As
organizações não são competentes em captar as capacidades plenas dos
indivíduos. A prática mais comum é investir tempo e energia na busca de
“talentos” idealizados
Peter
Drucker, do alto de suas reflexões sobre os desafios da Administração, observou
em uma de suas clássicas obras que “o propósito da Administração é permitir que
pessoas comuns façam coisas incomuns”.
Reconhecer a
validade desta declaração nos leva diretamente a, pelo menos, três
constatações: 1) pessoas “normais” (que são a maioria nas organizações)
podem dar resultados excepcionais em ambientes favoráveis; 2) uma metodologia
de gestão consistente possibilita que isto aconteça; 3) administradores podem e
devem ser treinados nessa metodologia.
No entanto, o
que se constata é que as organizações não são competentes em captar as
capacidades plenas dos indivíduos. Pior ainda, são irregulares ao aplicar
metodologias de gestão que resultam em ambientes de alto desempenho.
A prática
mais comum é investir tempo e energia na busca de “talentos” idealizados,
heróis que rapidamente se frustram e partem para outra - quando não se acomodam
e passam a não mais se distinguir da normalidade.
A
consequência está registrada na história das organizações: apenas pequena parte
delas subsiste aos seus fundadores e muitas desaparecem ainda na primeira
geração, afogadas nas crises.
Cabe
perguntar: onde está o problema? A resposta, evidentemente, não é simples.
Mas ao se
investigar com mais profundidade a realidade das empresas chega-se a uma
conclusão desconcertante: há um enorme gap entre o planejamento e a execução.
Pesquisas
apontam que a maioria das diretrizes e estratégias planejadas não são
suficientemente compreendidas e logo, implantadas. Há um abismo entre o plano e
a ação, de difícil e tardia correção.
O gap de
alinhamento pode ser gerado na distinção entre “os que pensam” e “os que
fazem”. Tais práticas têm como premissa que o primeiro nível está melhor
preparado para pensar o futuro, desconsiderando o fato de que os colaboradores
que estão mais próximos aos clientes e aos mercados têm informações valiosas,
pouco consideradas no planejamento de médio e longo prazos.
Não é raro se
constatar diferenças importantes nos modelos mentais dos representantes de cada
grupo, sendo que apenas parte da visão da realidade é compartilhada.
Como cada um
traduz o que capta da realidade de modo autônomo, as priorizações são
diferentes e os comportamentos só são aderentes por casualidade.
Além disso,
independentemente do posicionamento na geografia da organização, os
colaboradores (às vezes, nem tanto) costumam compartilhar crenças disfuncionais
de natureza variada: sobre sua equipe, sobre a empresa e até mesmo sobre o
negócio e o mercado no qual estão inseridos.
Raramente
discutidas internamente, estas crenças refletem diferenças de percepções e
contribuem para aumentar o não alinhamento.
Diferenças
entre crenças são decorrentes de desvios nos processos cognitivos - mecanismos
pelos quais os seres humanos aprendem, categorizam suas experiências e as
utilizam para fazer julgamentos, inferências e projeções do futuro.
Um desvio
cognitivo típico, por exemplo - “isto nunca funcionará por aqui” -
justifica os pensamentos negativos, compromete a ação e reforça uma percepção
coletiva, ao ser compartilhado.
Eventualmente,
estes desvios são reforçados por recortes convenientes da realidade percebida.
A interpretação distorcida dos fatos é utilizada nos discursos manifestados, de
forma aberta ou dissimulada. O comportamento coletivo se alinha às visões negativas,
exigindo muita energia e esforço para sua reversão.
Em tese,
sabemos que captar e integrar sistematicamente as informações disponíveis nas
diferentes equipes é uma vantagem competitiva relevante.
É quase um
contrassenso discordar da declaração de Pierre Levi, em A Inteligência
Coletiva: “ninguém sabe tudo, mas todos sabem alguma coisa”. Mas, com crenças
diferentes, a tarefa de construir um planejamento colaborativo se torna quase
impossível.
Para que todo
o processo de planejamento estratégico seja de fato colaborativo e de alta
qualidade, é necessário primeiro nivelar as visões e alinhar as ações, a nível
de cada participante do processo.
Um dos
primeiros passos neste processo é a identificação e o questionamento das
crenças disfuncionais, eliminando os bloqueios à ação e assegurando que tanto o
indivíduo quanto o grupo passem a projetar o mesmo futuro e as mesmas
estratégias.
A metodologia
típica de intervenção pode ser resumida em três etapas: i) fase de levantamento
e crítica dos desvios cognitivos nas diferentes equipes; ii) fase de
reconhecimento das demandas do ambiente e iii) fase de construção do futuro
desejado.
O compromisso
com a sua realização vem como consequência, com a integração gradual de cada
indivíduo ao processo de construção, de forma que cada um receba sua quota de
responsabilidades integradas à visão comum.
Essa pratica
disseminada por toda organização criará uma energia altamente positiva, com
melhoria considerável no desempenho, além de dar visibilidade aos que realmente
fazem diferença.
Ulrico Barini
- sócio da Dex Advisors
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