é novidade, e pode ser encontrada
ao longo da história. No entanto, o uso de redes sociais específicas para os
interessados nesse tipo de relacionamento é um fenômeno atual. O universo de um
desses novos portais de comunicação, o MeuPatrocínio, combina consumo e lazer,
confundindo a busca pela felicidade com a realização do sonho amoroso.
As redes sociais de
patrocínio transformaram amor em satisfação social ou profissional. Essa
mudança não reflete, à primeira vista, uma preocupação com o outro, mas sim o
cultivo à própria imagem, ao individualismo e à autoestima. A partir de uma
nova perspectiva, os hábitos dos participantes dessas redes têm mudado
significativamente, de tal maneira que os usuários convertem-se no próprio
produto. Desse modo, a atividade nas redes passa a ser a de anunciarem e
promoverem a si mesmos como produto a ser consumido, gerando uma confusão entre
indivíduo e mercadoria.
Pela estreita relação
entre afeto e produto, esse tipo de relacionamento coloca algumas questões no
campo do Direito: seria, então, a relação sugar uma comercialização do afeto? Em
outras palavras, estariam as partes dispondo do próprio afeto? Afinal,
condicionar afetividade a prévio pagamento conduziria à conclusão de que o
afeto é objeto de relação jurídica obrigacional onerosa, diferentemente, das
conotações que teria nas relações familiares, em que se presume afetividade
como princípio que se desdobra em dever familiar.
Para essa pergunta, a
resposta é negativa. Não se trata de comercializar afeto, mas de se formar
parceria, seja profissional (fazendo conexões com pessoas influentes) ou
sexual. Essa relação, na verdade, pretende firmar algo mais amplo e versátil,
que não se restringe a afeto, nem impede que ele se forme ao longo do tempo,
exatamente porque esse precisa de amadurecimento para germinar.
É importante ressaltar
ainda que esse tipo de relacionamento não pode ser confundindo com prostituição,
caracterizada pela contratação de profissional exclusivamente para relações
sexuais, por período de tempo previamente definido. No caso do Sugar,
a relação é pautada em trocas de interesse mútuo, com finalidade de conciliar
amor e segurança financeira com vistas à realização de objetivos do casal por
tempo indefinido. Ademais, não é obrigatório que a finalidade dessa relação
seja sexual. Ela varia de acordo com as pretensões dos indivíduos que fazem
parte desse relacionamento.
Pode haver ainda uma
espécie de contrato entre o Sugar Daddy/Mommy e o Sugar Baby,
que se faz de forma consensual, expressando todas as expectativas e vontades
das partes do acordo. A partir de uma conversa pelos canais de chat
de redes sociais de patrocínio, por exemplo, as duas partes passam a deliberar
entre si os objetivos dessa relação. Pode-se depreender daí que, ao longo do
diálogo, as propostas formuladas podem ser consideradas, aos olhos do direito
brasileiro, como efetuadas entre presentes. Apesar de fisicamente distanciados
um do outro, os contratantes manteriam o acordo em tempo real, com
possibilidade de resposta simultânea. Por fim, o vínculo contratual entre Daddy
e Baby
se firmaria quando ambos aceitarem integralmente as cláusulas principais e acessórias.
Ademais, essa relação
jurídica contratual, ao longo da vigência e da solidificação do afeto entre as
partes, ainda pode-se cristalizar em união estável, desde que preenchidos os
requisitos legais, resultando, inclusive, na formação de família, cujos valores
inarredáveis são o afeto e a comunhão. Desse modo, se a relação sugar é
apta a configurar união estável, também o será para casamento, se afastando
cada vez mais da ideia de consumo de afeto ou da prostituição. No entanto, esse
tipo de relação ainda possui caráter muito novo para a legislação brasileira,
que busca se adaptar a esse novo modelo de relacionamento.
Marcelo Santoro - professor de
Direito de Família da Faculdade Mackenzie Rio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário