Para o deputado Tiririca
(PR-SP), "O trabalho no circo era mais organizado que os primeiros meses
na Casa Legislativa". "É doido. Nos primeiros três meses foi difícil,
você vem de outra escola, você chega aqui [na Câmara] e assusta. Você vem de
uma coisa toda organizada. Circo é uma coisa toda organizadinha, você tem hora
para entrar, hora para sair. Aí você chega aqui o cara tá discursando e
neguinho não tá nem aí. Até você entender que funciona assim [é
complicado]" (1/1/15). Indagaram ao deputado se iria fazer seu primeiro
discurso na Câmara neste segundo mandato? "Vamos sim, claro que não, vamos
sim". É fácil perceber que o Tiririca também faz parte do processo de
aceleração destrutiva (PAD) do Brasil. Esse modelo de organização política e social
que foi inventado para nosso País está falido. Algo virá em seu lugar
(espera-se que para melhor). O que se lamenta é que ninguém sabe a data nem a
forma.
Tributo do esculacho à
esculhambação. A presença do Tiririca na Câmara dos Deputados é o retrato
do povo brasileiro que, por sinal, gosta e admira muito mais o circo que o
Congresso Nacional. "O Brasil é esse circo não só por causa dos Palhaços
lá do planalto [e do Congresso Nacional], mas principalmente pelo fato de
sermos tão espectadores!" (Frederico Spaniol). Boa parcela dos eleitores
só quer mesmo palhaçadas, só protestar, anular o voto, zombar, brincar,
inclusive com a democracia - que deveria ser uma coisa muito séria. A eleição
do Tiririca é um tributo do esculacho à esculhambação (como foram os mais de 100
mil votos dados ao Rinoceronte Cacareco em São Paulo, em 1959; os mais de 400
mil votos dados ao Macaco Tião, no RJ, em 1988; os quase 2 milhões de votos ao
Enéas etc.). O triste é saber que o voto da avacalhação (do povo abestado) faz
parte do processo destrutivo do Brasil. Reflexo da desmoralização da política
brasileira.
Tiririca faz parte de um
"negócio". Os partidos conquistam seus espaços eleitorais por meio do
voto. Quanto mais o partido é votado, mais parlamentares elege. Quanto mais
parlamentares, mais verba recebe do fundo de participação partidária. A
política, sobretudo nas mãos das deploráveis lideranças nacionais (há poucas
exceções), virou puro negócio. Os candidatos não são escolhidos
(normalmente) pela competência ou pelas suas ideias, sim, pela perspectiva de
votos que representa. Por força das coligações (outra aberração da política
nacional!), um deputado bem votado leva dois, três ou mais deputados juntos. No
final, candidato com 100 mil votos fica fora do Parlamento, enquanto outro com
20 mil é eleito (em razão das cotas partidárias obtidas nas urnas).
Distritão ou distrital? De
aberração em aberração o Processo de Aceleração Destrutiva (PAD) vai se
incrementando no Brasil "abestado". Com a redemocratização (1985)
conseguimos uma democracia eleitoral, mas extremamente defeituosa,
que está muito longe de ser uma democracia cidadã (como a dos países
escandinavos, por exemplo). A reforma política urgente deve, pelo menos,
corrigir os piores vícios da nossa democracia (só) eleitoral. Hoje
a eleição para a Câmara segue o voto proporcional (cada
partido, conforme seus votos, elege uma cota de deputados). Os três caminhos
para a mudança desse sistema são: (a) voto distrital puro (divide
cada Estado em distritos e cada distrito elege o seu deputado); (b) voto
distrital misto (metade das cadeiras seguiria o voto proporcional e
outra metade o distrital); (c) voto "distritão" (são
eleitos os mais votados em cada Estado, independentemente do partido e sem se
levar em conta os votos dados aos partidos).
Vantagens do
"distritão". Essa terceira
forma é muito interessante porque elimina automaticamente as coligações na
eleição para deputados. Outra vantagem: pode reduzir o número de
partidos com assento na Câmara. Isso dispensa acláusula de barreira e
reforça a fidelidade do eleito ao seu partido. Mais um
detalhe: por esse sistema, cada partido lançaria poucos candidatos (os
mais viáveis eleitoralmente), porque o que importa é a concentração dos votos
em cada candidato, não a dispersão (como é hoje). Atualmente cada partido busca
a maior quantidade de votos possível, para fazer mais deputados. Por isso lança
muitos candidatos. No "distritão", que elege os mais votados, quanto
mais concentração de votos nos candidatos, melhor. A pulverização é pior. Com
poucos candidatos, o uso do horário gratuito será mais
racional. No sistema que estamos aqui cuidando, o Tiririca (só para
exemplificar, pois espero sinceramente que ele deixe a política), mesmo eleito
com um milhão de votos, não levaria mais ninguém junto com ele. Seria apenas um
dos eleitos. Com isso se decreta o fim do voto proporcional assim como o fim
das coligações na eleição para deputados. O "distritão" para ser uma
boa alternativa, mas deve vir acompanhado de muitas outras mudanças como (a)
fim do financiamento privado empresarial (ficando o atual
financiamento público assim como o financiamento privado particular, limitado)
e (b) limitação dos gastos de cada candidato.
Luiz
Flávio Gomes - Jurista e Professor
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