A carta aberta do
ex-Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (FHC), publicada
recentemente, demonstra algo além de um pedido de moderação aos eleitores na
escolha de um candidato à Presidência. Representa, implicitamente, o triste
ocaso do PSDB, partido do qual FHC é a principal figura viva e que protagonizou
os maiores embates políticos desde a redemocratização com o PT.
É fato, desde a irrupção do
Mensalão, em meados dos anos 2000, que a discussão política no país ocorre em
torno do petismo e, mais especificamente, em relação ao respectivo líder, o
ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. O centro de gravidade da
política nacional divide-se, desde então, entre petismo e antipetismo. Durante
bom tempo, o PSDB corporificou tal sentimento, embora mais por demérito de
outros partidos que por méritos próprios. Isso ocorreu pois, em nenhum momento,
o PSDB se sintonizou com a vontade
popular de um enfrentamento honesto e firme, dentro dos limites da civilidade
democrática.
É sabido que, na política,
não há vácuo. O furor antipetista foi canalizado nessas eleições, sobretudo,
pelo candidato à Presidência da República pelo PSL, Jair Bolsonaro.
Independentemente da qualidade das propostas, Bolsonaro captou a revolta
latente na sociedade brasileira contra o status quo do cenário político.
Ao não questionar duramente as versões da realidade propostas pelo petismo, o
PSDB passou, aos olhos da população, a servir como uma figura do mesmo status quo, mera opção
ao PT na falta de alternativa mais coincidente com a vontade da população. A
vitória esmagadora nas eleições municipais de 2016, que ocorreu mais por
repulsa pelo PT que por admiração pelo PSDB, foi o canto do cisne, o qual teve
fim com o escândalo envolvendo Aécio Neves, momento crucial em que os tucanos se
igualaram eticamente aos petistas na avaliação do povo. Com isso, foi aberta a
senda para o surgimento de alguma liderança, especialmente do tipo carismática,
como Jair Bolsonaro.
A responsabilidade pelo
crescimento do candidato do PSL, partido de pequena expressão, deve ser, em
grande parte, atribuída à frustração da esperança causada pelo PT e à falta de competência
do PSDB em viabilizar-se como opção. O receio do tucanato de abordar, de forma
clara, temas como privatização e questões relacionadas aos costumes destruiu as
possibilidades de o partido tornar-se mais capilarizado na sociedade. O
caciquismo em nada ajudou o PSDB, fato que ficou claro na discussão interna
entre Alckmin e Doria para determinar quem seria o candidato à Presidência. A
despeito de eventual frustração com a atitude do ex-prefeito paulistano em
abandonar o mandato, é inegável que o discurso dele contra o petismo está mais
próximo da vontade popular que o pragmatismo sereno de Alckmin.
É o fim de uma era. Essas
eleições marcam o crepúsculo do PSDB como grande alternativa ao Partido dos
Trabalhadores, o qual, aliás, é um espectro do que já foi, mero reflexo opaco
da figura carismática de Lula. Quando esta figura não mais estiver no cenário
político, é bem possível que o PSOL assuma o lugar do PT como arauto da
esperança, titular de suposta pureza moral. Bolsonaro, mesmo em caso de derrota,
manterá relevância política em certos setores sociais. E ao PSDB, qual bandeira
sobrará? Quem representará o centro político, o equilíbrio nas discussões, sem
fisiologismo? A Carta de FHC, um tanto atrasada e sem proposta que
representasse um passo ao centro (um pedido de renúncia de Alckmin em favor de
Marina, por exemplo), mais serviu como um lúgubre testamento político de um
partido importantíssimo nas últimas três décadas no Brasil. A súplica pelo
centro evidencia a vitória dos extremos.
Elton
Duarte Batalha - Advogado, Doutor em Direito pela USP e Professor de Direito na
Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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